DOCUMENTOS DA IGREJA

DECRETO
AD GENTES
SOBRE A ATIVIDADE
MISSIONÁRIA  DA IGREJA

 

PROÉMIO 

A vocação missionária da Igreja

1. A Igreja, enviada por Deus a todas as gentes para ser «sacramento universal de salvação», (1) por íntima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato do seu fundador (2), procura incansàvelmente anunciar o Evangelho a todos os homens. Já os próprios Apóstolos em que a Igreja se alicerça, seguindo o exemplo de Cristo, «pregaram a palavra da verdade e geraram as igrejas» (3). Aos seus sucessores compete perpetuar esta obra, para que «a palavra de Deus se propague ràpidamente e seja glorificada (2 Tess. 3,1), e o reino de Deus seja pregado e estabelecido em toda a terra.

No estado actual das coisas, de que surgem novas condições para a humanidade, a Igreja, que é sal da terra e luz do mundo (4), é com mais urgência chamada a salvar e a renovar toda a criatura, para que tudo seja instaurada em Cristo e n'Ele os homens constituam uma só família e um só Povo de Deus.

Por isso, este sagrado Concílio, agradecendo a Deus a grandiosa obra já realizada pelo esforço generoso de toda a Igreja, deseja delinear os princípios da actividade missionária e reunir as forças de todos os fiéis, para que o Povo de Deus, continuando a seguir pelo caminho estreito da cruz, difunda por toda a parte o reino de Cristo, Senhor e perscrutador dos séculos (5), e prepare os caminhos para a sua vinda.

CAPÍTULO I

PRINCÍPIOS DOUTRINAIS

Desígnio do Pai

2. A Igreja peregrina é, por sua natureza, missionária, visto que tem a sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na «missão» do Filho e do Espírito Santo (6).

Este desígnio brota do «amor fontal», isto é, da caridade de Deus Pai, que, sendo o Princípio sem Princípio de quem é gerado o Filho e de quem procede o Espírito Santo pelo Filho, quis derramar e não cessa de derramar ainda a bondade divina, criando-nos livremente pela sua extraordinária e misericordiosa benignidade, e depois chamando-nos gratuitamente a partilhar da sua própria vida e glória. Quis ser, assim, não só criador de todas as coisas mas também «tudo em todas as coisas» (1 Cor. 15,28), conseguindo simultâneamente a sua glória e a nossa felicidade. Aprouve, porém, a Deus chamar os homens a esta participação na sua vida, não só de modo individual e sem qualquer solidariedade mútua, mas constituindo-os num Povo em que os seus filhos, que estavam dispersos, se congregassem em unidade (7).

Missão do Filho

3. Este desígnio universal de Deus para a salvação do género humano realiza-se não sòmente dum modo quase secreto na mente humana, ou por esforços, ainda que religiosos, pelos quais os homens de mil maneiras buscam. a Deus a ver se conseguem chegar até Ele ou encontrá-l'O, embora Ele não esteja longe de cada um de nós (cfr. Act. 17, 27); com efeito, estes esforços precisam de ser iluminados e purificados, embora, por benigna determinação da providência de Deus, possam algumas vezes ser considerados como pedagogia ou preparação evangélica para o Deus verdadeiro (8). Para estabelecer a paz ou a comunhão com Ele e uma sociedade fraterna entre os homens, apesar de pecadores, Deus determinou entrar de modo novo e definitivo na história dos homens, enviando o seu Filho na nossa carne para, por Ele, arrancar os homens ao poder das trevas e de satanás (9) e n'Ele reconciliar o mundo consigo (10). Constituiu, portanto, herdeiro de todas as coisas Aquele por quem fizera tudo(11), para n'Ele tudo restaurar (12).

Cristo Jesus, de facto, foi enviado ao mundo como verdadeiro mediador entre Deus e os homens. Como é Deus, n'Ele habita corporalmente toda a plenitude da divindade (Col. 2,9); e sendo o novo Adão pela sua natureza humana, é constituído cabeça da humanidade renovada, cheio de graça e de verdade (Jo. l,14). Assim, o Filho de Deus, pelo caminho duma verdadeira Incarnação, veio para fazer os homens participantes da sua natureza divina e, sendo rico, fez-se por nós necessitado para que nos tornássemos ricos da sua pobreza (13). O Filho do Homem não veio para que o servissem, mas para ser ele a servir e para dar até a sua vida em redenção por muitos, isto é, por todos (14). Os santos Padres constantemente proclamam nada estar remido que não tivesse sido primeiro assumido por Cristo (15). Ora ele assumiu por inteiro a natureza humana tal qual ela existe em nós, pobres e miseráveis, rejeitando dela apenas o pecado (16). De si mesmo disse Cristo, a quem o Pai santificou e enviou ao mundo (cfr. Jo. 10,36): «O Espírito do Senhor está sobre mim; por isso me ungiu e me enviou a anunciar a boa nova aos pobres, a sarar os contritos de coração, a proclamar a libertação dos cativos e a restituir a vista aos cegos» (Lc. 4,18). E outra vez: «Veio o Filho do Homem para buscar e salvar o que estava perdido» (Lc. 19,10).

Aquilo que uma vez foi pregado pelo Senhor ou aquilo que n'Ele se operou para salvação do género humano, deve ser proclamado e espalhado até aos confins da terra (17), começando por Jerusalém (18), de modo que tudo quanto foi feito uma vez por todas, pela salvação dos homens, alcance o seu efeito em todos, no decurso dos tempos.

Missão do Espírito Santo

4. Para isso, precisamente, enviou Cristo o Espírito Santo da parte do Pai, para realizar no interior das almas a sua obra salvadora e impelir a Igreja à sua própria dilatação. Não há dúvida de que o Espírito Santo já actuava no mundo antes de Cristo ser glorificado (19). Contudo, foi no dia de Pentecostes, em que desceu sobre os discípulos para ficar para sempre com eles (20), que a Igreja foi pùblicamente manifestada diante duma grande multidão, que a difusão do Evangelho entre os gentios por meio da pregação . teve o seu início, e que, finalmente, a união dos povos numa catolicidade de fé foi esboçada de antemão na Igreja da nova Aliança, a qual fala em todas as línguas e entende e abraça todas as línguas na sua caridade, superando assim a dispersão de Babel (21). Pelo Pentecostes começaram os «actos dos Apóstolos», como pela descida do Espírito Santo sobre Maria fora concebido Cristo, e como pela descida do mesmo Espírito Santo sobre Cristo, quando orava, fora o Senhor impelido à obra do seu ministério (22). O próprio Senhor Jesus, antes de dar livremente a sua vida pelo mundo, de tal maneira dispôs o ministério apostólico e de tal forma prometeu enviar o Espírito Santo, que a ambos associava na tarefa de levar a cabo sempre e em toda a parte a obra da salvação (23). O Espírito Santo é quem «unifica na comunhão e no ministério, e enriquece com diversos dons hierárquicos e carismáticos» (24) toda a Igreja através dos tempos, dando vida às instituições eclesiásticas (25), sendo como que a alma delas, e instilando nos corações dos fiéis aquele mesmo espírito de missão que animava o próprio Cristo. Por vezes precede visivelmente a acção apostólica (26), como também incessantemente a acompanha e dirige de vários modos (27).

A Igreja enviada de Cristo

5. O Senhor Jesus, logo desde o princípio «chamou a Si alguns a quem Ele quis, e escolheu doze para andarem com Ele e para -os mandar a pregar» (Mc. 3,13) (28). Os Apóstolos foram assim a semente do novo Israel e ao mesmo tempo a origem da sagrada Hierarquia. Depois, realizados já definitivamente em Si, pela sua morte e ressurreição, os mistérios da nossa salvação e da renovação do universo, o Senhor, com todo o poder que adquiriu no céu e na terra (29), antes de subir ao Céu (30) fundou a sua Igreja como sacramento de salvação e enviou os seus Apóstolos a todo o mundo tal qual Ele também tinha sido enviado pelo Pai (31), dando-lhes este mandato: «Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos prescrevi» (Mt. 28, 19-20). «Ide por todo o mundo, proclamai a Boa Nova a toda a criatura. Quem acreditar e for baptizado, será salvo; mas quem não acreditar, será condenado» (Mc. 16,15 ss.). Daí vem à Igreja o dever de propagar a fé e a salvação de Cristo, tanto em virtude do expresso mandamento que dos Apóstolos herdou a Ordem dos Bispos ajudada pelos presbíteros em união com o sucessor de Pedro e sumo pastor da Igreja, como em virtude da vida comunicada aos seus membros por Cristo, «do qual o corpo todo inteiro bem ajustado e coeso por toda a espécie de junturas que o alimentam, com a acção proporcionada a cada membro, realiza o seu crescimento em ordem à própria edificação na caridade» (Ef. 4,16). A missão da Igreja realiza-se pois, mediante a actividade pela qual, obedecendo ao mandamento de Cristo e movida pela graça e pela caridade do Espírito Santo, ela se torna actual e plenamente presente a todos os homens ou povos para os conduzir à fé, liberdade e paz de Cristo, não só pelo exemplo de vida e pela pregação mas também pelos sacramentos e pelos restantes meios da graça, de tal forma que lhes fique bem aberto caminho livre e seguro para participarem plenamente no mistério de Cristo.

Continuando esta missão e explicitando através da história a missão do próprio Cristo, que foi enviado a evangelizar os pobres, a Igreja, movida pelo Espírito Santo, deve seguir o mesmo caminho de Cristo: o caminho da pobreza, da obediência, do serviço e da imolação própria até à morte, morte de que Ele saiu vencedor pela sua ressurreição. Foi assim também que todos os Apóstolos caminharam na esperança completando com muitas tribulações e fadigas o que faltava aos trabalhos de Cristo pelo seu corpo, que é a Igreja (32). Muitas vezes, mesmo, a semente foi o sangue dos cristãos (33).

Actividade missionária da Igreja: seus diversos modos

6. Esta tarefa que deve ser levada a cabo pela Ordem dos Bispos presidida pelo sucessor de Pedro e com a oração e a cooperação de toda a Igreja, é uma e a mesma em toda a parte, sejam quais forem os condicionalismos, embora difira quanto ao exercício conforme as circunstâncias. Mas as diferenças que nesta actividade da Igreja se têm de reconhecer, não se originam na natureza íntima da «missão», mas nos condicionalismos em que essa «missão» se exerce.

Esses condicionalismos tanto podem depender da Igreja como dos povos, dos agrupamentos ou até dos indivíduos a quem a «missão,, se dirige. A Igreja, de facto, embora de si possua a totalidade ou à plenitude dos meios de salvação, não actua nem pode actuar sempre e imediatamente com todos eles, mas vai por tentativas e por passos na sua acção e no seu esforço de levar a efeito os desígnios de Deus. As vezes até, depois dum avanço, felizmente lançado, vê-se infelizmente obrigada a deplorar de novo uma regressão, ou, pelo menos, a demorar-se num certo estádio de semi-vitalidade e insuficiência. Quanto aos indivíduos, agrupamentos e povos, a esses só gradualmente os atinge e os penetra, e só assim os traz à plenitude católica. A cada condicionalismo e a cada situação devem corresponder acções apropriadas ou meios aptos.

O nome de «missões» dá-se geralmente àquelas actividades características com que os pregoeiros do Evangelho, indo pelo mundo inteiro enviados pela Igreja, realizam o encargo de pregar o Evangelho e de implantar a mesma Igreja entre os povos ou grupos que ainda não crêem em Cristo. Essas «missões» são levadas a efeito pela actividade missionária e exercem-se ordinàriamente em certos territórios reconhecidos pela Santa Sé. O fim próprio desta actividade missionária é a evangelização e a implantação da Igreja nos povos ou grupos em que ainda não está radicada (34). Assim, a partir da semente da palavra de Deus, é necessário que se desenvolvam por toda a parte igrejas autóctones particulares, dotadas de forças próprias e maturidade, com hierarquia própria unida ao povo fiel, suficientemente providas de meios proporcionados a uma vida cristã plena, contribuindo para o bem da Igreja universal. O meio principal desta implantação é a pregação do Evangelho de Jesus Cristo. Para o anunciar, enviou o Senhor pelo mundo inteiro os seus discípulos, a fim de que os homens, uma vez renascidos pela palavra de Deus, fossem agregados pelo Baptismo à Igreja, a qual, como corpo do Verbo encarnado, se nutre e vive da palavra de Deus e do pão eucarístico.

Nesta actividade missionária da Igreja dão-se, por vezes, simultâneamente, situações diversas: a de começo ou implantação, primeiro, e a de crescimento ou juventude, depois. Ultrapassadas estas etapas, não acaba, contudo, a acção missionária da Igreja, mas é às igrejas particulares já constituídas que incumbe o dever de a continuar pregando o Evangelho a todos aqueles que ainda tenham ficado de fora. Há a considerar também que as comunidades em que a Igreja vive, não raras vezes e por variadas causas mudam radicalmente, de maneira a poderem daí advir condições de todo novas. Então, deve a Igreja ponderar se tais condicionalismos não exigem de novo a sua actividade missionária.

Mais: por vezes, as circunstâncias são tais que não há possibilidades, por um tempo, de propor directa e imediatamente a mensagem evangélica: então é evidente que podem os missionários e até devem dar ao menos o testemunho da caridade e da beneficência de Cristo, pacientemente, com prudência e ao mesmo tempo grande confiança. Assim, não só prepararão os caminhos ao Senhor mas até o tornarão já de alguma maneira presente.

É, pois, bem de ver como a actividade missionária dimana intimamente da própria natureza da Igreja, cuja fé salvífica propaga, cuja unidade católica dilatando aperfeiçoa, em cuja apostolicidade se apoia, cujo afecto colegial de sua hierarquia exercita, cuja santidade testemunha, difunde e promove. É bem de ver também que a actividade missionária entre gentios difere tanto da actividade pastoral que se exerce com os fiéis, como das iniciativas pela reunificação dos cristãos. Contudo, ambas estas actividades andam estreitamente ligadas à actividade missionária da Igreja (35): pois a divisão dos cristãos prejudica a santíssima causa de pregar o Evangelho a toda a criatura (36) e fecha a muitos o acesso à fé. Por isso, por uma necessidade missionária, todos os baptizados são chamados a unir-se num rebanho para assim poderem dar um testemunho unânime de Cristo, seu Senhor, perante os gentios. Mas se ainda não podem, de completo acordo, dar testemunho duma só fé, é preciso que, ao menos, estejam animados de mútua estima e caridade.

Actividade missionária da Igreja: suas causas e necessidades

7. A razão desta actividade missionária vem da vontade de Deus, que «quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Ora há um só Deus, e um só que é mediador de Deus e dos homens, o homem Cristo Jesus, que se deu a si mesmo como preço de resgate por todos» (l Tim. 2, 4-6), «e não há salvação em nenhum outro» (Act. 4,12). Portanto, é preciso que todos se convertam a Cristo conhecido pela pregação da Igreja e que sejam incorporados, pelo Baptismo, a Ele e à Igreja, seu corpo. O próprio Cristo, aliás, ao inculcar por palavras expressas a necessidade da fé e do Baptismo (37), confirmou também, por isso mesmo, a necessidade da Igreja, na qual os homens entram pelo Baptismo, que é como que a porta de entrada. Por isso, não se poderiam salvar aqueles que, não ignorando que Deus fundou por intermédio de Jesus Cristo a Igreja católica como necessária, não quisessem, apesar disso, entrar nela ou nela perseverar» (38). Por isso também, embora Deus, por caminhos que só Ele sabe, possa conduzir à fé, sem a qual é impossível ser-se-Lhe agradável (39), os homens que ignoram o Evangelho sem culpa sua, incumbem à Igreja, apesar de tudo, a obrigação (40) e o sagrado direito de evangelizar. Daí vem que a actividade missionária conserve ainda hoje e haja de conservar sempre toda a sua eficácia e a sua necessidade.

Por ela incessantemente vai cobrando e organizando as forças para seu crescimento o Corpo místico de Cristo (41). Ao exercício desta actividade são impelidos, sem cessar, os membros da Igreja, pela caridade com que amam a Deus e com que desejam comunicar a todos os homens os bens espirituais tanto da vida presente como da futura.

Finalmente, por esta actividade missionária é Deus plenamente glorificado enquanto os homens por ela recebem, plena e conscientemente, a obra de salvação que Ele em Cristo levou a cabo. E assim se realizam por ela os desígnios de Deus, aos quais Cristo serviu com obediência e amor para glória do Pai que o enviou (42), e para que todo o género humano forme um só Povo de Deus, se una num só corpo de Cristo, e se edifique num só templo do Espírito Santo: o qual, ao restabelecer a concórdia fraterna, vem precisamente ao encontro das aspirações mais íntimas de todos os homens. Finalmente, quando todos os que participam da natureza humana, uma vez regenerados em Cristo pelo Espírito Santo e já na visão unânime da glória de Deus Pai, puderem dizer: «Pai nosso» (43), então se há-de realizar deveras o intento do Criador ao fazer o homem à Sua imagem e semelhança.

Actividade missionária da Igreja na vida e na história humana

8. Também com a própria natureza humana e suas aspirações tem íntima conexão a actividade missionária. Com efeito, ao dar a conhecer Cristo, a Igreja revela, por isso mesmo, aos homens a genuína verdade da sua condição e da sua integral vocação, pois Cristo é o princípio e o modelo da humanidade renovada e imbuída de fraterno amor, sinceridade e espírito de paz, à qual todos aspiram.

Cristo e a Igreja que d'Ele dá testemunho pela pregação evangélica, transcendem todos os particularismos de estirpe ou de nação e, por isso, não podem ser considerados estranhos a ninguém e em nenhuma parte (44). É próprio Cristo é aquela verdade e aquele caminho que a pregação evangélica a todos abre ao levar aos ouvidos de todos as palavras que Ele mesmo disse: «Arrependei-vos e crede no Evangelho» (Mc. 1,15). Porém, como quem não crê já está julgado (45), as palavras de Cristo são, ao mesmo tempo, palavras de juízo e de graça, de morte e de vida. n que só infligindo a morte ao que é velho podemos ter acesso à novidade de vida: e isto, que vale, em primeiro lugar, das pessoas, vale também dos diversos bens deste mundo que estão marcados tanto pelo pecado do homem como pela bênção de Deus: «porque todos pecaram e todos estão privados da glória de Deus» (Rom. 3,23). Por si mesmo e por próprias forças não há ninguém que se liberte do pecado e se eleve acima de si mesmo, ninguém absolutamente que se liberte a si mesmo da sua enfermidade, da sua solidão ou da sua escravidão (46), mas todos precisam de Cristo como modelo, mestre, libertador, salvador, vivificador. De facto, na história humana, mesmo sob o ponto de vista temporal, o Evangelho foi um fermento de liberdade e de progresso e apresenta-se sempre como fermento de fraternidade, de unidade e de paz. Não é sem razão, por isso, que Cristo é celebrado pelos fiéis como «o esperado das nações e o seu salvador» (47).

Carácter escatológico da actividade missionária da Igreja

9. A actividade missionária desenrola-se entre o primeiro e o segundo advento do Senhor, em que a Igreja há-de ser reunida dos quatro ventos como uma colheita, no reino de Deus (48). Mas antes de o Senhor vir, tem de ser pregado o Evangelho a todos os povos (49).

A actividade missionária não é outra coisa, nem mais nem menos, que a manifestação ou epifania dos desígnios de Deus e a sua realização no mundo e na sua história, na qual Deus, pela missão, manifestamente vai tecendo a história da salvação. Pela palavra da pregação e pela celebração dos sacramentos de que a Eucaristia é o centro e a máxima expressão, torna presente a Cristo, autor da salvação. Por outro lado, tudo o que de verdade e de graça se encontrava já entre os gentios como uma secreta presença de Deus, expurga-o de contaminações malignas e restitui-o ao seu autor, Cristo, que destrói o império do demónio e afasta toda a malícia dos pecados. O que de bom há no coração e no espírito dos homens ou nos ritos e culturas próprias dos povos, não só não se perde, mas é purificado, elevado e consumado para glória de Deus, confusão do demónio e felicidade do homem (50). A actividade missionária tende assim para a plenitude escatológica (51): por ela, com efeito, se estende, segundo as dimensões e os tempos que o Pai fixou com o seu próprio poder (52), o Povo de Deus a quem foi dito profèticamente: «Dilata o acampamento das tuas tendas e estende as telas das tuas barracas! Não te acanhes» (Is. 54,2) (53); por ela cresce o Corpo místico até constituir esse homem perfeito, na força da idade, que realiza a plenitude de Cristo (54); por ela se levanta e se vai edificando sobre os alicerces dos Apóstolos e dos profetas e com o próprio Cristo Jesus por pedra angular (Ef. 2,20), o templo espiritual onde Deus é adorado em espírito e verdade (55).

CAPÍTULO II

A OBRA MISSIONÁRIA EM SI MESMA

Introdução: A actividade missionária da Igreja no mundo actual

10. Enviada por Cristo a manifestar e a comunicar a todos os homens e povos a caridade de Deus, a Igreja reconhece que tem de levar a cabo uma ingente obra missionária. É que, na verdade, dois biliões de homens, número que cresce de dia para dia, em grandes e determinados agrupamentos, unidos por laços estáveis de vida cultural, por antigas tradições religiosas, por estreitos vínculos de relações sociais, ou ainda não receberam a mensagem do Evangelho, ou mal ouviram falar dela; dentre eles, uns seguem alguma das grandes religiões, outros permanecem estranhos ao conhecimento de Deus, outros negam expressamente a sua existência, ou até mesmo a atacam. A fim de poder oferecer a todos o mistério de salvação e a vida trazida por Deus, a Igreja deve inserir-se em todos esses agrupamentos, impelida pelo mesmo movimento que levou o próprio Cristo, na incarnação, a sujeitar-se às condições sociais e culturais dos homens com quem conviveu.

Art. 1

O TESTEMUNHO CRISTÃO

Testemunho de vida e diálogo

11. A Igreja tem de estar presente a estes agrupamentos humanos por meio dos seus filhos que entre eles vivem ou a. eles são enviados. Com efeito, todos os fiéis cristãos, onde quer que vivam, têm obrigação de manifestar, pelo exemplo da vida e pelo testemunho da palavra, o homem novo de que se revestiram pelo Baptismo, e a virtude do Espírito Santo por quem na Confirmação foram robustecidos, de tal modo que os demais homens, ao verem as suas boas obras, glorifiquem o Pai (1) e compreendam, mais plenamente o sentido genuíno da vida humana e o vínculo universal da comunidade humana.

Para poderem dar frutuosamente este testemunho de Cristo, unam-se a esses homens com estima e caridade, considerem-se a si mesmos como membros dos agrupamentos humanos em que vivem, e participem na vida cultural e social através dos vários intercâmbios e problemas da vida humana; familiarizem-se com as suas tradições nacionais e religiosas; façam assomar à luz, com alegria e respeito, as sementes do Verbo neles adormecidas; mas atendam, ao mesmo tempo, à transformação profunda que se opera entre os povos e trabalhem por que os homens do nosso tempo não dêem tanta importância à ciência e tecnologia do mundo moderno que se alheiem das coisas divinas, mas, antes pelo contrário, despertem para um desejo mais profundo da verdade e da caridade reveladas por Deus. Assim como o próprio Cristo perscrutou o coração dos homens e por meio da sua conversação verdadeiramente humana os conduziu à luz divina, assim os seus discípulos, profundamente imbuídos do Espírito de Cristo, tomem conhecimento dos homens no meio dos quais vivem, e conversem com eles, para que, através dum diálogo sincero e paciente, eles aprendam as riquezas que Deus liberalmente outorgou aos povos; mas esforcem-se também por iluminar estas riquezas com a luz evangélica, por libertá-las e restituí-las ao domínio de Deus Salvador.

Presença da caridade

12. A presença dos cristãos nos agrupamentos humanos seja animada daquela caridade com que Deus nos amou, e com a qual quer que também nós nos amemos uns aos outros (2).

Efectivamente, a caridade cristã a todos se estende sem discriminação de raça, condição social ou religião; não espera qualquer lucro ou agradecimento. Portanto, assim como Deus nos amou com um amor gratuito, assim também os fiéis, pela sua caridade, sejam solícitos pelos homens, amando-os com o mesmo zelo com que Deus veio procurá-los. E assim como Cristo percorria todas as cidades e aldeias, curando todas as doenças e todas as enfermidades, proclamando o advento do reino e Deus (3), do mesmo modo a Igreja, por meio dos seus filhos, estabelece relações com os homens de qualquer condição, de modo especial cm os pobres e aflitos, e de bom grado por eles gasta as forças (4). Participa nas suas alegrias e dores, conhece as suas aspirações e os problemas da sua vida e sofre com eles nas ansiedades da morte, trazendo-lhes a paz e a luz do Evangelho.

Trabalhem e colaborem os cristãos com todos os outros na recta ordenação dos problemas económicas e sociais. Dediquem-se, com cuidado especial, à educação das crianças e da juventude por meio das várias espécies de escolas, as quais hão-de ser consideradas não só como meio exímio de formação e promoção da juventude cristã, mas também, simultâneamente, como serviço da maior importância para os homens, e em particular para as nações em vias de desenvolvimento, a fim de elevar a dignidade do homem e preparar condições de vida mais humanas. Além disso, tomem parte nos esforços dos povos que, lutando contra a fome, a ignorância e a doença, se afadigam por melhorar as condições de vida e por assegurar a paz no mundo. Nesta actividade prestem os fiéis, com prudência, a sua colaboração efectiva às iniciativas promovidas pelas instituições particulares e públicas, pelos governos, pelos organismos internacionais, pelas diversas comunidades cristãs e religiões não-cristãs.

A Igreja, porém, não quer, de maneira nenhuma, imiscuir-se no governo da cidade terrena. Nenhuma outra autoridade reclama para si senão a de, com a ajuda de Deus, estar ao serviço dos homens pela caridade e pelo serviço fiel (5).

Intimamente unidos com os homens na vida e no trabalho, os discípulos de Cristo esperam oferecer-lhes o verdadeiro testemunho de Cristo e trabalhar na salvação deles, mesmo quando não podem anunciar plenamente a Cristo. Porque não procuram o progresso e a prosperidade material dos homens, mas promovem a sua dignidade e fraterna união, ensinando as verdades religiosas e morais, que Cristo esclareceu com a Sua luz. Deste modo, vão abrindo pouco a pouco o acesso mais pleno a Deus. Assim, os homens são auxiliados na aquisição da salvação pela caridade para com Deus e para com o próximo, e começa a brilhar o mistério de Cristo, no qual apareceu o homem novo que foi criado segundo Deus, (cfr. Ef. 4,24), e no qual se revela a caridade divina.

Art. 2

A PREGAÇÃO DO EVANGELHO E A REUNIÃO DO POVO DE DEUS

Evangelização e conversão

13. Sempre que Deus abre a porta da palavra para anunciar o mistério de Cristo (7) a todos os homens (8), com confiança e constância (9) seja anunciado (10) o Deus vivo, e Aquele que Ele enviou para a salvação de todos, Jesus Cristo(11), para que os não-cristãos, sob a inspiração interior do Espírito Santo (12), se convertam livremente à fé no Senhor, e adiram sinceramente Aquele que, sendo «caminho, verdade e vida» (Jo. 14,6), cumula todas as suas esperanças espirituais, mais ainda, supera-as infinitamente. Esta conversão há-de considerar-se como inicial, mas suficiente para o homem cair na conta de que, arrancado ao pecado, é introduzido no mistério do amor de Deus, que o chama a entabular relações pessoais consigo em Cristo. Pois, sob a acção da graça de Deus, o neo-convertido inicia o caminho espiritual pelo qual, comungando já pela fé no mistério da morte e ressurreição, passa do homem velho ao homem novo que tem em Cristo a sua perfeita realização (13).

Esta passagem, que traz consigo uma mudança progressiva de mentalidade e de costumes, deve manifestar-se e desenvolver-se, com as suas consequências sociais, durante o tempo do catecumenado. Porque o Senhor em que acreditamos, é sinal de contradição (14), o homem convertido experimenta frequentemente rupturas e separações, mas também alegrias que Deus concede sem medida (15). A Igreja proíbe severamente obrigar quem quer que seja a abraçar a fé, ou induzi-lo e atraí-lo com processos indiscretos, do mesmo modo que reclama com vigor o direito de ninguém ser afastado da fé por meio de vexações iníquas (16).

Em conformidade com o antiquíssimo costume da Igreja, investiguem-se os motivos da conversão e, se for necessário, purifiquem-se.

Catecumenado e iniciação cristã

14. Aqueles que receberam de Deus por meio da Igreja a fé em Cristo (17), sejam admitidos ao catecumenado, mediante a celebração de cerimónias litúrgicas; o catecumenado não é mera exposição de dogmas e preceitos, mas uma formação e uma aprendizagem de toda a vida cristã; j prolongada de modo conveniente, por cujo meio os discípulos se unem comi Cristo seu mestre. Por conseguinte, sejam os catecúmenos conveniente: mente iniciados no mistério da salvação, na prática dos costumes evangélicos, e com ritos sagrados, a celebrar em tempo sucessivos (18), sejam introduzidos na vida da fé, da liturgia e da caridade do Povo de Deus.

Em seguida, libertos do poder das trevas pelos sacramentos da iniciação cristã (19), mortos com Cristo e com Ele sepultados e ressuscitados (20) recebem o Espírito (21) de adopção de filhos e celebram com todo o Povo de Deus o memorial da morte e ressurreição do Senhor.

É de desejar que a liturgia do tempo quaresmal e pascal seja reformada de maneira a preparar os corações dos catecúmenos para a celebração do mistério pascal, durante cujas solenidades eles são regenerados para Cristo pelo Baptismo.

Esta iniciação cristã realizada no catecumenado deve ser obra não apenas dos catequistas ou sacerdotes, mas de toda a comunidade dos fiéis, especialmente dos padrinhos, de forma que desde o começo os catecúmenos sintam que pertencem ao Povo de Deus. Visto que a vida da Igreja é apostólica, os catecúmenos devem igualmente aprender a cooperar activamente; pelo testemunho da sua vida e a profissão da sua fé, na evangelização e na construção da Igreja.

Enfim, o estado jurídico dos catecúmenos deve ser fixado claramente no novo Código. Pois eles estão já unidos à Igreja (22), já são da casa de Cristo (23), e, não raro, eles levam já uma vida de fé, de esperança e de caridade.

Art. 3

A FORMAÇÃO DA COMUNIDADE CRISTÃ

Formação da comunidade cristã

15. O Espírito Santo, que chama todos os homens a Cristo pelas  sementes do Verbo e pela pregação do Evangelho e suscita nos corações a homenagem da fé, quando gera no seio da fonte baptismal para uma nova vida os que crêem em Cristo, reune-os num só Povo de Deus que é graça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido»

Portanto, os missionários, colaboradores de Deus (25), devem fazer nascer comunidades de fiéis que, levando uma vida digna da vocação que receberam (26), sejam tais que possam exercer as funções a elas confiadas por Deus: sacerdotal, profética e real. E deste modo que uma comunidade cristã se torna sinal da presença de Deus no mundo: pelo sacrifício eucarístico, com efeito, passa incessantemente com Cristo ao Pai (27), alimentada cuidadosamente pela palavra de Deus (28) dá testemunho de Cristo (29), caminha, enfim, na caridade e arde em espírito apostólico (30).

Uma comunidade cristã deve ser constituída desde o começo de tal maneira que possa, na medida do possível, prover por si mesma às suas necessidades. Esta comunidade de fiéis, dotada das riquezas culturais da sua própria nação, deve estar profundamente enraizada no povo: devem desabrochar as famílias penetradas do espírito evangélico (31) e ajudadas por escolas idóneas; devem organizar-se associações e agrupamentos por meio dos quais o apostolado dos leigos possa penetrar do espírito evangélico toda a sociedade. A caridade deve brilhar, enfim, entre os católicos de rito diferente (32).

Deve também nutrir-se entre os néofitos o espírito ecuménico, pensando justamente que os irmãos que crêem em Cristo são discípulos de Cristo, regenerados pelo Baptismo, participantes de numerosos bens do Povo de Deus. Quanto o permitirem as condições religiosas, deve promover-se a acção ecuménica, de sorte que, banindo toda a aparência de indiferentismo, de confusionismo e odiosa rivalidade, os católicos colaborem com os irmãos separados, em conformidade com as disposições do decreto sobre o Ecumenismo, por meio da comum profissão de fé em Deus e em Jesus Cristo diante dos gentios, na medida do possível, e pela cooperação em questões sociais e técnicas, culturais e religiosas. Colaborem, sobretudo, por amor de Cristo, seu Senhor comum: que o Seu nome os una! Esta colaboração deve ser estabelecida não sòmente entre os indivíduos, mas também, a juízo do Ordinário do lugar, entre igrejas ou comunidades eclesiais e as suas obras.

Os cristãos, provenientes de todos os povos e reunidos em Igreja, «não se distinguem dos outros homens nem pelo país, nem pela língua, nem pela organização política» (33); devem, por isso, viver para Deus e para Cristo segundo os usos do seu próprio povo; cultivem verdadeira e eficazmente, como bons cidadãos, o amor da pátria, mas evitem absolutamente o desprezo pelas outras raças, o nacionalismo exagerado, e promovam o amor universal dos homens.

Para conseguir estes resultados, têm grandíssima importância e são dignos de um interesse particular os leigos, isto é, os fiéis cristãos que, incorporados em Cristo pelo Baptismo, vivem no mundo. A eles pertence, depois de penetrados do Espírito de Cristo, animar interiormente, à maneira de fermento, as realidades temporais e dispô-las para que se realizem sempre segundo Cristo (34).

Não basta, porém, que o povo cristão esteja presente e estabelecido num país; não basta também que ele exerça o apostolado do exemplo; está estabelecido, está presente com esta finalidade: anunciar Cristo aos seus concidadãos não-cristãos pela palavra e pela acção, e ajudá-los a receber plenamente a Cristo.

Ora bem: para a implantação da Igreja e para o desenvolvimento da comunidade cristã, são necessários ministérios diversos, que, suscitados pelo apelo divino no seio da mesma comunidade dos fiéis, devem ser encorajados e cultivados por todos com diligente cuidado; entre estes ministérios, há as funções dos sacerdotes, dos diáconos e dos catequistas, e a acção católica. De modo análogo, os religiosos e as religiosas desempenham, quer pela oração quer pela acção, um serviço indispensável para enraizar nos corações o reino de Cristo, fortificá-lo e estendê-lo mais ao longe.

Constituição do clero local

16. Com imensa alegria, a Igreja dá graças pelo dom inapreciável da vocação sacerdotal que Deus concedeu a tão avultado número de jovens entre os povos recentemente convertidos a Cristo. A Igreja, efectivamente, lança raízes mais vigorosas em cada agrupamento humano, quando as várias comunidades de fiéis tiram dentre os seus membros os próprios ministros da salvação na ordem dos Bispos, dos presbíteros e dos diáconos, que servem os seus irmãos, de tal sorte que as jovens igrejas adquirem a pouco e pouco a estrutura diocesana com clero próprio.

Aquilo que foi decidido por este Concílio a propósito da vocação e da formação sacerdotal, observe-se religiosamente nos lugares em que a Igreja começa a implantar-se e também nas novas igrejas. Preste-se muita atenção ao que foi dito sobre a formação espiritual intimamente unida à formação doutrinal e pastoral da vida vivida segundo o espírito do Evangelho, sem consideração de vantagem pessoal ou interesse familiar, e sobre a formação do sentido íntimo do mistério da Igreja. Assim aprenderão de maneira maravilhosa a consagrar-se inteiramente ao serviço do corpo de Cristo e à obra do Evangelho, a aderir ao próprio Bispo como fiéis colaboradores e a prestar leal colaboração aos seus irmãos (35).

Para conseguir este fim geral, toda a formação dos alunos deve ser orientada à luz do mistério da salvação, como vem exposto na Escritura. Descubram e vivam este mistério de Cristo e da salvação dos homens presente na Liturgia (36).

Estas exigências comuns da formação sacerdotal, que é também pastoral e prática, devem harmonizar-se, segundo as disposições do Concílio (37), com o desejo de ir ao encontro do modo particular de pensar e de agir da sua própria nação. Os espíritos dos alunos devem, pois, abrir-se e cultivar-se para bem conhecerem e poderem apreciar a cultura do seu país; nas disciplinas filosóficas e teológicas, devem tomar conhecimento das relações que há entre as tradições e as religiões nacionais e a religião cristã (38). Do mesmo modo, a formação sacerdotal deve ter em vista as necessidades pastorais da região: os alunos devem aprender a história, a finalidade e o método da acção missionária da Igreja, e as condições particulares, sociais, económicas e culturais do seu próprio povo. Devem ser educados no espírito de ecumenismo e convenientemente preparados para o diálogo fraterno com os não-cristãos (39). Tudo isto pede que os estudos para o sacerdócio sejam realizados, quanto possível, em ligação contínua e convivência com a gente do próprio país (40). Procure-se enfim, dar, uma formação que prepare para a ordenada administração eclesiástica, e até mesmo a económica.

Dever-se-á também escolher sacerdotes capazes que, depois de alguma experiência pastoral, realizem estudos superiores em Universidades, mesmo estrangeiras, sobretudo em Roma, e em outros Institutos científicos, de sorte que as igrejas jovens tenham à sua disposição sacerdotes do clero local, dotados de ciência e experiência convenientes, para desempenharem as funções eclesiásticas de maior responsabilidade.

Nos lugares em que as Conferências episcopais julgarem oportuno, restabeleça-se a ordem do diaconado como estado de vida permanente, em conformidade com as normas da Constituição sobre a Igreja (41). É útil, com efeito, que para exercer um ministério verdadeiramente diaconal, quer pregando a palavra de Deus como catequistas, quer dirigindo em nome do pároco e do Bispo comunidades cristãs dispersas, quer exercendo a caridade em obras sociais ou caritativas, sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitida desde o tempo dos Apóstolos, e mais estreitamente unidos ao altar, para que desempenhem o seu ministério mais eficazmente, por meio da graça sacramental do diaconado.

Formação dos catequistas

17. De modo semelhante, é digno de elogio aquele exército com tantos méritos na obra das missões entre pagãos, o exército dos catequistas, homens e mulheres, que, cheios do espírito apostólico, prestam com grandes trabalhos uma ajuda singular e absolutamente necessária à expansão da fé e da Igreja.

Hoje em dia, em razão da escassez de clero para evangelizar tão grandes multidões e exercer o ministério pastoral, o ofício dos catequistas tem muitíssima importância. A sua formação deve, portanto, fazer-se de maneira tão acomodada ao progresso cultural, que eles possam desempenhar o mais perfeitamente possível o seu múnus como colaboradores eficazes da ordem sacerdotal, múnus esse que se vai complicando com novas e maiores obrigações.

É preciso, portanto, multiplicar as escolas diocesanas e regionais, nas quais os futuros catequistas estudem cuidadosamente a doutrina católica, sobretudo em matéria bíblica e litúrgica, assim como o método catequético e a prática pastoral, e se formem na moral cristã (42), exercitando-se sem desfalecimentos na piedade e na santidade de vida. Além disso, devem organizar-se reuniões ou cursos de actualização nas disciplinas e nas artes úteis ao seu ministério, e de renovação e robustecimento da sua vida espiritual. Por outro lado, aos que se dedicam inteiramente a esta ocupação, dever-se-á proporcionar, por uma justa remuneração, conveniente nível de vida e segurança social (43).

É de desejar que se proveja, de maneira conveniente, à formação e sustentação dos catequistas, por meio de subsídios especiais da sagrada Congregação de «Propaganda Fide». Parecendo necessário e conveniente, funde-se uma Obra para os catequistas.

Além disso, as igrejas serão reconhecidas ao trabalho generoso dos catequistas auxiliares, cuja ajuda lhes será indispensável. São eles que presidem às orações nas comunidades e ensinam a doutrina. É preciso, pois, tratar da sua conveniente formação doutrinal e espiritual. Por outro lado, é de desejar que, onde parecer oportuno, seja confiada pùblicamente, durante a celebração duma acção litúrgica, a missão canónica aos catequistas que tiverem recebido a devida formação, a fim de. estarem com maior autoridade ao serviço da fé junto do povo.

Promoção da vida religiosa

18. Desde o período da implantação da Igreja, deve ter-se o cuidado de promover a vida religiosa; esta não sòmente presta ajuda preciosa e absolutamente necessária à actividade missionária, mas, por uma consagração mais íntima feita a Deus na Igreja, manifesta e significa com esplendor também a natureza íntima da vocação cristã. (44)

Os Institutos religiosos que trabalham na implantação da Igreja, profundamente impregnados das riquezas místicas que são a glória da tradição religiosa da Igreja, devem esforçar-se por as exprimir e as transmitir, segundo o génio e carácter de cada povo. Devem examinar como é que as tradições ascéticas e contemplativas, cujos germes foram, algumas vezes, espalhados por Deus nas civilizações antigas, antes da pregação do Evangelho, podem ser assumidas pela vida religiosa cristã.

Devem cultivar-se nas igrejas jovens as diversas formas de vida religiosa para que mostrem os diversos aspectos da missão de Cristo e da vida da Igreja, e se dediquem às várias obras pastorais, e preparem convenientemente os seus membros para as desempenhar. No entanto, procurem os Bispos nas Conferências que não se multipliquem Congregações com o mesmo fim apostólico, com prejuízo da vida religiosa e do apostolado.

São dignas de menção especial as diversas iniciativas em vista ao enraizamento da vida contemplativa; certos Institutos, guardando os elementos essenciais da instituição monástica, trabalham por implantar a riquíssima tradição da sua Ordem; outros voltam às formas mais simples do monaquismo antigo. Todos, no entanto, devem procurar uma autêntica adaptação às condições locais. Uma vez que a vida contemplativa pertence à plenitude da presença da Igreja, é preciso que ela seja instaurada por toda a parte nas novas igrejas.

CAPÍTULO III

AS IGREJAS PARTICULARES

Incremento das Igrejas jovens

19. A obra de implantação da Igreja num determinado agrupamento humano atinge em certa medida o seu termo, quando a comunidade dos fiéis, enraizada já na vida social e adaptada à cultura local, goza de alguma estabilidade e firmeza: com recursos próprios, ainda que insuficientes, de clero local, de religiosos e de leigos; possui já os ministérios e instituições necessárias para viver e desenvolver a vida do Povo de Deus, sob a orientação do próprio Bispo.

Nestas igrejas jovens, a vida do Povo de Deus deve adquirir a maturidade em todos os sectores da vida cristã, renovada segundo as normas deste Concílio: os grupos de fiéis tornam-se de dia para dia mais conscientemente comunidades de fé, de liturgia e de caridade; pela sua actividade cívica e apostólica, os leigos trabalham por instaurar na sociedade uma ordem de caridade e de justiça; os meios de comuniçação social são empregados de maneira oportuna e prudente; graças a uma vida verdadeiramente cristã, as famílias tornam-se viveiros do apostolado dos leigos e das vocações sacerdotais e religiosas. A fé, enfim, é ensinada por meio duma catequese adaptada, é celebrada numa liturgia conforme ao génio do povo, e, por uma legislação canónica conveniente, passa para as instituições e para os costumes locais.

Os Bispos, cada um com o seu presbitério, cada vez mais penetrados do sentido de Cristo e da Igreja, devem sentir e viver com a Igreja universal. Deve manter-se íntima a comunhão das igrejas jovens com a Igreja inteira, cujos elementos tradicionais elas devem juntar à sua cultura própria, para fazer crescer a vida do Corpo místico por meio de trocas mútuas(1). Por isso, devem cultivar-se os elementos teológicos, psicológicos e humanos que podem contribuir para fomentar este sentido de comunhão com a Igreja universal.

Estas igrejas, porém, não raro situadas nas regiões mais pobres do globo, vêem-se ainda a braços com insuficiência, ordinàriamente muito grave, de sacerdotes, e com falta de recursos materiais. Por isso, têm muitíssima necessidade de que a acção missionária continuada da Igreja inteira lhes subministre os socorros que sirvam, antes de mais, para o desenvolvimento da igreja local e para a maturidade da vida cristã. Esta acção missionária deve atender também às igrejas fundadas há longa data que se encontram em estado de retrocesso ou decadência.

Estas igrejas, todavia, devem renovar o seu zelo pastoral comum e as obras oportunas para aumentar em número, discernir com mais segurança e cultivar com mais eficácia as vocações para o clero diocesano e para os Institutos religiosos (2), de maneira que, pouco a pouco, possam prover às suas próprias necessidades e auxiliar as outras.

A sua actividade missionária

20. A igreja particular, pela obrigação que tem de representar o mais perfeitamente possível a Igreja universal, deve ter consciência que foi também enviada aos habitantes do mesmo território que não crêem em Cristo, a fim de ser, pelo testemunho da vida de cada um dos fiéis e de toda a comunidade, um sinal a mostrar-lhes Cristo.

Além disso, para o Evangelho chegar a todos, é indispensável o ministério da palavra. É preciso que o Bispo seja, antes de mais, um pregador da fé, que conduza a Cristo novos discípulos (3). Para se desempenhar, como convém, desta nobre incumbência, deve conhecer bem a situação do seu rebanho, as opiniões íntimas dos seus concidadãos a respeito de Deus, tomando cuidadosamente em linha de conta as mudanças introduzidas pela urbanização, migração e indiferentismo religioso.

Nas igrejas jovens, os sacerdotes nativos empreendam com ardor a obra da evangelização, organizando uma acção comum com os missionários estrangeiros, com os quais formam um presbitério único, unido debaixo da autoridade do Bispo, não só para apascentar os fiéis e celebrar o culto divino, mas também para pregar o Evangelho àqueles que estão fora. Eles devem mostrar-se prontos e, havendo ocasião, oferecer-se com fervor ao Bispo para empreender o trabalho missionário nas regiões afastadas e abandonadas da sua própria diocese, ou em outras dioceses.

Do mesmo zelo em relação aos seus concidadãos, sobretudo os mais pobres, devem sentir-se animados os religiosos e as religiosas, bem como os leigos.

As Conferências episcopais procurem organizar, em tempos. determinados, cursos de renovação bíblica, teológica, espiritual e pastoral, para que, na variedade e mudança de situações, o clero adquira um conhecimento mais pleno da ciência teológica e dos métodos pastorais.

Quanto ao mais, observe-se religiosamente o que este Concílio determinou, especialmente no decreto sobre o ministério e a vida dos sacerdotes.

Para que esta obra missionária duma igreja particular possa ser levada a bom termo, é necessário que haja ministros capazes, oportunamente preparados em conformidade com o condicionalismo de cada igreja. Uma vez que os homens se reúnem cada vez mais em grupos, convém absolutamente que as Conferências episcopais tenham planos comuns sobre . o diálogo a instituir com esses grupos. Se em certas regiões se encontram grupos de homens, que são impedidos de abraçar a fé católica pelo facto de não poderem adaptar-se à forma particular que a Igreja aí tenha revestido, é de desejar que se proveja de maneira especial a essa situação (4), até que todos os cristãos possam ser congregados numa só comunidade. Os Bispos devem chamar para as suas dioceses ou receber de boa vontade os missionários de que a Sé Apostólica puder dispor para esta finalidade, e favorecer eficazmente as suas iniciativas.

Para que este zelo missionário comece a florescer entre os naturais do país, convém absolutamente que as igrejas jovens participem efectivamente na missão universal da Igreja, enviando elas também missionários a anunciar o Evangelho por toda a terra, ainda que elas sofram de falta de clero. A comunhão com a Igreja inteira estará, de certo modo, consumada quando, também elas, tomarem parte activa na acção missionária junto de outros povos.

Promoção do apostolado dos leigos

21. A Igreja não está fundada verdadeiramente, nem vive plenamente, nem é o sinal perfeito de Cristo entre os homens se, com a Hierarquia, não existe e trabalha um laicado autêntico. De facto, sem a presença activa dos leigos, o Evangelho não pode gravar-se profundamente nos espíritos, na vida e no trabalho de um povo. Por isso, é necessário desde a fundação da Igreja prestar grande atenção à formação dum laicado cristão amadurecido.

Os leigos pertencem, ao mesmo tempo, ao Povo de Deus e à sociedade civil: pertencem, por um lado, à nação em que nasceram, de cujos tesouros culturais participam pela educação, a cuja vida estão ligados por múltiplos laços sociais, para cujo progresso cooperam com o seu esforço nas suas profissões, cujos problemas sentem e procuram resolver como próprios; pertencem também a Cristo, porque foram regenerados na Igreja pela fé e pelo Baptismo, a fim de serem de Cristo(5) pela renovação da vida e acção, para que em Cristo tudo seja submetido a Deus, e, enfim, Deus seja tudo em todos (6).

O principal dever deles, homens e mulheres, é o testemunho de Cristo, que eles têm obrigação de dar, pela sua vida e palavras, na família, no grupo social, no meio profissional. É necessário que se manifeste neles o homem novo criado segundo Deus em justiça e santidade verdadeira (7). Devem exprimir esta novidade de vida no meio social e cultural da sua pátria, em conformidade com as tradições nacionais. Devem conhecer esta cultura, purificá-la, conservá-la, desenvolvê-la segundo as novas situações, enfim, dar-lhe a sua perfeição em Cristo, a fim que a fé em Cristo e a vida da Igreja deixem de ser estranhas à sociedade em que vivem mas comecem a penetrá-la e a transformá-la. Devem unir-se aos seus concidadãos com caridade sincera, a fim de que no seu comportamento apareça um novo laço de unidade e de solidariedade universal, haurida no mistério de Cristo. Devem transmitir a fé em Cristo também àqueles a quem estão ligados pela vida e profissão; esta obrigação impõe-se tanto mais quanto a maior parte dos homens não podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo senão pelos seus vizinhos leigos. Mais ainda: onde for possível, devem os leigos estar prontos a cumprir, em colaboração mais imediata com a Hierarquia, a missão especial de anunciar o Evangelho e comunicar a doutrina cristã, a fim de tornarem mais vigorosa a Igreja nascente.

Os ministros da Igreja, por sua vez, devem ter em muito apreço o apostolado activo dos leigos. Devem formá-los para, como membros de Cristo, tomarem consciência da sua responsabilidade em relação aos outros homens; devem instruí-los profundamente no mistério de Cristo, iniciá-los nos métodos práticos, assistir-lhes nas dificuldades, em conformidade com o pensamento da Constituição sobre a Igreja e do decreto sobre o Apostolado dos leigos.

Bem respeitadas as funções e as responsabilidades próprias dos pastores e dos leigos, a jovem igreja toda inteira deve dar um único testemunho vivo e firme de Cristo, a fim de se tornar um sinal luminoso da salvação que em Cristo veio até nós.

Diversidade na Unidade

22. A semente da palavra de Deus, germinando em boa terra, regada pelo orvalho divino, absorve a seiva, transforma-a e assimila-a para produzir fruto abundante. Certamente, de modo análogo à economia da encarnação, as igrejas jovens, enraizadas em Cristo e construídas sobre o fundamento dos Apóstolos, recebem, por um maravilhoso intercâmbio, todas as riquezas das nações que foram dadas a Cristo em heranças. Recebem dos costumes e das tradições dos seus povos, da sabedoria e da doutrina, das artes e das disciplinas, tudo aquilo que pode contribuir para confessar a glória do criador, ilustrar a graça do Salvador, e ordenar, como convém, a vida cristã (9).

Para conseguir este objectivo, é necessário que em cada grande espaço socio-cultural, se estimule uma reflexão teológica tal que, à luz da tradição da Igreja universal, as acções e as palavras reveladas por Deus, consignadas na Sagrada Escritura, e explicadas pelos Padres da Igreja e pelo magistério, sejam sempre de novo investigadas. Assim se entenderá mais claramente o processo de tornar a fé inteligível, tendo em conta a filosofia ou a sabedoria dos povos, e a maneira de os costumes, o sentido da vida e a ordem social poderem concordar com a moral manifestada pela revelação divina. Deste modo se descobrirá o caminho para uma mais profunda adaptação em toda a extensão da vida cristã. Toda a aparência de sincretismo e de falso particularismo, será assim excluída, a vida cristã conformar-se-á bem ao génio de cada cultura (10), as tradições particulares e qualidades próprias de cada nação, esclarecidas pela luz do Evangelho, serão assumidas na unidade católica. Enfim, as novas igrejas particulares, enriquecidas pelas suas tradições, terão o seu lugar na comunhão eclesiástica, ficando intacto o primado da cátedra de Pedro, que preside a toda a assembleia da caridade (11).

É, portanto, de desejar, ou antes, convém absolutamente que as Conferências episcopais, dentro dos limites de cada grande espaço socio-cultural, se unam entre si para, de ânimo concorde e pondo em comum os seus planos, conseguirem este objectivo da adaptação.

CAPÍTULO IV

OS MISSIONÁRIOS

A vocação missionária

23. Embora a todo o discípulo de Cristo incumba a obrigação de difundir a fé conforme as suas possibilidades(1), Cristo Senhor chama sempre dentre os discípulos os que Ele quer para estarem com Ele e os enviar a evangelizar os povos (2). E assim, mediante o Espírito Santo, que para utilidade comum reparte os carismas como quer (3), inspira no coração de cada um a vocação missionária e ao mesmo tempo suscita na Igreja Institutos (4), que assumem, como tarefa própria, o dever de evangelizar, que pertence a toda a Igreja.

De facto, são marcados com vocação especial aqueles que, dotados de índole natural conveniente e das qualidades e talentos requeridos, estão prontos para empreender o trabalho missionário (5), quer sejam nativos quer estrangeiros: sacerdotes, religiosos e leigos. Enviados pela legítima autoridade, partem, movidos pela fé e obediência, para junto dos que estão longe de Cristo, escolhidos para uma obra à qual foram destinados (6) como ministros do Evangelho, «a fim de que a oblação dos gentios seja aceite e santificada no Espírito Santo» (Rom. 15,16).

Espiritualidade missionária

24. Porém, ao chamamento de Deus, o homem deve responder de forma tal que, sem se deixar guiar pela carne e sangue(7), todo ele se entregue à obra do Evangelho. Mas esta resposta não pode ser dada senão por impulso e virtude do Espírito Santo. O enviado entra, portanto, na vida e missão d'Aquele que «a si mesmo se aniquilou tomando a forma de servo» (Fil. 2,7). Por conseguinte, deve estar pronto a perseverar toda a vida na vocação, a renunciar a si e a todas as suas coisas, e a fazer-se tudo para todos (8).

Anunciando o Evangelho aos povos, dê a conhecer confiadamente o mistério de Cristo, do qual é legado, de maneira que ouse falar d'Ele como convém (9), não se envergonhando do escândalo da cruz. Seguindo os passos do seu mestre, manso e humilde de coração, mostre que o Seu jugo é suave e leve a Sua carga (10). Mediante uma vida verdadeiramente evangélica (11), com muita paciência, longanimidade, suavidade, caridade sincera (12), dê testemunho do seu Senhor até à efusão do sangue, se for necessário. Alcançará de Deus virtude e força para descobrir a abundância de gozo que se encerra na grande prova da tribulação e da pobreza absoluta (13).

Persuada-se que a obediência é a virtude peculiar do ministro de Cristo que, pela Sua obediência, redimiu o género humano.

Os pregadores do Evangelho, para não negligenciar a graça que em si têm, renovem continuamente o seu espírito (14). Por sua vez, os Ordinários e os Superiores reunam os missionários em tempos determinados, a fim d.e mais se robustecerem na esperança da vocação e se renovarem no ministério apostólico, fundando até, para isso, casas apropriadas.

Formação espiritual e moral

25. Para tão sublime empresa, há-de o futuro missionário preparar-se com esmerada formação espiritual e moral (15). Deve, com efeito, ser capaz de tomar iniciativas, constante para levar a cabo as obras, perseverante nas dificuldades, suportando com paciência e fortaleza a solidão, a fadiga, o trabalho infrutuoso. Com espírito aberto e coração dilatado, irá ao encontro dos homens; abraçará de boa vontade os trabalhos que lhe confiarem; adaptar-se-á também generosamente aos diversos costumes e variadas condições dos povos; com ânimo concorde e mútua caridade colaborará com seus irmãos e com todos quantos se consagram à mesma empresa, de maneira que, juntamente com os fiéis, imitando a comunidade apostólica, tenham um só coração e uma só alma (16).

Estas disposições de espírito sejam diligentemente exercitadas, cuidadosamente cultivadas, elevadas e alimentadas com a vida espiritual, já desde o tempo da formação. Cheio de fé viva e esperança indefectível, o missionário seja homem de oração; arda no espírito de fortaleza, de caridade e de temperança (17); aprenda a bastar-se com o que tem (18); pelo espírito de sacrifício, leve em si o estado de morte de Jesus, a fim de que a vida de Jesus opere naqueles aos quais é enviado (19); com verdadeiro zelo gaste tudo e desgaste-se a si mesmo pelo bem das almas (20), de tal forma que «mediante o exercício diário do seu ministério, cresça no amor de Deus e do próximo» (21). Desta sorte, obedecendo com Cristo à vontade do Pai, continuará a Sua missão sob a autoridade hierárquica da Igreja, e cooperará no mistério da salvação.

Formação doutrinal e apostólica

26. Os que forem enviados aos diversos povos, como bons ministros de Cristo, devem ser alimentados «com a palavra da fé e da boa doutrina» (1 Tim. 4,6), a qual haurirão primeiramente na Sagrada Escritura, perscrutando o mistério de Cristo, de quem serão arautos e testemunhas.

E assim, todos os missionários — sacerdotes, irmãos, irmãs, leigos — sejam preparados e formados, cada qual segundo a sua condição, de maneira a estarem à altura das exigências do trabalho futuro (22). Já desde o começo, de tal modo se processe a sua formação doutrinal, que abranja tanto a universalidade da Igreja como a diversidade das nações. E isto vale tanto de todas as disciplinas, em que se formam para o desempenho do ministério, como das disciplinas úteis para o conhecimento dos povos, das culturas, das religiões, com vistas não só ao passado mas também ao tempo presente. Aquele, pois, que é destinado a outra nação, tenha em grande apreço o seu património, língua e costumes. Ao futuro missionário importa sumamente que se aplique aos estudos missiológicos, isto é, a conhecer a doutrina e as normas da Igreja em matéria de actividade missionária, a informar-se sobre os caminhos percorridos pelos arautos do Evangelho, ao longo dos séculos, como também sobre a condição presente das missões e sobre os métodos considerados hoje mais eficazes (23).

Embora toda a formação deva estar imbuída de solicitude pastoral, ministre-se-lhes, contudo, peculiar e bem orientada formação apostólica, quer teórica quer prática (24).

Forme-se o maior número possível de irmãos e de irmãs em catequética, para darem maior colaboração no apostolado.

Mesmo aqueles que se dedicam só por algum tempo à acção missionária, devem adquirir a formação adequada à sua condição.

Estas diversas espécies de preparação, porém, devem ser completadas nas próprias terras de missão, de modo que os missionários adquiram mais profundo conhecimento da história, das estruturas sociais e dos costumes dos povos, e se inteirem da ordem moral e dos preceitos religiosos, bem como do verdadeiro pensamento que esses povos, conforme suas tradições sagradas, possuem acerca de Deus, do mundo e do homem (25). Quanto às línguas, aprendam-nas de modo a usá-las com facilidade e elegância, e terem, assim, mais fácil acesso à inteligência e ao coração dos homens (26). Finalmente, sejam devidamente iniciados nas necessidades pastorais características da terra.

Haja também pessoal preparado de modo mais profundo em Institutos missiológicos ou noutras Faculdades ou Universidades, que possa desempenhar cargos de maior responsabilidade (27), e, com a sua ciência, auxiliar os outros missionários no exercício da obra evangelizadora, que, na hora actual, apresenta tantas dificuldades e oportunidades. Além disso, é muito para desejar que as Conferências episcopais regionais tenham à sua disposição um bom número destes peritos e que, nas necessidades do próprio cargo, façam proveitoso uso do seu saber e experiência. Nem falte igualmente quem saiba usar com perícia os instrumentos técnicos e de comunicação social, cuja importância todos reconheçam devidamente.

Institutos missionários

27. Tudo isto, embora absolutamente necessário a cada um dos enviados ao campo do apostolado, na realidade, dificilmente pode ser conseguido pelos indivíduos isolados. Visto que a mesma obra missionária, como prova a experiência, não pode ser realizada pelos indivíduos isolados, a vocação comum reuniu-os em Institutos, nos quais, pelo esforço comum, se formassem convenientemente e executassem essa tarefa em nome da Igreja e segundo a vontade da autoridade hierárquica. Os Institutos, desde há muitos séculos que têm suportado o peso do dia e do calor, consagrando-se inteiramente ou em parte à empresa apostólica. Muitas vezes a Santa Sé confiou à sua evangelização vastos territórios, nos quais reuniram para Deus um novo povo, uma igreja local à volta dos seus próprios pastores. A essas igrejas, fundadas à custa do seu suor e até do seu sangue, prestarão serviço com zelo e experiência em fraterna cooperação, já na cura das almas, já em cargos especiais em função do bem comum.

Algumas vezes, tomarão a seu cargo em toda uma região certos trabalhos mais urgentes, como por exemplo, a missionação de grupos ou de povos que, devido a especiais razões, ainda não receberam a boa nova do Evangelho, ou a ela resistiram até ao presente (28).

Se for preciso, dediquem-se a formar e ajudar com a sua experiência aqueles que se consagram por um tempo determinado à acção missionária.

Por todos estes motivos, e porque há ainda numerosas gentes para conduzir a Cristo, os Institutos continuam a ser da máxima necessidade.

CAPÍTULO V

A ORGANIZAÇÃO DA ACTIVIDADE MISSIONÁRIA

Introdução: sua necessidade

28. Os fiéis, em virtude de possuirem dons diferentes (1), devem colaborar no Evangelho, cada um segundo as suas possibilidades, aptidões, carismas e ministérios (2); é ainda necessário que todos, os que semeiam e os que segam (3), sejam um só (4), a fim de que, «conspirando livre e ordenadamente para o mesmo fim» (5), empreguem unânimemente as suas forças na edificação da Igreja.

Por isso, os trabalhos dos arautos do Evangelho e os auxílios dos restantes fiéis devem ser orientados e unidos de modo a que tudo se faça com ordem (1 Cor. 14,40) em todas as actividades e esferas da cooperação missionária.

Organização geral

29. O cuidado de anunciar o Evangelho em todas as partes da terra pertence, antes de mais, ao corpo episcopal (6); por isso, o Sínodo episcopal ou «Conselho permanente de Bispos para toda a Igreja» (7), entre os assuntos de importância geral (8), deve atender de modo especial à actividade missionária, que é a principal e a mais sagrada da Igreja (9).

Para todas as missões e para toda a actividade missionária, haja um só dicastério competente, a saber, a Congregação de «Propaganda Fide», que orientará e coordenará, em todo o mundo, tanto a actividade como a cooperação missionária, ressalvando-se, contudo, o direito das Igrejas orientais 1°.

Embora o Espírito Santo suscite, de muitos modos, na Igreja de Deus, o espírito missionário, e não poucas vezes se anteceda à acção dos que governam a vida da Igreja, este dicastério, contudo, deve promover, da sua parte, a vocação e a espiritualidade missionária, o zelo e a oração pelas missões, e uma exacta e adequada informação sobre elas. Suscite e distribua os missionários, segundo as necessidades mais urgentes das regiões. Organize um plano de acção; dele promanem as normas directivas, os princípios para a evangelização, e dele procedam os impulsos. Incite e coordene a recolha eficaz de subsídios, que devem distribuir-se segundo a medida da necessidade ou da utilidade, da extensão do território, do número de fiéis e infiéis, das obras e das instituições, dos auxiliares e dos missionários

Em união com o «Secretariado para a união dos cristãos», procure os meios de realizar e ordenar a colaboração fraterna e a convivência com as iniciativas missionárias doutras comunidades cristãs, a fim de se evitar, quanto possível, o escândalo da divisão.

Por isso, importa que este dicastério seja tanto instrumento de administração como órgão de direcção dinâmica, empregando os métodos científicos e os instrumentos adaptados às condições actuais, e tendo em conta a actual investigação da teologia, metodologia e pastoral missionária.

Na direcção deste dicastério, tenham parte muito activa, com voto deliberativo, representantes escolhidos de todos aqueles que trabalham na obra missionária: os Bispos de todo o mundo, depois de ouvidas as Conferências episcopais, e os Superiores dos Institutos e das Obras pontifícias, segundo as normas e proporções que o Romano Pontífice estabelecer. Todos estes, que hão-de ser convocados em datas fixas, exerçam, sob a autoridade do Sumo Pontífice, a suprema orientação de toda a obra missionária.

Esteja à disposição deste dicastério um grupo permanente de consultores peritos, de reconhecida ciência e experiência, aos quais pertence, entre outras coisas, reunir uma informação oportuna sobre as condições locais das várias regiões, a mentalidade dos diferentes grupos humanos, os métodos de evangelização a empregar, e propor conclusões cientificamente fundadas para a cooperação missionária.

Estejam convenientemente representados os Institutos de religiosas, as obras regionais a favor das missões, e as organizações de leigos, sobretudo as internacionais.

Organização local das missões

30. Para que, no exercício da obra missionária, se atinjam os fins e os resultados, devem todos os operários missionários ter um «só coração e uma só alma» (Act. 4,32).

Pertence ao Bispo, como regra e centro de unidade no apostolado diocesano, promover, dirigir e coordenar a actividade missionária, mas de tal modo que se conserve e fomente a iniciativa espontânea dos que participam na obra. Todos os missionários, mesmo os religiosos isentos, estão sob a sua jurisdição nos vários trabalhos que dizem respeito ao exercício do apostolado (11). Para melhor coordenação, constitua o Bispo, na medida do possível, um Conselho pastoral, em que participem, por meio de delegados escolhidos, os clérigos, os religiosos e os leigos. Procure ainda que a acção apostólica não se limite aos convertidos, mas que os operários e os subsídios se destinem equitativamente à evangelização dos não-cristãos.

Organização regional

31. As Conferências episcopais resolvam, de comum acordo, as questões mais graves e os problemas mais urgentes, sem menosprezarem, contudo, as diferenças locais (12). Para não dissipar o número já insuficiente de pessoas e de subsídios e não multpilicar sem necessidade as iniciativas, recomenda-se a fundação de obras comuns que sirvam o bem de todos; por exemplo, seminários, escolas superiores e técnicas, centros de pastoral, catequética, liturgia e dos meios de comunicação social.

Organize-se igualmente uma oportuna cooperação entre as diversas Conferências episcopais.

Actividade dos Institutos missionários

32. E ainda da máxima importância coordenar as actividades exercidas pelos Institutos ou Associações eclesiásticas. Todos eles, seja qual for o seu género, devem secundar o Ordinário do lugar, em tudo o que se relaciona com a actividade missionária. Por isso, aproveitará muito realizar acordos particulares, em que se regulem as relações entre o Ordinário do lugar e o Superior do Instituto.

Quando a um Instituto for confiado um território, o Superior eclesiástico e o Instituto tenham muito a peito orientar tudo para que a nova comunidade cristã se transforme em igreja local, a qual, no momento oportuno, será governada por pastor próprio, com o seu clero.

Ao acabar o encargo do território, surge uma nova condição. Então, as Conferências episcopais e os Institutos, de comum acordo, estabeleçam as normas que hão-de reger as relações entre os Ordinários de lugar e os Institutos (13). Contudo, pertence à Santa Sé estabelecer os princípios gerais, pelos quais se organizarão os acordos regionais ou até particulares.

Os Institutos devem estar prontos a continuar a obra começada, colaborando no ministério ordinário da cura de almas: mas, com o aumento do clero local, deve providenciar-se a que os Institutos, na medida em que for conforme à sua finalidade, se mantenham fiéis à própria diocese, encarregando-se generosamente de obras especiais ou de alguma região.

Coordenação dos Institutos missionários

33. Os diversos Institutos que se dedicam à actividade missionária no mesmo território procurem os processos e os modos de coordenar as suas obras. Serão, portanto, de grande utilidade, as Conferências de religiosos e as Uniões de religiosas, em que participem todos os Institutos da mesma nação ou região. Vejam Conferências o que podem fazer com o esforço comum e mantenham estreitas relações com as Conferências episcopais.

Tudo isto, por igual motivo, convém estendê-lo à colaboração dos Institutos missionários na sua pátria de origem, de modo que mais facilmente e com menos despesas se possam resolver os assuntos e empreendimentos comuns, como, por exemplo, a formação doutrinal dos futuros missionários, os cursos para missionários, as relações para com as autoridades civis ou organismos nacionais e internacionais.

Coordenação dos Institutos científicos

34. Como o recto e ordenado exercício da actividade missionária exige que os operários evangélicos se preparem cientificamente para a sua função, sobretudo para o diálogo com as religiões e culturas não-cristãs, e que sejam ajudados eficazmente na execução, é de desejar que colaborem entre si fraterna e generosamente a favor das missões todos os Institutos científicos que estudam missiologia e outras disciplinas ou artes úteis às missões, como a etnologia e a linguística, a história e a ciência das religiões, a sociologia, a pastoral e outras coisas semelhantes.

CAPÍTULO VI

A COOPERAÇÃO

Introdução. Consciência da responsabilidade

35. Dado que a Igreja é toda ela missionária, e a obra da evangelização é um dever fundamental do Povo de Deus, o sagrado Concílio exorta todos a uma profunda renovação interior, para que tomem viva consciência das próprias responsabilidades na difusão do Evangelho e assumam a parte que lhes compete na obra missionária junto dos gentios.

Dever missionário de todo o povo de Deus

36. Como membros de Cristo vivo e a Ele incorporados e configurados não só pelo Baptismo mas também pela Confirmação e pela Eucaristia, todos os fiéis estão obrigados, por dever, a colaborar no crescimento e na expansão do Seu corpo para o levar a atingir, quanto antes, a sua plenitude(1).

Por isso, todos os filhos da Igreja tenham consciência viva das suas responsabilidades para com o mundo, fomentem em si um espírito verdadeiramente católico, e ponham as suas forças ao serviço da obra da evangelização. Saibam todos, porém, que o primeiro e mais irrecusável contributo para a difusão da fé, é viver profundamente a vida cristã. Pois o seu fervor no serviço de Deus e a sua caridade para com os outros é que hão-de trazer a toda a Igreja o sopro de espírito novo que a fará aparecer como um sinal levantado entre as nações (2), como «luz do mundo» (Mt. 5,14) e «sal da terra» (Mt. 5,13). Este testemunho de vida produzirá mais facilmente o seu efeito, se for dado conjuntamente com as outras comunidades cristãs, segundo as normas do decreto sobre o ecumenismo (3).

Deste espírito renovado brotará espontâneamente a oferta de orações e de obras de penitência a Deus, para que fecunde com a sua graça a acção dos missionários; dele nascerão vocações missionárias e sairão os recursos de que as missões necessitam.

Porém, para que todos e cada um dos fiéis conheçam plenamente o estado actual da Igreja no mundo e oiçam a voz das multidões que clamam: «Vem em nosso auxílio» (4) facilitem-se, até pelos meios modernos de comunicação social, notícias missionárias tais que os façam sensíveis à actividade missionária e lhes abram o coração a tão profundas e imensas necessidades dos homens par lhes poderem valer.

É também necessária uma coordenação das notícias e a cooperação com os organismos nacionais e internacionais.

Dever missionário das comunidades cristãs

37. Como o Povo de Deus vive em comunidades, sobretudo diocesanas e paroquiais, e é nelas que, de certo modo, se torna visível, pertence a estas dar também testemunho de Cristo perante as nações.

A graça da renovação não pode crescer nas comunidades, a não ser que cada uma dilate o campo da sua caridade até aos confins da terra e tenha igual solicitude pelos que são de longe como pelos que são seus próprios membros.

Assim, toda a comunidade reza, coopera e exerce actividade entre os gentios, por meio dos seus filhos a quem Deus escolheu para este importantíssimo encargo.

É muito útil que, contanto que não crie desinteresse pela obra missionária universal, manter relações com os missionários oriundos da própria comunidade ou com determinada paróquia ou diocese das missões, para tornar visível a comunhão entre as comunidades e contribuir para mútua edificação.

Dever missionário dos Bispos

38. Todos os Bispos, como membros do corpo episcopal, sucessor do Colégio apostólico, são consagrados não só em benefício duma diocese mas para salvação de todo o mundo. O mandato de Cristo de pregar o Evangelho a toda a criatura (5) afecta-os, primária e imediatamente a eles, com Pedro e sob Pedro. Daí nascem aquela comunhão e cooperação das igrejas, hoje tão necessárias para levar a cabo a obra da evangelização. Em virtude desta comunhão, cada uma das igrejas leva em si a solicitude por todas as outras, manifestam umas às outras as próprias necessidades, comunicam entre si as suas coisas, pois a dilatação do corpo de Cristo é dever de todo o Colégio episcopal (6).

Na sua diocese, o Bispo, que forma uma só coisa com ela, ao suscitar, promover e dirigir a obra missionária, torna presentes e como que palpáveis o espírito e o ardor missionário do Povo de Deus, de maneira que toda a diocese se torna missionária. É da responsabilidade do Bispo suscitar no seu povo e sobretudo entre os doentes e os oprimidos, almas que ofereçam a Deus, de todo o coração, orações e penitências pela evangelização do mundo; favorecer de bom grado as vocações de jovens e até de clérigos para os Institutos missionários, aceitando reconhecido que Deus escolha alguns para a actividade missionária da Igreja; exortar e ajudar as Congregações diocesanas para que assumam a sua parte nas missões; promover junto dos seus fiéis as obras dos Institutos missionários, mas sobretudo as Obras missionárias pontifícias. Com todo o direito se deve dar o primeiro lugar a estas Obras, uma vez que são meios quer para dar aos católicos um sentido verdadeiramente universal e missionário logo desde a infância, quer para promover colectas eficazes de subsídios para bem de todas as missões segundo as necessidades de cada uma (7).

Como cresce de dia para dia a necessidade de operários na vinha do Senhor e os sacerdotes diocesanos desejam, eles também, ter parte cada vez maior na evangelização do mundo, o sagrado Concílio deseja que os Bispos, ponderando a gravíssima penúria de sacerdotes que impede a evangelização de muitas regiões, enviem, depois da devida preparação, alguns dos seus melhores sacerdotes que se ofereçam para as missões, para as dioceses mais carecidas de clero, com o fim de exercerem aí o ministério missionário em espírito de serviço, pelo menos durante um tempo determinado (8).

Mas, para que a actividade missionária dos Bispos a bem de toda a Igreja se possa exercer mais eficazmente, convém que as Conferências episcopais tomem a direcção de todos os assuntos que dizem respeito a uma ordenada cooperação da própria região.

Nas suas Conferências tratem os Bispos dos sacerdotes do clero diocesano que devem dedicar à evangelização dos gentios; da contribuição fixa que cada diocese, em proporção com os seus recursos, deve oferecer todos os anos para a obra das missões (9); da direcção e organização das formas e dos meios de ajudar directamente as missões; do auxílio e, se for preciso, até da fundação de Institutos missionários e seminários do clero diocesano para as missões; do estreitamento dos laços entre estes Institutos e as dioceses.

Às Conferências episcopais pertence também fundar e promover instituições que fraternalmente recebam e ajudem, com o devido interesse pastoral, os que, por razões de estudo ou de trabalho, emigram das terras de missão. Por eles, com efeito, povos longínquos tornam-se em certo modo vizinhos, e às comunidades cristãs mais antigas oferece-se uma óptima ocasião de dialogar com nações que ainda não ouviram pregar o Evangelho e de lhes mostrar no próprio exercício do amor e da ajuda, o genuíno rosto de Cristo (10).

Dever missionário dos sacerdotes

39. Os sacerdotes representam a pessoa de Cristo e são cooperadores da ordem episcopal, na tríplice função sagrada, que por sua natureza tem relação com a missão da Igreja (11). Entendam, pois, muito bem que a sua vida foi consagrada também ao serviço das missões. Uma vez que pelo seu mesmo ministério — que consiste principalmente na Eucaristia, que aperfeiçoa a Igreja —  estão em comunhão com Cristo cabeça e trazem os outros a essa comunhão, não podem deixar de sentir quanto falta ainda para o pleno crescimento do corpo e quanto há que fazer, portanto, para que vá crescendo cada vez mais. Organizarão, pois, de tal maneira o trabalho pastoral que contribua para a dilatação do Evangelho entre os não-cristãos.

Os sacerdotes, no trabalho pastoral, farão por excitar e alimentar entre os fiéis o zelo pela evangelização do mundo, instruindo-os com a catequese e a pregação sobre o dever que a Igreja tem de anunciar Cristo aos gentios; persuadindo as famílias cristãs da necessidade e da honra de cultivar as vocações missionárias entre os próprios filhos e filhas; fomentando o fervor missionário entre os jovens das escolas e associações católicas, de maneira a sairem dentre eles futuros arautos do Evangelho. Ensinem os fiéis a orar pelas missões e não tenham vergonha de lhes pedir esmolas, feitos como que mendigos por Cristo e pela salvação das almas (12).

Os professores dos Seminários e Universidades elucidarão os alunos sobre a verdadeira situação do mundo e da Igreja, para que abram os olhos à necessidade duma evangelização mais intensa dos não-cristãos e o seu zelo se acenda. E ao ensinar as questões dogmáticas, bíblicas, morais e históricas, chamem a atenção para os aspectos missionários nelas contidos, para desse modo se ir formando a consciência missionária dos futuros sacerdotes.

Dever missionário dos Institutos

40. Os Institutos religiosos de vida contemplativa e activa tiveram até agora e continuam a ter a maior parte na evangelização do mundo. O sagrado Concílio reconhece gostosamente os seus méritos e dá graças a Deus por tantos esforços prestados à causa da glória de Deus e do serviço das almas e exorta-os a prosseguir incansàvelmente na obra começada, sabendo, como sabem, que a virtude da caridade, que por vocação têm de cultivar com mais perfeição, impele e obriga a um espírito e a um trabalho verdadeiramente católicos (13).

Os Institutos de vida contemplativa, pelas suas orações, penitências e tribulações, têm uma importância máxima na conversão das almas, visto que é Deus quem pelas nossas orações envia operários para a Sua messe (14), abre as almas dos não-cristãos para ouvir o Evangelho (15), e fecunda nos seus corações a palavra da salvação (16). Pede-se até a esses Institutos que fundem casas nas terras de missão como já bastantes fizeram, para que, levando aí uma vida acomodada às genuínas tradições religiosas dos povos, dêem entre os não-cristãos um testemunho brilhante tanto da majestade e da caridade de Deus como da sua união em Cristo.

Por seu lado, os Institutos de vida activa, quer tenham um fim estritamente missionário quer não, examinem sinceramente diante de Deus se podem alargar mais a sua actividade em ordem à expansão do reino de Deus entre os gentios; se podem deixar a outros, certos ministérios, para dedicar às missões as suas forças; se podem começar a ter actividades nas missões, adaptando, se for preciso, as suas Constituições, embora segundo a mente do fundador; se os seus membros participam quanto podem na actividade missionária; se o seu modo de viver é um testemunho do Evangelho adaptado à índole e às condições do povo.

Uma vez que, sob a inspiração do Espírito Santo, crescem de dia para dia na Igreja os Institutos seculares, a sua ajuda, sob a autoridade do Bispo, pode ser a muitos títulos proveitosa para as missões, como sinal duma entrega plena à evangelização do mundo.

Dever missionário dos leigos

 41. Os leigos colaboram na obra de evangelização da Igreja e participam da sua missão salvífica (17), ao mesmo tempo como testemunhas e como instrumentos vivos sobretudo se, depois de chamados por Deus, são incorporados pelos Bispos nesta empresa.

Nas terras já cristãs, os leigos concorrem para a obra de evangelização, fomentando em si e nos outros o conhecimento e o amor pelas missões, suscitando vocações na própria família, nas associações católicas e nas escolas, oferecendo auxílios de toda a espécie para que o dom da fé, que eles receberam de graça, possa ser também oferecido a outros.

Nas terras de missão, os leigos, quer estrangeiros quer nativos, exerçam o ensino nas escolas, administrem as coisas temporais, colaborem na actividade paroquial e diocesana, iniciem e promovam as várias formas de apostolado dos leigos, para que os fiéis das igrejas jovens possam assumir quanto antes a sua parte na vida da Igreja (18).

Finalmente, prestem os leigos, de bom grado, colaboração económico-social aos povos em vias de desenvolvimento; essa colaboração será tanto mais de louvar, quanto mais se relaciona com a criação daquelas instituições que atingem as estruturas fundamentais da vida social ou se ordenam à formação daqueles que têm responsabilidade de governo.

São dignos de particular louvor aqueles leigos que nas Universidades ou em Institutos científicos promovem, com as suas investigações históricas ou científico-religiosas, o conhecimento dos povos e das religiões, ajudando assim os pregadores do Evangelho e preparando o diálogo com os não-cristãos.

Colaborem fraternalmente com os outros cristãos, com os não-cristãos, sobretudo com os membros das organizações internacionais, tendo sempre diante dos olhos e preocupação de que «a edificação da cidade terrena se alicerce no Senhor e para Ele se oriente»(19).

Para desempenhar todas estas funções, precisam os leigos da necessária preparação técnica e espiritual, que se deve dar em Institutos a isso destinados, para que a sua vida seja entre os não-cristãos um testemunho de Cristo, segundo a palavra do Apóstolo: «Não deis ocasião de escândalo nem a judeus nem a gentios nem à Igreja de Deus, como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando a minha própria utilidade, mas a dos outros, a fim de que sejam salvos» (1Cor. 10, 32-33).

CONCLUSÃO

42. Os Padres do Concílio, em união com o Romano Pontífice, sentindo vivamente a obrigação de difundir por toda a parte o reino de. Deus, saudam muito afectuosamente todos os pregadores do Evangelho, sobretudo aqueles que sofrem perseguição pelo nome de Cristo, e associam-se aos seus sofrimentos (20).

Também eles se sentem inflamados do mesmo amor em que Cristo ardia pelos homens. Mas, conscientes de que Deus é quem faz com que o seu reino venha ao mundo, unem as suas preces às de todos os cristãos para que, por intercessão da Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos, as nações sejam quanto antes conduzidas ao conhecimento da verdade (21) e a glória de Deus, que resplandece no rosto de Jesus Cristo, comece a brilhar para todos pelo Espírito Santo (22).

 

Roma, 7 de Dezembro de 1965

PAPA PAULO VI

 


Notas

Proémio e Capítulo I

1. Const. dogm. de Ecclesia, Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965), p. 53.

2. Cfr. Mc. 16,15.

3. S. Agostinho, Enarr. in Ps. 44, 23: PL 36, 508; CChr. 38, 150.

4. Cfr. Mt. 5, 13-14.

5. Cfr. Eccli. 36,19.

6. Cfr. Conc. Vatic. II Const. dogm. De Ecclesia, Lumen Gentium, n. 2: AAS 57 (1965), p. 5-6.

7. Cfr. Jo. 11,52.

8. Cfr. S. Ireneu, Adv. Haer. III, 18, 10 «O Verbo que existe junto de Deus, por quem foram feitas todas as coisas, e que sempre estava presente ao género humano...»: PG 7, 932; id. IV, 6, 7: «Com efeito, o Filho, presente desde a primeira hora à sua obra, a todos vai revelando o Pai, a quantos, quando e do modo que o Pai quer» (ibid. 990); cfr. IV, 20, 6 e 7 (ib. 1037); Demonstratio n, 34: Patr. Or., XII, 773; Sources Chrét., 62, Paris 1958, p. 87; S. Clemente de Alexandria, Protrept. 112 1: GCS Clemens I, 79; Strom. VI, 6, 44, 1: GCS Clemens II, 453; 13, 106, 3 e 4 (ibid. 485). Para a mesma doutrina, cfr. Pio XII: Radiomensagem, 31 dez. ]952; Cone. Vat. II Const. dogm. De Ecclesia Lumen Gentium, n.° 16: AAS 57 (1965), p. 20.

9. Cfr. Col. 1,13; Act. 10,38.

10. Cfr. 2 Cor. 5,19.

11. Cfr. Hebr. 1,2; Jo. 1, 3 e 10; 1 Cor. 8,6; Col. 1,16.

12. Cfr. Ef. 1,10.

13. Cfr. 2 Cor. 8,9.

14. Cfr. Mc. 10,45.

15. Cfr. S. Atanásio, Ep. ad Epictetum 7: PG 26, 1060; S. Cirilo de Jerusalém, Catech. 4, 9: PG 33, 465; Mário Victorino, Adv. Arium, 3, 3: PL, 8, 1101; S. Basílio, Epist. 261, 2: PG 32, 969; S. Gregório Nazianzeno, Epist. 101: PG 37, 181; S. Gregório Nisseno, Antirrheticus; Adv. Apollin. 17: PG 45, 1156; S. Ambrósio, Epist. 48, 5: PL, 16, 1153; S. Agostinho, In Joahn. Ev. tratado XXIII, 6: PL 35, 1585; CChr 36, 236; além disso, mostra deste modo como não foi o Espírito Santo que nos redimiu, visto que não incarnou: De Agone Christ. 22, 24: PL 40, 302; S. Cirilo de Alexandria, Adv. Nestor, 1, 1: PG 76, 20; S. Fulgéncio, Epist. 17, 3, 5: PL 65, 454; Ad Trasimundum III, 21: PL 65, 284: da tristeza e do temor.

16. Cfr. Heb. 4,15; 9,28.

17. Cfr. Act. 1,8.

18. Cfr. Lc. 24,47.

19. Foi o Espírito que falou pelos Profetas; Symbol. Constantinopol. Denz.-Schoenmetzer, 150; S. Leão Magno, Sermo 76: PL 54, 405-406: «Quando o Espírito Santo encheu os discípulos do Senhor no dia de Pentecostes, não foi então o começo da sua missão, mas um acréscimo de largueza: porque já os patriarcas, os profetas, os sacerdotes, e todos os santos que houve antigamente, foram robustecidos pela santificação do mesmo Espírito,... embora não fosse a mesma a medida dos dons». Também Sermo 77, 1: PL 54, 412; Leão XIII, Encícl. Divinum illud: ASS (1897), 650-651. Também S. João Crisóstomo, ainda que insista na novidade da missão do Espírito Santo no dia de Pentecostes: In Eph. c. 4, Hom. 10, 1: PG 62, 75.

20.  Cfr. Jo. 14,16.

21. De Babel e do Pentecostes falam muitas vezes os Santos Padres: Origenes, In Genesim, c. 1: PG 12, 112; S. Gregório Nazianzeno, Oratio 41, 16: PG 36, 449; S. João Crisóstomo, Hom. 2 in Pentec., 2: PG 50, 467; In Act. Apost.: PG 60, 44; S. Agostinho, En. in Ps. 54, 11: PL 36, 636; CChr. 39, 664 s.; Sermo 271: PL 38, 1245; S. Cirilo de Alexandria, Glaphyra in Genesim II: PG 69, 79; S. Gregório Magno, Hom. in Evang., Lib. II, Hom. 30, 4: PL 76, 1222; S. Beda, in Hexaem., Lib. III: PL 91, 125. Veja-se também a imagem que existe no átrio da Basilica de S. Marcos de Veneza. A Igreja fala todas as línguas, e assim a todos acolhe na catolicidade da fé: S. Agostinho, Sermones 266, 267, 268, 269: PL 38, 1225-1237; Sermo 175, 3: PG 38, 946; S. João Crisóstomo, In Epist. I ad Cor., Homil. 35: PG 61, 296; S. Cirilo de Alexandria, Fragm. in Act.: PG 74, 758; S. Fulgêncio, Sermo 8, 2-3: PL 65, 743-744. Acerca do Pentecostes como consagração dos Apóstolos para a missão, cfr. J. A. Cramer, Catena in Acta SS. Apostolorum, Oxford, 1838, pg. 24 s.

22. Cfr. Lc. 3,22; 4,1; Act. 10,38.

23. Cfr. Jo. 14-17; Paulo VI, Alocução proferida no Concílio no dia 14 de Setembro de 1964: AAS 56 (1964), p. 807.

24. Cfr. Const. dogm. De Ecclesia, Lumen Gentium, 4: AAS 57.

25. S. Agostinho, Sermo 267, 4: PL 38, 1231: a0 Espírito Santo faz em toda a Igreja o que a alma em todos os membros dum mesmo corpo». Cfr. Const. dogm. De Ecclesia Lumen Gentium, 7 (com a nota 8): AAS 57 (1965), p. 11.

26. Cfr. Act. 10, 44-47; 11,15; 15,8

27. Cfr. Act. 4,8; 5,32; 8,26. 39; 9,31; 10; 11, 24. 28; 13, 2. 4. 9; 16, 6-7; 20, 22-23; 21, 11, etc.

28. Cfr. também Mt. 10, 1-42.

29. Cfr. Mt. 28,18.

30. Cfr. Act. 1, 4-8.

31. Cfr. Jo. 20,21.

32. Cfr. Col. 1,24.

33. Tertuliano, Apologeticum, 50, 13: PL 1,534; CChr. I, 171.

34. Já S. Tomás de Aquino fala da função apostólica de implantar a Igreja: efr. Sent. Lib. I, dist. 16, q. 1, a. 2 ad 2 e ad 4; a. 3 sol.; Summa Theol. I, q. 43, a. 7 ad 6; I-II, q. 106, a. 4 ad 4. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), 445 e 453; Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), 74; Pio XII, 30 abr. 1939 aos Directores das 00. MM. PP.: AAS 36 ID. 24 jun. 1944 aos Directores das OO. MM. PP.: AAS 36 (1944), 210; de novo em AAS 42 1950, 727, e 43 (1951), 508; ID. 29 jun. 1948 ao clero indígena: AAS (1944), 210; 374; ID. Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), 507; ID. Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 236; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51, (1959), 835; Paulo VI, Hom. 18 out. 1964: AAS 55 (1964), 911. Tanto os Sumos Pontífices como os Santos Padres e os Escolásticos falam muitas vezes da dilatação da Igreja: S. Tomás de Aquino, Comm. in Math. 16,28; Leão XIII, Encicl. Sancta Dei Civitas, 3 dez. 1880: ASS 55 (1880), 241 Bento XV, Encícl. Maximum Illud, 30 nov. 1919 AAS 11 (1919), 442; Pio XI, Encicl. Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), 65.

35. Nesta noção de actividade missionária, como se vê, incluem-se também, quanto à substância, aquelas regiões da América Latina, nas quais nem Hierarquia própria, nem maturidade da vida cristã, nem uma pregação suficiente do Evangelho se dão ainda. Se, porém, estes territórios são de jacto tidos pela S. Sé como missionários, isso não depende do Concilio. É por isso que, a propósito da conexão entre a noção de actividade missionária e certos territórios, se diz muito intencionalmente que esta actividade se exerce «geralmente» (plerumque) em certos territórios como tais reconhecidos pela S. Sé.

36. Conc. Vat. II, Decr. De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 1: AAS 57 (1965), p. 90.

37. Cfr. Mc. 16,16; Jo. 3,5.

38. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia Lumen Gentium, n.° 14: AAS 57 (1965), p. 18.

39. Cfr. Hebr. 11,6.

40. Cfr. 1 Cor. 9,16.

41. Cfr. Ef. 4, 11-16.

42. Cfr. Jo. 7,18; 8, 30 e 44; 8,50; 17,1.

43. Acerca desta ideia sintética, ver a doutrina de S. Ireneu sobre a Recapitulação. Cfr. também Hipólito, De Antichristo, 3: «Querendo a todos e desejando salvar a todos, querendo fazer a todos filhos de Deus e chamando todos os santos a formar um só homem perfeito...» PG 10, 732; GCS Hippolyt I, 2 p. 6; Benedictiones Jacob, 7: T. U., 38-1 pg. 18, linha 4 ss.; Origenes, In Joann. Tom. I, n. 16: «Então, sim, a única ocupação daqueles que chegarem até Deus será a de conhecer a Deus, presididos por aquele Verbo que está junto de Deus; para que assim todos os filhos sejam cuidadosamente formados no conhecimento do Pai, como o Filho que agora é o único que conhece o Pai»: PG, 14, 49; GCS Orig. IV, 20; S. Agostinho, De Sermone Domini in monte, I, 41: «Estimemos tudo aquilo que pode ser conduzido connosco àquele reino, onde ninguém diz: meu Pai, mas todos dizem a um só Deus: Pai nosso»: PL 34, 1250; S. Cirilo de Alexandria, in Joann. I: «Todos estamos em Cristo e nele revive a natureza comum da Humanidade. Pois, por isso mesmo, foi chamado o novo Adão... Com efeito, habitou entre nós aquele que por natureza é o Filho e Deus; por isso, no seu Espírito podemos chamar: Abba, Pai! Habita, de facto, o Verbo entre nós num templo único, que precisamente quis construir para si de algo nosso e por causa de nós, para que tendo-nos a todos em si mesmo, num só corpo, nos reconciliasse a todos com o Pai, como diz Paulo: PG 73, 161-164.

44.  Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 445: «Porque sendo a Igreja de Deus católica e não estrangeira para nenhum povo ou nação...» Cfr. João XXIII, Encícl. Mater et Magistra: «A Igreja, por direito divino, pertence a todas as nações... por isso, uma vez que inseriu a sua força, como que nas veias de algum povo, já não é nem se julga como uma instituição qualquer, imposta de fora a esse povo... E, por isso, tudo aquilo que lhes parece bom e honesto, apoiam-no e completam-no» (subentenda-se: aqueles que renasceram em Cristo); 25 maio 1961 AAS 1961, 444.

45. Cfr. Jo. 3,18.

46. Cfr. S. Ireneu, Adv. Haer. III, 15, n. 3: PG 7, 919: «Foram pregadores da verdade e apóstolos da liberdade».

47. Breviarium Romanum, Ant. O, Vésperas do dia 23 de Dez.

48.  Cfr. Mt. 24,31; Didachè, 10,5: Funk I, p. 32.

49. Cfr. Me. 13,10.

50. Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia Lumen Gentium, 17: AAS 57 (1965) p. 20-21. S. Agostinho, De Civitate Dei, 19,17: PL 41, 646; Instr. da S. Congregação «de Propaganda Fide» : Collectanea I, n, 135, p. 42.

51. Segundo Orígenes, o Evangelho deve ser pregado antes da consumação deste mundo: Hom. in Lc. XXI: GCS, Orig. IX, 136, 21 ss.; In Matth. comm. ser. 39: X, 75, 25 ss.; 76, 4 ss.; Hom. in lerem. III, 2: VII, 308, 29 ss.; S. Tomás, Summa Theol. I-II, q. 106, a. 4, ad 4.

52. Cfr. Act. 1,7.

53.  Hilário de Poitiers, In Ps. 14: PL 9, 301; Eusébio de Cesareia, In Isaiam 54, 2-3: PG 24, 462-463; Cirilo de Alexandria, In Isaiam V, cap. 54, 1-3: PG 70, 1193.

54. Cfr. Ef. 4,13.

55. Cfr. Jo. 4,23.

Capítulo II

1. Cfr. Mt. 5,16.

2. Cfr. 1 Jo. 4,11.

3. Cfr. Mt. 9,35 ss.; Act. 10,38.

4. Cfr. 2 Cor. 12,15.

5. Cfr. Mt. 20,26; 23,11; alocução de Paulo VI, no dia 21 nov. 1964, na aula conciliar: AAS 56 (1964), 1013.

7. Cfr. Col. 4,3.

8. Cfr. Mc. 16,15.

9. Cfr. Act. 4, 13. 29. 31; 9, 27-28; 13,46; 14,3; 19,8; 26,26; 28,31; 1 Tess. 2,2; 2 Cor. 3,12; 7,4; Fil. 1,20; Ef. 3,12; 6, 19-20.

10. Cfr. 1 Cor. 9,15; Rom. 10,14.

11. Cfr. 1 Tess. 1, 9-10; 1 Cor. 1, 18-21; Gál. 1,31; Act. 14, 15-17; 7, 22-31.

12. Cfr. Act. 16,14.

13. Cfr. Col. 3, 5-10; Ef. 4, 20-24.

14. Cfr. Lc. 2,34; Mt. 10, 34-39.

15. Cfr. 1 Tess. 1,6.

16. Cfr. Conc. Vat. II, Declaração De Libertate religiosa, Dignitatis humanae, 2, 4, 10; Const. past. De Ecclesia in mundo huius temporis, Gaudium et spes, n.° 21.

17 Cfr. Conc. Vat. II, Const, dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, 17: AAS 57 (1965), p. 20-21.

18. Cfr. Const. De sacra liturgia, Sacrosanctum Concilium, 64-65: AAS 56 (1964), 117.

19. Cfr. Col. 1,13. Desta libertação da escravidão do demónio e das trevas, cfr. Mt. 12,28; Jo. 8,44; 12,31 (cfr. 1 Jo. 3,8; EL 2, 1-2). Cfr. no Ritual romano, Liturgia do Baptismo.

20. Cfr. Rom. 6, 4-11; Col. 2, 12-13; 1 Ped. 3, 21-22; Mc. 16,16.

21. Cfr. 1 Tess. 3, 5-7; Act. 8, 14-17.

22. Cfr. Concilio Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 14: AAS 57 (1965), p. 19.

23. Cfr. S. Agostinho, Tract. in Joann. 11, 4: PL 35, 1476.

24. Cfr. Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n.° 9: AAS 57 (1965), p. 13.

25. Cfr. 1 Cor. 3,9

26. Cfr. Ef. 4,1.

27. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 10. 11. 34: AAS 57 (1965), p. 10-17; 39-40.

28. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De divina Revelatione, Dei Verbum, n.o 21: AAS 57 (1965), p. 24.

29. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 12. 35: AAS 57 (1965), P. 16; 40-41.

30. Cfr. Ibid., n. 23, 36: AAS 57 (1965), p. 28: 41-42.

31. Cfr. Ibid., 12, 11, 35, 41: AAS 57 (1965), p. 15-16; 40-41, 47.

32. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Ecclesiis orientalibus, Orientalium Ecclesiarum, n. 4: AAS 57 (1965), P- 77-78.

33. Carta a Diogneto, 5: PG 2, 1173; cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 38: AAS 57 (1965), p. 43.

34. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 32: AAS 57 (1965), p. 38; Cone. Vat. II, Decreto De apostolatu laicorum, Apostolicam Actuositatem, n. 5-7.

35. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 4, 8, 9.

36. Cfr. Conc. Vat. II, Const. De sacra liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 17: AAS 56 (1964), p. 105.

37. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 1.

38. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), 843-844.

39. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 4: AAS 57 (1965), p. 94-96.

40. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), 842.

41. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 29: AAS 57 (1965), p. 36.

42. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 855.

43. Trata-se dos chamados « catechistes à plein temps», «full time catechists».

44. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 31, 44: AAS 57 (1965), p. 37, 50-51.

Capítulo III

1. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959) 838.

2. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De ministerio et vita sacerdotali, Presbyterorum Ordinis, n. 11; Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 2.

3. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, 25: AAS 57 (1965), p. 29.

4. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De ministerio et vita praesbyterorum, Presbyterorum Ordinis, 10, onde, para tornar mais fáceis as obras Pastorais a favor dos diversos agrupamentos sociais, se prevê a constituição de Prelaturas pessoais, na medida em que o ordenado exercício do apostolado o exigir.

5. Cfr. 1 Cor. 15,23.

6. Cfr. 1 Cor. 15,28.

7. Cfr. Ef. 4,24.

8. Cfr. Salmo 2,8.

9. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 13: AAS 57 (1965), p. 17-18.

10. Cfr. Aloc. de Paulo VI na canon. dos Mártires de Uganda, 18 out. 1964: AAS 56 (1964), p. 908.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Eeclesia, Lumen gentium, n. 13: AAS 57 (1965), p. 18.

Capítulo IV

1. Conc. Vat. 11, Const. dogm. De Ecelesia Lumen gentium, n. 17: AAS 57 (1965), p. 26.

2. Cfr. Mc. 3,13 ss.

3. Cfr. 1 Cor. 12,11.

4. Por «Institutos» entendem-se as Ordens, Congregações, Institutos e Associações que trabalham nas Missões.

5. Cfr. Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), p. 69-71; Pio XII, Saeculo exeunte, 13 jun. 1940: AAS 32 (1940) p. 256; Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 506.

6. Cfr. Act. 13,2.

7. Cfr. Gál. 1,16.

8. Cfr. 1 Cor. 9,22.

9. Cfr. Ef. 6,19 ss.; Act. 4,31.

10. Cfr. Mt. 11,29 ss.

11. Cfr. Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 449-450.

12. Cfr. 2 Cor. 6,4 ss.

13. Cfr. 2 Cor. 8,2.

14. Cfr. 1 Tim. 4,14; Ef. 4,23; 2 Cor. 4,16.

15. Cfr. Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448-449; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507. Na formação dos missionários sacerdotes deve ter-se também em conta o que se prescreve no Conc. Vat. II, Decreto De Institutione sacerdotali, Optatam totius.

16. Cfr. Act. 2,42; 4,32.

17. Cfr. 2 Tim. 1,7.

18. Cfr. Fil. 4,11.

19. Cfr. 2 Cor. 4,10 ss.

20. Cfr. 2 Cor. 12,15 ss.

21. Cfr. Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium, n. 41: AAS 57 (1965), p. 46.

22. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 440; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507.

23. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448; Decr. da S. C. P. F., 20 maio 1923: AAS 15 (1923), p. 369-370; Pio XII, Saeculo exeunte, 2 jun. 1940: AAS 32 (1940), p. 256; Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AA.S 51 (1959), p. 843-844.

24. Cfr. Conc. Vat. II, Decr, De Institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 19-21; Cfr. também Const. Apost. Sedes Sapientiae, com os Estatutos gerais, 31 maio 1956: AAS 48 (1956), p. 354-365.

25. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 523-524.

26 Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. ].951: AAS 48 (1951), p. 507.

27 Cfr. Pio XII, Fidei donum, 15 jun. 1957: AAS 49 (1957), p. 234.

28 Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De ministerio et vita presbyterorum, Presbyterorum Ordinis, n.° 10, onde se trata das dioceses, prelaturas pessoais e coisas parecidas.

Capítulo V

1. Cfr. Rom. 12,6.

2. Cfr. 1 Cor. 3,10.

3. Cfr. Jo. 4,37.

4. Cfr. 1 Cor. 3,8.

5. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 18: AAS 57 (1965), p. 22.

6. Cfr. Conc. Vat. II, ibid., n. 23: AAS 57 (1965), p. 28.

7. Motu proprio Apostolica Sollicitudo, 15 set. 1955: AAS 57 (1965), p. 776.

8. Paulo VI, Aloc. ao Concílio, 21 nov. 1964: AAS 56 (1964), p. 1011.

9. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 39-40.

10. Se algumas Missões, por razões particulares, estão sob a jurisdição de outros Dicastérios, importa que estes estejam em comunicação com a S. Congregação De Propaganda Fide, para que possa haver uma regra e norma constante e uniforme, na ordenação e direcção de todas as Missões.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus, n:° 35,4.

12. Cfr. Conc. Vat. II, ibid., n.° 36-38.

13. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, n.° 35, 5-6.

Capítulo VI

1. Cfr. Ef. 4,13.

2. Cfr. Is. 11,12.

3. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n.° 12: AAS 57 (1965), p. 99.

4. Cfr. Act. 16,9

5. Cfr. Mc. 16,15.

6. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium, n. 23-24: AAS 57 (1965), p. 27-29.

7. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 453-454; Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), p. 71-73; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 525-526; ID., Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 241.

8. Cfr. Pio XII, Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 245-246.

9. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De pastorali Episcoporum munere, Christus Dominus, n. 6.

10. Cfr. Pio XII, Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 245.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), 34.

12. Cfr. Pio XII, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 28 (1926), 72.

13. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 44: AAS 57 (1965), p. 50.

14. Cfr. Mt. 9,38.

15. Cfr. Act. 16,14.

16. Cfr. 1 Cor. 3,7.

17. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n.° 33. 35: AAS 57 (1965), p. 39. 40-41.

18. Cfr. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 510-514; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 851-,852.

19. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 46: AAS 57 (1965), p. 52.

20. Cfr. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 527; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 864.

21. Cfr. 1 Tim. 2,4.

22. Cfr. 2 Cor. 4,6.

Concílio de Trento (1543-1563)

XIX Concílio Ecumênico (contra os inovadores do século XVI)

 

Sessão III (4-2-1546)

O Símbolo da Fé Católica

782. Este sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral de Trento, legitimamente reunido no Espírito Santo, presidindo-o os três legados da Sé Apostólica, tendo em vista a importâncias das coisas a serem tratadas, principalmente daquelas que estão contidas nestes dois pontos: a de extirpar as heresias e a de reformar os costumes, motivo principal de estar reunido, julgou seu dever professar, com as mesmas palavras segundo as quais é lido em todas as igrejas, o Símbolo de Fé usado pela Santa Igreja Romana como princípio em que devem concordar todos os que professam a fé cristã e como fundamento firme e único contra o qual jamais prevalecerão as portas do inferno (Mt 16, 18). O qual é o seguinte: Creio em um só Deus, Pai Onipotente, Criador do céu e da terra e de todas as coisas, visíveis e invisíveis. E em um só Senhor Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos; é Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro; é gerado, não feito; consubstancial ao Pai, por quem foram feitas todas as coisas. O qual, por amor de nós homens e pela nossa salvação, desceu dos céus. E se encarnou por obra do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, e se fez homem. Foi também crucificado por nossa causa; padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos e foi sepultado. E ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. E subiu ao céus, está sentado à mão direita de Deus Pai. E pela segunda vez há de vir com majestade a julgar os vivos e os mortos. E seu reino não terá fim. E [creio] no Espírito Santo, [que também é] Senhor Vivificador, o qual procede do Pai e do Filho. O qual, com o Pai e o Filho é juntamente adorado e glorificado, e foi quem falou pelos profetas. E [creio] na Igreja, que é una, santa, católica. Confesso um só Batismo para remissão dos pecados. E aguardo a ressurreição dos mortos e a vida da eternidade. Assim seja.

 

Sessão IV (8-4-1546)

Os Livros Sagrados e as Tradições dos Apóstolos

783. O sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral de Trento, reunido legitimamente no Espírito Santo, e com a presidência dos mesmo três legados da Sé Apostólica, tendo sempre isto diante dos olhos que, rejeitados os erros, seja na Igreja conservada a pureza do Evangelho, prometido antes nas Escrituras Santas pelos profetas, o qual Nosso Senhor Jesus Cristo Filho de Deus, primeiramente com sua própria palavra o promulgou e depois, por meio de seus Apóstolos, mandou pregá-lo a toda criatura (Mt 18, 19 s; Mc 16, 15), como fonte de toda a verdade salutar e disciplina dos costumes. Vendo que esta verdade e disciplina estão contidos nos livros escritos e nas tradições orais, que – recebidas ou pelos Apóstolos dos lábios do próprio Cristo, ou dos próprios Apóstolos sob a inspiração do Espírito Santo – chegaram até nós como que entregues de mão em mão, fiéis aos exemplos dos Padres ortodoxos, com igual sentimento de piedade e reverência aceita e venera todos os livros, tanto os do Antigo, como os do Novo Testamento, visto terem ambos o mesmo Deus por autor, bem como as mesmas tradições que se referem tanto à fé como aos costumes, quer sejam só oralmente recebidas de Cristo, quer sejam ditadas pelo Espírito Santo e conservadas por sucessão contínua na Igreja Católica. E para que não surja dúvida a alguém a respeito dos livros que são aceitos pelo mesmo Concílio, resolveu ele ajuntar a este decreto o índice dos Livros Sagrados. São portanto os que a seguir vão enumerados:

Do Antigo Testamento: os 5 de Moisés, a saber: Gênese, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio; Josué, Juizes, Rute, os quatro dos Reis, os dois do Paralipômenos, o primeiro de Esdras e o segundo, que se chama Neemias; Tobias, Judite, Ester, Job, o Saltério de David com 150 salmos, os Provérbios, o Eclesiastes, o Cântico dos Cânticos, Sabedoria, Eclesiástico, Isaías, Jeremias, com Baruque, Ezequiel, Daniel; os 12 profetas menores, isto é: Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Nahum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias; o primeiro e o segundo dos Macabeus.

Do Novo Testamento: Os quatro Evangelhos: segundo S. Mateus, S. Marcos, S. Lucas e S. João; os Atos dos Apóstolos escritos pelo evangelista S. Lucas; as 14 epístolas de S. Paulo: aos Romanos, duas aos Coríntios, aos Gálatas, aos Efésios, aos Felipenses, aos Colossenses, duas aos Tessalonicenses, duas a Timóteo, a Tito, a Filêmon, aos Hebreus; duas do Apóstolo S. Pedro; três do Apóstolo S. João; uma do Apóstolo S. Tiago; uma do Apóstolo S. Judas; e o Apocalipse de S. João. Se alguém não aceitar como sacros e canônicos esses livros na íntegra com todas as suas partes, como era costume serem lidos na Igreja Católica e como se encontram na edição antiga da Vulgata Latina; e desprezar ciente e premeditadamente as preditas tradições: - seja excomungado.

Portanto, depois de lançado o fundamento da confissão da fé, saibam todos em que ordem e em que sentido há de prosseguir o próprio Concílio e principalmente quais os testemunhos e argumentos que empregará na confirmação dos dogmas e na restauração dos costumes na Igreja.


A edição da Vulgata da Bíblia e o modo de interpretação

785. Além disso, considerando que poderá resultar em não pequena utilidade para a Igreja de Deus, dando-se a conhecer qual de tantas edições latinas que correm dos Livros Sagrados se deve ter por legítima, esse mesmo sacrossanto Concílio determina e declara: que nas preleções públicas, nas discussões, pregações e exposições seja tida por legítima a antiga edição da Vulgata, que pelo longo uso de tantos séculos se comprovou na Igreja; e que ninguém, sob qualquer pretexto, se atreva ou presuma rejeitá-la.

786. Ademais, para refrear as mentalidades petulantes, decreta que ninguém, fundado na perspicácia própria, em coisas de fé e costumes necessárias à estrutura da doutrina cristã, torcendo a seu talante a Sagrada Escritura, ouse interpretar a mesma Sagrada Escritura contra aquele sentido, que [sempre] manteve e mantém a Santa Madre Igreja, a quem compete julgar sobre o verdadeiro sentido e interpretação das Sagradas Escrituras, ou também [ouse interpretá-la] contra o unânime consenso dos Padres, ainda que as interpretações em tempo algum venham a ser publicadas. Os que se opuserem, sejam denunciados pelos Ordinários e castigados segundo as penas estabelecidas pelo direito. [Seguem uns preceitos sobre a impressão e aprovação dos livros, onde se estabelece entre outras coisas o seguinte:] que para o futuro a Sagrada Escritura, principalmente essa antiga edição da Vulgata, seja publicada do modo mais exato possível; e que a ninguém seja permitido imprimir ou fazer imprimir qualquer livro sobre assuntos sagrados sem o nome do autor, nem vendê-los ou retê-los consigo, se não forem primeiro examinados e aprovados pelo Ordinário…

 

Sessão V (17-6-1546)

Decreto sobre o pecado original

787. Para que a nossa fé católica, sem a qual é impossível agradar a Deus (Heb 11, 6), purificada dos erros, permaneça em sua pureza íntegra e ilibada; e para que o provo cristão não se deixe agitar por qualquer sopro de doutrina (Ef 4, 14) – pois aquela antiga serpente, que foi inimiga do gênero humano desde o princípio, entre os muitos males que perturbam a Igreja de Deus em nossos tempos, também suscitou a respeito do pecado original e do seu antídoto, não só novas mais ainda antigas dissenções – o sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral de Trento, legitimamente reunido no Espírito Santo, presidindo-o os mesmo três legados da Sé Apostólica, querendo tratar logo de chamar [à fé] os que laboram em erro e confirmar os vacilantes, tendo seguido os testemunhos da Sagrada Escritura, dos Santos Padres e de Concílios autorizadíssimos bem como o juízo e o consenso da própria Igreja, estabelece, confessa e declara o seguinte a respeito do mesmo pecado original:

788. 1) Se alguém não confessar que o primeiro homem Adão, depois de transgredir o preceito de Deus no paraíso, perdeu imediatamente a santidade e a justiça em que havia sido constituído; e que pela sua prevaricação incorreu na ira e indignação de Deus e por isso na morte que Deus antes lhe havia ameaçado, e, com a morte, na escravidão e no poder daquele que depois teve o império da morte (Heb 2, 14), a saber, o demônio; e que Adão por aquela ofensa foi segundo o corpo e a alma mudado para pior – seja excomungado.

789. 2) Se alguém afirmar que a prevaricação de Adão prejudicou a ele só e não à sua descendência; e que a santidade e justiça recebidas de Deus, e por ele perdidas, as perdeu só para si e não também para nós; ou [disser] que, manchado ele pelo pecado de desobediência, transmitiu a todo o gênero humano somente a morte e as penas do corpo, não porém o mesmo pecado, que é a morte da alma – seja excomungado, porque contradiz o Apóstolo que diz: Por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte e assim a morte passou para todos os homens, no qual todos pecaram. (Rom 5, 12).

790. 3) Se alguém afirmar que esse pecado de Adão – que é um pela origem e transmitido pela propagação e não pela imitação, mas que é próprio de cada um – se apaga ou por forças humanas ou por outro remédio, que não seja pelos méritos de um único mediador nosso Jesus Cristo, que nos reconciliou com Deus por seu sangue, fazendo-se para nós justiça, santificação e redenção (I Cor 1, 30); ou negar que o mesmo mérito de Jesus Cristo, devidamente conferido pelo sacramento do Batismo na forma da Igreja, é aplicado tanto aos adultos como às crianças – seja excomungado, porque sob o céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos (At 4, 12); daí aquela palavra: Eis o cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo (Jo 1, 29); e esta outra: Todos vós que fostes batizados em Cristo, vos vestistes de Jesus Cristo (Gl 3, 27).

791. 4) Se alguém negar que se devam batizar as crianças recém-nascidas, ainda mesmo quando nascidas de pais batizados; ou disse que devem ser batizadas, sim, para a remissão dos pecados, mas que nada trazem do pecado original de Adão que seja necessário expiar-se no lavacro da regeneração para conseguir a vida eterna, donde resulta que neles a forma do batismo não deve ser entendida como em remissão dos pecados – seja excomungado, porque não é de outro modo que se deve entender o que o Apóstolo: Por um só homem entrou o pecado no mundo e pelo pecado a morte e assim a morte passou a todos os homens naquele em que todos pecaram (Rom 5, 12), senão do modo que a Igreja Católica, espalhada por todo o mundo, sempre o entendeu; porquanto, em razão desta regra de fé, segundo a tradição dos Apóstolos, ainda as criancinhas que não puderam cometer nenhum pecado, também são verdadeiramente batizadas para a remissão dos pecados, a fim de ser nelas purificado pela regeneração o que contraíram pela geração, pois, se alguém não renascer da água e do Espírito Santo, não pode entrar no reino de Deus (Jo 3, 5).

792. 5) Se alguém negar que pela graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, conferida no Batismo, é perdoado o reato do pecado original. Ou se afirmar que não é tirado tudo o que tem verdadeira e própria razão de pecado, mas disser que este é tão somente riscado ou não imputado (sed illud dicit tantum radi aut non imputari) – seja excomungado. Pois Deus nada odeia nos regenerados, visto nada haver de condenação nos que foram verdadeiramente sepultados com Cristo pelo batismo para a morte (Rom 6, 4), os quais não andam segundo a carne (Rom 8, 1), mas despojando-se do homem velho, e revestindo-se do novo que foi criado segundo Deus (Ef 4, 22 ss; Col 3, 9 s), se tornaram sem mancha, imaculados, puros, inocentes, filhos amados de Deus e herdeiros de Deus (Rom 8, 17), de maneira que nada os impede de entrarem logo no céu. Que fique, porém, nos batizados a concupiscência ou o "estopim", [fomes], isto o santo Concílio confessa e sente; mas tendo sido isto deixado para a luta, não pode prejudicar aos que não consentem e lutam varonilmente [auxiliados] pela graça de Jesus Cristo. Mas, pelo contrário, só será coroado quem legitimamente combater (2 Tim 2, 5). O santo Concílio declara que a Igreja Católica jamais entendeu que esta concupiscência – pelo Apóstolo denominada pecado (Rom 6, 12 ss) – se chame "pecado" por ser verdadeira e propriamente pecado nos renascidos, mas por se originar do pecado e nos inclinar ao pecado. Se alguém entender o contrário, seja excomungado.

6) Este mesmo santo Concílio também declara não ser de sua intenção neste decreto, em que se trata do pecado original, incluir a Bem-aventurada e Imaculada Virgem Maria, Mãe de Deus, mas que se devem observar as Constituições do Papa Xisto IV, de feliz memória, sob as penas contidas naquelas mesmas Constituições, que [este Concílio] renova.

 

Sessão VI (13-1-1547)

Decreto sobre a justificação

792 a. Em vista da doutrina errada que nestes tempos se tem espalhado não sem dano para muitas almas e grave detrimento para a unidade da Igreja, para louvor e glória de Deus Onipotente, para tranqüilidade da Igreja e salvação das almas, o sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral de Trento, legitimamente congregado no Espírito Santo…, tem a intenção de expor a todos os fiéis de Cristo a sã e verdadeira doutrina da justificação, ensinada pelo sol de justiça (Mal 4, 2), Cristo Jesus, autor e consumador de nossa fé (Hb 12, 2), transmitida pelos Apóstolos e sempre retida pela Igreja Católica sob a direção do Espírito Santo e manda mui severamente que para o futuro ninguém ouse crer, pregar ou ensinar de outro modo do que está determinado e declarado no presente decreto.

Cap. 1 – A insuficiência da natureza e da lei para justificar os homens

793. Declara em primeiro lugar o santo Concílio que, para se entender de modo correto e puro a doutrina da justificação, é necessário cada um reconheça e confesse que, tendo todos os homens pela prevaricação de Adão, perdido a inocência (Rom 5, 12; 1 Cor 15, 22) e se tornado imundos (Is 64, 6) e (como diz o Apóstolo) por natureza filhos da ira (Ef 2, 3), conforme [o Concílio] expôs no decreto sobre o pecado original, de tal forma eram servos do pecado (Rom 6, 20) e sujeitos ao poder do demônio e da morte, que não só os gentios por força da natureza [cân. 1], mas também os judeus pela força da letra da lei de Moisés não podiam livrar-se ou levantar-se [daquele estado], posto que neles o livre arbítrio de modo algum fosse extinto [cân. 5], [tiveram] contudo as suas forças atenuadas e inclinadas [ao mal].

Cap. 2 – O mistério da vinda de Cristo

794. Assim o Pai celestial, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação (2 Cor 1, 3), quando veio aquela feliz plenitude dos tempos (Ef 1, 10), enviou aos homens Jesus Cristo, seu Filho, que foram anunciado e prometido a muitos Santos Padres antes da Lei e sob a Lei, a fim de remir os judeus que viviam sob a lei e [para] que os povos, que não seguiam a justiça, alcançassem a justiça (Rom 9, 30) e todos recebessem a adoção de filhos (Gal 4, 5). A este propôs Deus como propiciação pela fé no seu sangue pelos nossos pecados (Rom 3, 25), não só pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo (1 Jo 2, 2).

Cap. 3 – Quem é justificado por Cristo

795. Embora tenha ele morrido por todos (2 Cor 5, 15), não obstante nem todos recebem o benefício de sua morte, mas somente aqueles aos quais é comunicado o merecimento de sua Paixão. Porque assim como os homens de fato não haveriam de nascer na injustiça, se não tivessem tido origem em Adão – pois, por meio dele e em conseqüência desta origem contraem na conceição a injustiça que lhes é própria – assim também jamais seriam justificados, se não renascessem em Cristo [cân. 2 e 10]. Pois é por este renascimento, em virtude do mérito da Paixão, que a graça, por meio da qual são justificados, lhes é concedida. Por este benefício o Apóstolo exorta a rendermos sempre graças ao Pai, que nos fez dignos de participar da sorte dos santos na luz (Col 1, 12) e nos tirou do poder das trevas e nos transferiu ao reino de seu amado Filho, no qual temos redenção e remissão dos pecados (Col 1, 13 s).

Cap. 4 – A justificação do pecador

796. Nestas palavras se descreve a justificação do pecador, como sendo uma passagem daquele estado em que o homem, nascido filho do primeiro Adão, [passa] para o estado de graça e de adoção de filhos (Rom 8, 15) de Deus por meio do segundo Adão, Jesus Cristo, Senhor Nosso. – Esta transladação, depois da promulgação do Evangelho, não é possível sem o lavacro da regeneração [cân. 5 sobre o Batismo] ou sem o desejo do mesmo, segundo a palavra da Escritura: se alguém não tiver renascido da água e do Espírito Santo, não poderá entrar no reino de Deus (Jo 3, 5).

Cap. 5 – A necessidade de os adultos se prepararem para a justificação

797. Declara ainda [o Santo Concílio]: o início da justificação dos adultos deve brotar da graça proveniente de Deus [cân. 3] por Jesus Cristo, a saber, de sua vocação, pela qual são chamados, sem qualquer merecimento da parte deles. Assim, aqueles que estavam afastados de Deus pelos pecados, se dispõem [amparados] pela sua graça, que excita e auxilia (per eius excitantem atque adiuvantem gratiam), a alcançarem a conversão e a própria justificação, consentindo livremente nesta graça e livremente cooperando com ela [cân. 4 e 5]; de forma que, tocando Deus o coração do homem com a iluminação do Espírito Santo, fica o homem por um lado não totalmente inativo, recebendo aquela inspiração, que poderia também rejeitá-la; por outro lado, não pode ele de sua livre vontade, sem a graça de Deus, elevar-se à justificação [cân. 3] diante de Deus. Por isso, quando nas Sagradas Escrituras se diz: Convertei-vos a mim e eu me converterei a vós (Zac 1, 3), somos lembrados de nossa liberdade; quando, porém, respondemos: Convertei-nos, Senhor a vós, e seremos convertidos (Lam. Jer 5, 21), confessamos que a graça de Deus nos previne.

Cap. 6 – O modo de preparação

798. A preparação para a justificação se efetua do seguinte modo: excitados e favorecidos pela graça divina, recebem a fé pelo ouvido (Rom 10, 17) e erguem-se livremente paras Deus, crendo ser verdadeiro o que foi revelado e prometido por Deus [cân. 12-14] especialmente, que o pecador é justificado por meio da graça de Deus, pela redenção, que está em Jesus Cristo (Rom 3, 24). Quando eles então, reconhecendo-se pecadores, são abalados proveitosamente pelo medo da justiça divina [cân. 8], lembram-se da misericórdia de Deus e firmam-se confiantes na esperança de que Deus lhes há de ser propício por amor de Cristo. Então começam a amá-lo como fonte de toda a justiça e a se insurgir por isso contra os pecados com ódio e detestação [cân. 9], isto é, pela penitência, que se deve fazer antes do Batismo (At 2, 38); finalmente, se propõem a receber o Batismo, a começar uma nova vida e a cumprir os mandamentos de Deus. Sobre esta disposição está escrito: Quem se achega de Deus, deve crer que ele existe e que é remunerador dos que o buscam (Heb 11, 6); e: confia, filho, os teus pecados te são perdoados (Mt 9, 2; Mc 2, 5); e: o temor de Deus expulsa o pecado (Ec 1, 27) e mais: fazei penitência e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para a remissão dos vossos pecados e recebereis o dom do Espírito Santo (At 2, 38) e ainda: Ide, pois, ensinai a todas as gentes, batizando-as em nome do Padre, e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a observar tudo o que vos tenho mandado (Mt 28, 19) e finalmente: Preparai ao Senhor os vossos corações (1 Rs 7, 3).

Cap. 7 – A essência da justificação do pecador e suas causas

799. A esta disposição ou preparação se segue a própria justificação. Ela é não somente a remissão dos pecados [cân. 11], mas ao mesmo tempo a santificação e renovação do homem interior pela voluntária recepção da graça e dos dons. Por este meio, o homem de injusto se torna justo e de inimigo, amigo, de modo a ser herdeiro da vida eterna segundo a esperança (Tit 3, 7). As causas desta justificação são as seguintes: a [causa] final: a glória de Deus e a de Cristo, bem como a vida eterna; a eficiente: o misericordioso Deus, que sem merecimento nosso lava e santifica (1 Cor 6, 11), assinalando e ungindo com o Espírito Santo da promessa que é o penhor de nossa herança (Ef 1, 13 ss). A [causa] meritória, porém, é seu muito amado Filho Unigênito, Nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo nós inimigos (Rom 5, 10), pela nímia caridade com que nos amou (Ef 2, 4), nos mereceu a justificação e satisfez por nós ao Eterno Pai, com sua santíssima Paixão no lenho da cruz [cân. 10]. A [causa] instrumental é o sacramento do Batismo, isto é, o "sacramento da fé"1, sem o qual jamais alguém alcançou a justificação. Enfim, a causa única formal é "a justiça de Deus, não enquanto ele mesmo é justo, mas enquanto nos torna justos"2 [cân. 10 e 11], quer dizer, enquanto por ele enriquecidos, fica a nossa alma espiritualmente renovada, e não só passamos por justos, mas verdadeiramente nós nos denominamos e somos justos. Pois recebemos em nós a justiça, cada qual a sua, conforme a medida que o Espírito Santo distribui a cada um como ele quer (1 Cor 12, 11) e segundo a disposição e cooperação de cada qual.

800. Assim, ninguém pode ser justo, senão aquele a quem se comunicam os merecimentos da Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo. Mas isto assim sucede nesta justificação do pecador, precisamente pelo fato de o amor de Deus se difundir pelo Espírito Santo, por força dos merecimentos desta sagrada Paixão, nos corações (Rom 5, 5) dos que são justificados, aderindo-lhes intimamente [cân. 11]. Por isso, na justificação é infundido no homem por Jesus Cristo, a quem está unido, ao mesmo tempo, tudo isto: fé, esperança e caridade. Porque a fé nem une perfeitamente com Cristo, nem faz membro vivo de seu corpo, se não se lhe ajuntarem a esperança e a caridade. Daí a razão de se dizer com toda a verdade: a fé, sem obras, é morta (Tgo 2, 17 ss) e ociosa [cân. 19]; e em Jesus Cristo nem a circuncisão nem o prepúcio valem coisa alguma, mas a fé que obra pela caridade (Gal 5, 6; 6, 15). Esta é a fé que os catecúmenos, segundo a Tradição apostólica, suplicam à Igreja cantes do batismo, quando pede a "fé que lhes outorga a vida eterna"3, [mas] que, sem a esperança e a caridade, a fé não pode conceder. Por isso ouvem logo em resposta as palavras de Cristo: Se queres entrar para a vida, guarda os mandamentos (Mt 19, 17) [cân. 18-20]. E após terem os neófitos recebido a justificação verdadeira e cristã, exige-se deles que guardem branca e imaculada esta [veste], como sua veste mais preciosa (Luc 15, 22), que lhes foi concedida por Cristo em vez daquela, que pela desobediência de Adão for a perdida para si e para nós, a fim de chegar com ela ante o tribunal de Nosso Senhor Jesus Cristo e obter a vida eterna.

(1) S. Ambrósio, De Spiritu Sancto, 1, 3, 42 (PL 16, 714); S. Agostinho, Ep. 98, ad Bonif. 9 s (PL 33, 36, 4).
(2) "Iustitia Dei, non qua ipse iustus est, se qua nos justus facit". Cfr. S. Agostinho, De Trin. 14, 12, 15 (PL 42, 1048).
(3) Rit. Rom. Ordo Baptismi, n. I s.

Cap. 8 – Como se deve entender a justificação gratuita do pecador pela fé

801. O Apóstolo diz que o homem é justificado pela fé e sem merecimento (Rom 3, 22. 24). Estas palavras devem ser entendidas tais como sempre concordemente a Igreja Católica as manteve e explicou. "Nós somos justificados pela fé": assim dizemos, porque "a fé é o princípio da salvação humana"4, o fundamento e a raiz de toda justificação, sem a qual é impossível agradar a Deus (Heb 11, 6) e alcançar a companhia de seus filhos. Assim, pois, se diz que somos justificados gratuitamente, porque nada do que precede à justificação, nem a fé, nem as obras, merece a graça da justificação. Porque se ela é graça, já não procede das obras; do contrário a graça, como diz o Apóstolo, já não seria graça (Rom 11, 6).

(4) S. Fulgêncio, De fide, ad Petrum n. 1 (PL 65, 671).

Cap. 9 – Refutação da falsa confiança dos hereges

802. É necessário crer que não se perdoam pecados nem jamais foram perdoados, senão pela misericórdia divina, por causa de Cristo e sem merecimento próprio. Não obstante, a ninguém é lícito dizer que se perdoam ou foram perdoados os pecados àqueles que presume confiada e seguramente de perdão dos pecados e tão somente com isto se tranqüiliza. Pois, [também] nos hereges e cismáticos pode encontrar-se esta confiança vã e alheia a toda a piedade [cân. 12]. Sim, ela aí existe em nossos dias e com grande empenho é pregada contra a Igreja Católica. Também não se deve afirmar que os verdadeiramente justificados devem estar firmemente, sem sombra de qualquer dúvida, convencidos de sua justificação, e que ninguém é absolvido e justificado, a não ser aquele que seguramente crer que foi absolvido e justificado, e que somente por esta fé se efetua a absolvição e a justificação [cân. 14], como se aquele que não cresse nisto, duvidasse das promessas de Deus, da eficácia da morte e da ressurreição de Cristo. Porque, assim como nenhum [homem] pio deve duvidar da misericórdia de Deus, dos merecimentos de Cristo, bem como da virtude e eficácia dos sacramentos, assim também, quando cada qual olha para si mesmo e para sua fraqueza e falta de preparação, pode recear e temer pela sua remissão [cân. 13], visto ninguém poder saber com certeza de fé, a qual não pode estar sujeita a erro algum, que sele conseguiu a graça de Deus.

Cap. 10 – O aumento da justificação recebida

803. Justificados deste modo e feitos amigos e familiares de Deus (Jo 15, 15; Ef 2, 19), indo de virtude em virtude (Sl 83, 8), são renovados (como diz o Apóstolo) de dia para dia (2 Cor 4, 16), isto é, mortificando os membros da própria carne (Col 3, 5), tornando-os armas de justiça (Rom 6, 13. 19) para santificação por meio da observância dos mandamentos de Deus e da Igreja, crescem nesta justificação recebida pela graça de cristo, cooperando na fé com a boas obras (Tg 2, 22), são justificados ainda mais [cân. 24 e 32], como está escrito: O que é justo, seja justificado ainda mais (At 22, 11); e outra vez: Não receies justificar-te até a morte (Ecli 18, 22); e de novo: Vedes, pois, que o homem é justificado pelas obras, e não pela fé somente (Tgo 2, 24). Este aumento de justiça pede-o a Igreja quando reza: Dai-nos, Senhor, aumento de fé, esperança e caridade (XIII domingo depois de Pentecostes).

Cap. 11 – A observância dos mandamentos de Deus, sua necessidade e possibilidade

804. Mas ninguém, posto que justificado, se deve julgar eximido da observância dos mandamentos [cân. 20]. Ninguém deve pronunciar estas palavras temerárias, condenadas pelos Padres com anátema: é impossível ao homem justificado observar os preceitos de Deus [cân. 18 e 22]. "Porque Deus não manda coisas impossíveis, mas quando manda, adverte que faças o que possas e peças o que não possas, e ajuda a poder"5. Os seus mandamentos não são pesados (1 Jo 5, 3), o seu jugo é suave e o seu peso é leve (Mt 11, 30), pois os que são filhos de Deus, amam a Cristo, mas os que o amam guardam (como ele testifica) as suas palavras (Jo 14, 23), e podem seguramente executar isso com o auxílio de Deus. Pois, também eles nesta vida mortal, por mas santos e justos que sejam, caem às vezes pelo menos em pecados leves e quotidianos, chamados também "veniais" [cân. 23], mas com isto não deixam de ser justos. Pois é verdadeira e humilde aquela oração dos justos: Perdoai-nos as nossas dívidas (Mt 6, 12). E assim acontece que os justos tanto mais se sentem obrigados a andar pelo caminho da justiça, quanto estando já livres do pecado e feitos servos de Deus (Rom 6, 22), vivendo sóbria, justa e piedosamente (Tit 2, 12), podem progredir por meio de Jesus Cristo, por quem tiveram acesso a esta graça (Rom 5, 2). Porque Deus, os que uma vez foram justificados pela sua graça, "não os desampara a não ser que seja primeiro abandonado por eles"6. Assim, portanto, ninguém deve lisonjear-se com a fé somente [cân. 9, 19, 20], julgando estar pela fé somente constituído herdeiro e que conseguirá a herança ainda que não padeça com Cristo para ser glorificado com ele (Rom 8, 17). Pois o mesmo Cristo, (como diz o Apóstolo), embora fosse Filho de Deus, praticou, contudo, obediência pelo sofrimento, e depois de consumado, se tornou para todos os que lhe obedecem autor da salvação (Hb 5, 8 s). Por isso o mesmo Apóstolo admoesta os justificados, dizendo: Não sabeis que os que correm no estádio, correm, sim, todos, mas um só é que alcança o prêmio? Correi, pois, de modo que o alcanceis. Quanto a mim, corro, não como quem não tem meta certa, combato não como quem açoita o ar, mas castigo o meu corpo e o reduzo à escravidão, para que não suceda que, tendo eu pregado aos outros, venha eu mesmo a ser réprobo (1 Cor 9, 24 ss). De modo semelhante, fala o Príncipe dos Apóstolos, S. Pedro: Ponde cada vez mais cuidado em tornardes certa a vossa vocação e eleição por meio do boas obras, porque fazendo isto, não pecareis jamais (2 Ped 1, 10). Donde se infere que impugnam a doutrina da religião ortodoxa aqueles que dizem que o justo em todas as obras boas peca ao menos venialmente [cân. 25] ou, (o que é ainda mais intolerável), merece penas eternas; e [erram] também os que afirmam que os justos pecam em todas as obras, se, despertando de sua indolência e animando-se a correr no estádio, pondo seu intento primeiramente na glória de Deus, olham também para o prêmio eterno [cân. 26, 31], como está escrito: inclinei o meu coração para executar as vossas justificações, por amor da retribuição (Sl 118, 112); e de Moisés diz o Apóstolo: que olhava para a remuneração (Hb 11, 26).

(5) "Nam Deus imposibilia non iubet, sed iubendo monet, et facere quod possis, et petere quod non possis" Cfr. S. Agostinho, De nat. et gratia, c. 43, n. 50 (PL 44, 271).
(6) Deus "non deserit, nisi ab eis prius deseratur". Cfr. S. Agostinho, Op. Cit. C. 26, n. 29 (PL 44, 261).

Cap. 12 – Presunção temerária de ser predestinado

805. Ninguém, enquanto peregrina por esta vida mortal, deve querer penetrar tanto no mistério oculta da predestinação divina, que possa afirmar com segurança ser ele, sem dúvida alguma, do número de predestinados [cân. 15], como se o justo não pudesse mais pecar [cân. 23] ou, que se tiver pecado, poderá com certeza prometer-se a si mesmo uma nova conversão. Pois, sem uma revelação toda especial de Deus, não se pode saber quais os que Deus escolheu para si [cân. 16].

Cap. 13 – O dom da perseverança

806. O mesmo se deve entender a respeito do dom da perseverança [cân. 16], do qual está escrito: O que perseverar até o fim, este será salvo (Mt 10, 22. 24. 13). Este dom não pode ser obtido senão daquele que é poderoso para sustentar o que está de pé (Rom 14,4) a fim de que continue de pé até o fim, e para erguer novamente aquele que cai. Ninguém se prometa coisa alguma com certeza absoluta, posto que todos devem por e colocar a sua firmíssima esperança no auxílio de Deus. Porque Deus – a não ser que eles mesmos faltem à sua graça – assim como iniciou a obra boa, também a levará a bom termo, operando o querer e o executar (Filip 2, 13) [cân. 22]7. Porém, os que julgam estar de pé, vejam que não caiam (1 Cor 10, 12) e trabalhem em sua salvação com temor e tremor (Filip 2, 12) nos trabalhos, vigílias, esmolas, orações, oblações, jejuns e na castidade (cfr. 2 Cor 6, 3 ss). Sabendo que renasceram na esperança (1 Ped 1, 3) da glória, e não na glória, devem temer a peleja que lhes resta com a carne, com o mundo e com o demônio, peleja da qual não podem sair vencedores, se não obedecerem, com a graça de Deus, à palavra do Apóstolo: Não somos devedores à carne, para que vivamos segundo a carne. Pois, se viverdes segundo a carne, morrereis. Se, porém, com o espírito mortificardes as obras da carne, vivereis (Rom 8, 12 s).

(7) Cfr. A oração da Igreja "Actiones nostras, quaesumus Domine, aspirando praeveni et adiuvando prosequere, ut cuncta nostra oratio et operatio a te semper incipiat et per te coepta finiatur".

Cap. 14 – A queda no pecado e a sua reparação

807. Aqueles que pelo pecado perderam a graça da justificação, que haviam recebido, poderão novamente ser justificados [cân. 29] se, excitados por Deus, procurarem recuperar a graça perdida por meio do sacramento da Penitência, em virtude do merecimento de Cristo. Este modo de justificação é a reparação do que caiu, sendo com muito acerto denominada pelos Santos Padres de "segunda tábua depois do naufrágio da graça perdida"8. Pois, para os que depois do Batismo caem em pecados, instituiu Jesus Cristo o sacramento da Penitência com as palavras Recebei o Espírito Santo; àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados, e àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos (Jo 20, 22-23). Por onde se deve ensinar que a Penitência do cristão depois da queda muito se distingue do Batismo, e que nela está contida não só a renúncia e a detestação dos pecados, ou o coração contrito e humilhado (Sl 50, 19), mas também a confissão sacramental dos mesmos, ao menos em desejo [in voto], que se há de cumprir a seu tempo, a absolvição sacerdotal e anda a satisfação por jejuns, orações, esmolas e outros piedosos exercícios da vida espiritual, não em lugar do castigo eterno, que é com a culpa perdoado pela recepção do sacramento ou pelo desejo de recebê-lo, mas em lugar do castigo temporal [cân. 30], que, como ensinam as Sagradas Letras, nem sempre é perdoado todo – como sucede no Batismo – àqueles que, ingratos à graça de Deus, contristaram o Espírito Santo (Ef 4, 30) e não recearam violar o templo de Deus (1 Cor 3, 17). Desta Penitência está escrito: Lembra-te donde caíste, faze penitência e volta às tuas primeiras obras (Apoc 2, 5); e noutro lugar: A tristeza que é segundo Deus produz uma penitência estável para a salvação (2 Cor 7, 10); e outra parte: Fazei penitência (Mt 3, 2; 4, 17), e ainda: Fazei dignos frutos de penitência (Mt 3, 8).

(8) Cfr. Tertuliano, De poenit. 4. 7. 9. 12 (PL 1, 1238 ss); S. Jerônimo, Ad Demetrium ep. 130, 9 (PL 22, 1115); In Isaiam 2, 3, 56 (PL 24, 65 D); S. Paciano, Ep. 1, 5 (PL 13, 1056 A); De lapsu virg. Consecr. 8, 38 (PL 16, 379 A).

Cap. 15 – A graça, e não a fé, se perde com qualquer pecado mortal

808. Também contra fraudulentos espíritos de certos homens, que com doces palavras e benção seduzem os corações dos inocentes (Rom 16, 18), se deve assegurar que a graça da justificação, uma vez recebida, não se perde só pela infidelidade [cân. 27], por meio da qual se perde a própria fé, mas também por qualquer outro pecado mortal, mesmo quando não se perca a fé [cân. 28]. Por ali se deve defender a doutrina da lei divina que exclui do reino de Deus não só os infiéis, mas também os fiéis fornicadores, adúlteros, efeminados, sodomitas, ladrões, avarentos, beberrões, maldizentes, gatunos (1 Cor 6, 9 s) e todos os que cometem pecados mortais, dos quais se podem abster com o auxílio da graça divina, e pelos quais se separam da graça de Cristo [cân. 27].

Cap. 16 — O fruto da justificação, isto é, o merecimento das boas obras e a razão do merecimento

809. Deste modo, portanto, devem ser propostas aos homens justificados, quer tenham conservado a graça recebida, quer a tenham recuperado depois de perdida, as palavras do Apóstolo: Sede ricos em todas as boas obras, sabendo que o vosso trabalho não é inútil no Senhor (l Cor 15, 58), pois não é Deus injusto para se esquecer da vossa obra e do amor que mostrastes ao seu nome (Hb 6, 10). E estas outras: Não queirais perder a vossa confiança, que tem uma grande remuneração (Hb 10, 35). E por isso aos que trabalham fielmente até ao fim (Mt 10, 22) e esperam em Deus, se há de propor a vida eterna como graça misericordiosamente prometida por Cristo aos filhos de Deus, e "como recompensa"9 que, segundo a promessa do próprio Deus, será fielmente concedida pelas suas obras e merecimentos [cân. 26 e 32]. Esta é, pois, aquela coroa de Justiça que — como dizia o Apóstolo — lhe estava reservada para depois de seu combate e carreira e que lhe seria dada pelo justo juiz, não só para si, mas também a todos que, amorosos, anseiam pelo seu advento (2 Tim 4, 7 s). Porquanto Jesus Cristo mesmo dá a sua força aos justificados como a cabeça aos membros (Ef 4, 15) e a vide aos ramos (Jo 15, 5). Esta força sempre antecede às suas boas obras, acompanha-as e as segue, e sem ela de modo nenhum poderiam ser agradáveis a Deus e meritórias [cân. 2]. Deve-se, por isso, crer que nada mais falta a estes justificados a fim de, com as ditas obras que foram feitas em Deus, poderem plenamente, segundo o estado de vida, satisfazer à lei divina e a seu tempo (morrendo em estado de graça) conseguir a vida eterna. Porquanto Cristo Nosso Salvador diz: Se alguém beber da água que eu lhe der, não terá sede eternamente, mas brotará dele uma fonte de água que corre para a vida eterna (Jo 4, 13 s). Assim, portanto, a nossa própria justiça não se estabelece como própria, como se de nós decorresse, e também não se ignora ou se repudia a justiça de Deus (Rom 10, 3). Esta Justiça é denominada a nossa, porque somos justificados por ela, que inere intimamente em nós [cân. 10 e 11]. E esta mesma é a de Deus, em vista dos merecimentos de Cristo infundida em nós.

810. Não se deve, todavia, omitir o seguinte: Embora na Sagrada Escritura se atribua tão grande valor às boas obras, que Cristo prometeu: Quem oferecer um copo de água fresca a um destes pequeninos, em verdade não ficará sem a sua recompensa (Mt 10, 14); e o Apóstolo testifique: O que presentemente é para nós uma tribulação momentânea e ligeira, produz em nós um peso de glória (2 Cor 4, 17); contudo, longe esteja o cristão de confiar ou se gloriar em si mesmo e não no Senhor (l Cor l, 31; 2 Cor 10, 17), cuja bondade é tanta para com todos os homens, que ele quer que estes seus próprios dons se tornem merecimentos deles [cân. 32]. E porque todos nós pecamos em muitas coisas (Tgo 3, 2) [cân. 23], cada qual deve ter diante dos olhos tanto a misericórdia e bondade de Deus, como a sua severidade e juízo, e não se julgar a si mesmo, embora nada lhe pese na consciência, porque a vida do homem há de ser toda examinada e julgada, não pelo tribunal humano, mas pelo de Deus, que há de alumiar as trevas mais recônditas e manifestar os desígnios dos corações, e então cada um receberá de Deus o louvor (l Cor 4, 4), que — como está escrito — dará a cada um conforme as suas obras (Rom 2, 6).

Depois desta doutrina católica da justificação [cân. 33], que cada qual deverá aceitar fiel e firmemente, se quiser ser Justificado, o santo Concilio resolveu ajuntar os seguintes cânones, para que todos saibam, não só o que devem aceitar e seguir, mas também o que evitar e fugir.

(9) Cfr. S. Agostinho, De gr. et lib. arb. c. 8, n. 20 (PL 44, 893).

Cânones sobre a justificação

811. Cân. 1. Se alguém disser que o homem pode ser justificado perante Deus pelas suas obras, feitas ou segundo as forças da natureza, ou segundo a doutrina da Lei, sem a graça divina [merecida] por Jesus Cristo — seja excomungado. [cfr. n° 793 s].

812. Cân. 2. Se alguém disser que a graça divina [merecida] por Jesus Cristo é dada somente para que o homem possa viver mais facilmente justificado e para mais facilmente merecer a vida eterna, como se pelo livre arbítrio, sem a graça, pudesse conseguir uma e outra coisa, ainda que penosamente e com dificuldades — seja excomungado [cfr. n° 795 e 809].

813. Cân. 3. Se alguém disser que sem a inspiração preveniente do Espírito Santo e sem o seu auxílio, pode o homem crer, esperar e amar ou arrepender-se como convém para lhe ser conferida a graça da Justificação — seja excomungado [cfr. n° 797].

814. Cân. 4. Se alguém disser que o livre arbítrio do homem, movido e excitado por Deus, em nada coopera para se preparar e se dispor a receber a graça da justificação — posto que ele consinta em que Deus o excite e o chame — e que ele não pode discordar, mesmo se quiser, mas se porta como uma coisa inanimada, perfeitamente inativa e meramente passiva — seja excomungado [cfr. n° 797].

815. Cân. 5. Se alguém disser que o livre arbítrio do homem, depois do pecado de Adão, se perdeu, ou se extinguiu, ou que é coisa só de título, ou antes, titulo sem realidade, e enfim, uma ficção introduzida na Igreja por Satanás — seja excomungado [cfr. n° 793 e 797].

816. Cân. 6. Se alguém disser que não está no poder do homem tornar os seus caminhos maus, mas que Deus faz tanto as obras más como as boas, não só enquanto Deus as permite, mas [as faz] em sentido próprio e pleno, de sorte que não é menos obra sua a própria traição de Judas do que a vocação de Paulo — seja excomungado.

817. Cân. 7. Se alguém disser que todas as obras que são feitas antes da justificação, de qualquer modo que se façam, são verdadeiramente pecados ou merecera o ódio de Deus; ou que, com quanto maior veemência alguém se esforça em se dispor para a graça, tanto mais gravemente peca — seja excomungado [cfr. n° 797].

818. Cân. 8. Se alguém disser que o medo do inferno que nos leva a procurar refúgio na misericórdia divina, condoendo-nos dos pecados, e faz com que nos abstenhamos do pecado, — é pecado ou faz os pecadores piores — seja excomungado [cfr. n° 798].

819. Cân. 9. Se alguém disser que o ímpio é justificado somente pela fé, entendendo que nada mais se exige como cooperação para conseguir a graça da justificação, e que não é necessário por parte alguma que ele se prepare e disponha pela ação da sua vontade — seja excomungado [cfr. n° 798. 801, 804].

820. Cân. 10. Se alguém disser que os homens são justificados sem a justiça de Cristo, pela qual ele mereceu por nós; ou que é por ela mesma que eles são formalmente justos — seja excomungado [cfr. n° 795, 799].

821. Cân. 11. Se alguém disser que os homens são justificados ou só pela imputação da justiça de Cristo, ou só pela remissão dos pecados, excluídas a graça e a caridade que o Espírito Santo infunde em seus corações e neles inerem; ou também que a graça pela qual somos justificados é somente um favor de Deus — seja excomungado [cfr. n° 799 e 809].

822. Cân. 12. Se alguém disser que a fé que justifica não é outra coisa, senão uma confiança na divina misericórdia, que perdoa os pecados por causa de Cristo ou que é só por esta confiança que somos justificados — seja excomungado [cfr. n° 798 e 802].

823. Cân. 13. Se alguém disser que para conseguir a remissão dos pecados é necessário a todo homem crer certamente e sem hesitação alguma, mesmo em vista da fraqueza e falta de preparação próprias, que os pecados lhe foram perdoados — seja excomungado [cfr. n° 802].

824. Cân. 14. Se alguém disser que o homem é absolvido dos seus pecados e justificado porque crê indubitavelmente que é absolvido e justificado; ou, que ninguém é verdadeiramente justificado, senão quem crer que é justificado; e que somente com esta fé se efetua a absolvição e a justificação — seja excomungado [cfr. n° 802].

825. Cân. 15. Se alguém disser que o homem renascido e justificado está obrigado pela fé a crer que certamente é do número dos predestinados — seja excomungado [cfr. n° 805].

826. Cân. 16. Se alguém disser que com absoluta e infalível certeza há de ter aquele grande dom da perseverança final, sem o ter sabido por especial revelação — seja excomungado [cfr. n° 805 s].

827. Cân. 17. Se alguém disser que a graça da justificação só se dá aos predestinados para a vida, e que todos os outros que são chamados, são-no, sim, mas não recebem a graça, visto estarem pelo poder divino predestinados para o mal — seja excomungado.

828. Cân. 18. Se alguém disser que também ao homem justificado e constituído em graça é impossível observar os preceitos de Deus — seja excomungado [cfr. n° 804].

829. Cân. 19. Se alguém disser que no Evangelho não há nada de preceito senão a fé, e que todas as demais coisas são indiferentes, nem mandadas nem proibidas, mas livres; ou que os dez mandamentos de modo algum pertencem aos cristãos — seja excomungado [cfr. n° 800].

830. Cân. 20. Se alguém disser que o homem justificado, por mais perfeito que seja, não está obrigado à observância dos mandamentos de Deus e da Igreja, mas somente a crer, como se o Evangelho fosse uma simples e absoluta promessa de vida eterna, sem condição de observar os mandamentos — seja excomungado [cfr. n° 804].

831. Cân. 21. Se alguém disser que Jesus Cristo foi dado por Deus aos homens [só] como Redentor em quem devem crer, e não também como Legislador a quem devem obedecer — seja excomungado.

832. Cân. 22. Se alguém disser que o justificado pode, sem especial auxílio de Deus, perseverar na justiça recebida; ou que ele não pode, com este auxílio, perseverar — seja excomungado [cfr. n° 804 e 806].

833. Cân. 23. Se alguém disser que o homem, uma vez justificado, não pode mais pecar nem perder a graça, e que por isso aquele que cai e peca nunca foi verdadeiramente justificado; ou, pelo contrário, que o homem pode, durante toda a vida, evitar todos os pecados, também os veniais, sem uma prerrogativa especial concedida por Deus, como a Igreja ensina a respeito da Bem-aventurada Virgem - seja excomungado [cfr. n° 805 e 810].

834. Cân. 24. Se alguém disser que a justiça recebida não se conserva nem tão pouco se aumenta diante de Deus pelas boas obras, mas que as boas obras somente são frutos e sinais da justificação que se alcançou, e que não é causa do aumento da mesma — seja excomungado [cfr. n° 803].

835. Cân. 25. Se alguém disser que o justo peca em qualquer obra boa, ao menos venialmente, ou (o que é mais intolerável ainda) mortalmente; e que por isso merece penas eternas, não se condenando [porém] somente porque Deus não imputa aquelas boas obras para a condenação — seja excomungado [cfr. n° 804].

836. Cân. 26. Se alguém disser que os justos não devem esperar de Deus a retribuição eterna pelas boas obras feitas em Deus, pela misericórdia do mesmo Senhor e merecimentos de Jesus Cristo, se perseverarem até ao fim, obrando bem e observando os preceitos divinos — seja excomungado [cfr. n° 809].

837. Cân. 27. Se alguém disser que não há pecado mortal algum, exceto o de infidelidade; ou que por nenhum outro pecado, embora grave e enorme, a não ser pelo de infidelidade, se perde a graça uma vez recebida — seja excomungado [cfr. n° 808].

838. Cân. 28. Se alguém disser que ao perder-se a graça pelo pecado, simultaneamente se perde também a fé; ou que a fé que permanece, embora não seja viva, não é verdadeira fé; ou que aquele que tem a fé sem a caridade não é cristão — seja excomungado [cfr. n° 808].

839. Cân. 29. Se alguém disser que não pode levantar-se com o auxílio da graça de Deus aquele que caiu depois do Batismo; ou, que pode novamente levantar-se e recuperar a justiça perdida, mas só pela fé, sem o sacramento da Penitência, como a Santa Romana e Universal Igreja, instituída por Cristo Nosso Senhor e por seus Apóstolos, tem até o presente professado, observado e ensinado — seja excomungado [cfr. n° 807].

840. Cân. 30. Se alguém disser que a todo pecador penitente, que recebeu a graça da justificação, é de tal modo perdoada a ofensa e desfeita e abolida a obrigação à pena eterna, que não lhe fica obrigação alguma de pena temporal a pagar, seja neste mundo ou no outro, no purgatório, antes que lhe possam ser abertas as portas para o reino dos céus — seja excomungado [cfr. n° 807].

841. Cân. 31. Se alguém disser que o homem justificado peca quando faz boas obras em consideração ao prêmio eterno — seja excomungado [cfr. n" 804].

842. Cân. 32. Se alguém disser que as boas obras do homem justificado de tal modo são dons de Deus, que não são também méritos do homem justificado; ou que este homem justificado, com as boas obras que faz com a graça de Deus e merecimento de Cristo (do qual é membro vivo) não merece verdadeiramente o aumento da graça, a vida eterna e (se morrer em graça) a consecução da mesma vida eterna bem como o aumento da glória — seja excomungado [cfr. n" 803 e 809 s].

843. Cân. 33. Se alguém disser que com esta doutrina católica da justificação, expressa no presente decreto pelo santo Concílio, se derrogam de algum modo a glória de Deus, ou os merecimentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, e não se esclarece a verdade da nossa fé e enfim a glória de Deus e de Jesus Cristo — seja excomungado [cfr. n° 810].

 

Sessão VII (3-3-1547)

Sobre os Sacramentos

Introdução

843a. Para concluir a salutar doutrina da justificação, que na Sessão anterior foi declarada com o consenso comum dos Padres, achou-se conveniente tratar dos santíssimos sacramentos da Igreja, pelos quais toda a verdadeira justiça ou começa, ou começada aumenta, ou perdida é reparada. Por isso, o sacrossanto Concílio Ecumênico e geral de Trento..., para eliminar os erros e extirpar as heresias a respeito destes santíssimos sacramentos que, embora já tivessem sido condenadas outrora pelos nossos Padres, voltaram novamente à tona em nossos dias, ou também surgidos de há pouco, que muito mal fazem à pureza da Igreja Católica e à salvação das almas — baseando-se na doutrina das Sagradas Escrituras, nas tradições apostólicas e no consenso dos outros Concílios e dos Padres — julgou dever estatuir e decretar os presentes cânones...:

Cânones sobre os sacramentos em geral

844. Cân. 1. Se alguém disser que os sacramentos da Nova Lei não foram todos instituídos por Jesus Cristo Nosso Senhor, ou que são mais ou menos que sete, a saber: Batismo, Confirmação, Eucaristia, Penitência, Extrema-Unção, Ordem e Matrimônio; ou que algum destes sete não é verdadeira e propriamente sacramento — seja excomungado.

845. Cân. 2. Se alguém disser que estes mesmos sacramentos da Nova Lei não diferem dos sacramentos da Antiga Lei, senão por serem outras as cerimonias e outros os ritos externos — seja excomungado.

846. Cân. 3. Se alguém disser que estes sete sacramentos são entre si iguais, de sorte que não há razão alguma de um ser mais digno do que o outro — seja excomungado.

847. Cân. 4. Se alguém disser que os sacramentos da Nova Lei não são necessários para a salvação, mas supérfluos; e que sem eles ou sem o desejo deles, só pela fé os homens alcançam de Deus a graça de justificação — ainda que nem todos [os sacramentos] sejam necessários para cada um — seja excomungado.

848. Cân. 5. Se alguém disser que estes sacramentos foram instituídos somente para nutrir a fé — seja excomungado.

849. Cân. 6. Se alguém disser que os sacramentos da Nova Lei não encerram a graça que significam; ou que não conferem a graça aos que lhes não opõem óbice, como se fossem apenas sinais externos da graça ou justiça recebida pela fé, e certos sinais da Religião cristã, com que entre os homens se distinguem os fiéis dos infiéis — seja excomungado.

850. Cân. 7. Se alguém disser que por estes sacramentos não se dá sempre a graça; ou que não se dá a todos, quanto é da parte de Deus, mesmo se os tiverem recebido devidamente (rite), mas que [a graça] é concedida só algumas vezes e a algumas pessoas — seja excomungado.

851. Cân. 8. Se alguém disser que pelos mesmos sacramentos da Nova Lei não se confere a graça só pela sua recepção (ex opere operato), mas que para receber a graça basta só a fé na promessa divina — seja excomungado.

852. Cân, 9. Se alguém disser que nestes três sacramentos, isto é: Batismo, Confirmação e Ordem, não se imprime um caráter na alma, isto é, um sinal espiritual e indelével, por onde não podem eles ser reiterados — seja excomungado.

853. Cân. 10. Se alguém disser que todos os cristãos têm o poder de administrar a palavra de Deus e todos os sacramentos — seja excomungado.

854. Cân. 11. Se alguém disser que nos ministros, enquanto confeccionam e conferem os sacramentos, não se requer a intenção de ao menos fazer o que faz a Igreja — seja excomungado.

855. Cân. 12. Se alguém disser que o ministro que está em pecado mortal não confecciona nem confere sacramento algum, embora faça o que é essencial para confeccionar ou conferir um sacramento — seja excomungado.

856. Cân. 13. Se alguém disser que os ritos aceitos e aprovados pela Igreja Católica, que costumam ser usados na administração solene dos sacramentos, podem ser desprezados ou sem pecado omitidos a bel-prazer pelos ministros, ou mudados em novos e em outros por qualquer pastor de igrejas — seja excomungado.

Cânones sobre o sacramento do Batismo

857. Cân. 1. Se alguém disser que o Batismo de S. João [Batista] teve a mesma eficácia que o Batismo de Cristo — seja excomungado.

858. Cân. 2. Se alguém disser que para o Batismo não é necessário [o uso de] água verdadeira e natural, e por este motivo torcer em uma metáfora aquelas palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo: Se alguém não renascer da água e do Espirito Santo (Jo 3, 5) — seja excomungado.

859. Cân. 3. Se alguém disser que na Igreja Romana, Mãe e Mestra de todas as Igrejas, não reside a verdadeira doutrina acerca do sacramento do Batismo — seja excomungado.

860. Cân. 4. Se alguém disser que o Batismo, mesmo sendo conferido em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo, com a intenção de fazer o que faz a Igreja, mas por um herege, não é verdadeiro Batismo — seja excomungado.

861. Cân. 5. Se alguém disser que o Batismo é facultativo, isto é, não necessário para a salvação — seja excomungado.

862. Cân. 6. Se alguém disser que o batizado, mesmo que queira, não pode perder a graça, por mais que peque, a não ser que não queira crer — seja excomungado.

863. Cân. 7. Se alguém disser que os batizados estão obrigados pelo próprio Batismo à fé somente, não porém a observar também toda a lei de Cristo — seja excomungado.

864. Cân. 8. Se alguém disser que os batizados estão de tal modo livres e isentos dos preceitos da Santa Igreja, quer constem por escrito ou por tradição, que não estão obrigados a guardá-los, salvo se, por sua livre vontade, quiserem sujeitar-se a eles — seja excomungado.

865. Cân. 9. Se alguém disser que nos homens se deve revocar de tal modo a lembrança do Batismo recebido, que entendam serem nulos todos os votos feitos depois do Batismo, por força da promessa feita no mesmo, como se fossem em detrimento da fé que abraçaram e do mesmo Batismo — seja excomungado.

866. Cân. 10. Se alguém disser que todos os pecados cometidos depois do Batismo são perdoados ou se tornam veniais só pela recordação e fé no Batismo recebido — seja excomungado.

867. Cân. 11. Se alguém disser que o verdadeiro Batismo devidamente conferido deve ser repetido naquele que, tendo renegado a fé entre os infiéis, volta à penitência — seja excomungado.

868. Cân. 12. Se alguém disser que ninguém deve ser batizado senão na idade em que Cristo se deixou batizar, ou na hora da morte - seja excomungado.

869. Cân. 13. Se alguém disser que não se podem contar entre os fiéis as crianças, depois de terem recebido o Batismo, porque ainda não crêem realmente e por isso, quando chegarem aos anos de discrição, devem ser rebatizadas; ou que é melhor omitir o seu Batismo do que batizá-las somente na fé da Igreja, antes que possam crer por um ato de fé produzido por elas mesmas — seja excomungado.

870. Cân. 14. Se alguém disser que a estas crianças batizadas, quando crescerem, se lhes deve perguntar se querem ratificar o que os padrinhos prometeram em seu nome no Batismo; e [que], se responderem que não querem, deve-se deixá-las entregues ao seu próprio arbítrio, e que neste ínterim não se há de obrigá-las à vida cristã por meio de outro castigo senão afastando-as da recepção da Eucaristia e dos demais sacramentos até que se emendem — seja excomungado.

Cânones sobre o sacramento da Confirmação

871. Cân. 1. Se alguém disser que a Confirmação dos batizados é cerimonia ociosa e não verdadeiro e próprio sacramento; ou que antigamente não fora outra coisa que uma espécie de catequese pela qual expunham, em presença da Igreja, a razão de sua fé os que estavam para entrar na adolescência — seja excomungado.

872. Cân. 2. Se alguém disser que fazem injúria ao Espírito Santo os que atribuem alguma virtude ao sagrado crisma da Confirmação — seja excomungado.

873. Cân. 3. Se alguém disser que o ministro ordinário da Confirmação não é só o bispo, mas qualquer simples sacerdote — seja excomungado.

 

Sessão XIII (11-10-1551)

Decreto sobre a Santíssima Eucaristia

873 a. O sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral de Trento... — posto que não sem especial assistência e direção do Espírito Santo se reuniu para expor a verdadeira e antiga doutrina sobre a fé e os sacramentos, e para apresentar um antídoto contra todas as heresias e outras chagas gravíssimas, de que a Igreja de Deus se acha em nossos dias miseravelmente atribulada e dividida em muitas e variadas partes — já desde o inicio teve isto em mente: arrancar pela raiz o joio dos execráveis erros e cismas, semeados em nossos calamitosos tempos pelo homem inimigo (Mt 13, 25 ss) por entre a doutrina da fé, o culto e o uso da Santíssima Eucaristia. Desta mesma Eucaristia que outrora o Nosso Salvador deixou na sua Igreja como símbolo de sua unidade e caridade e quis também que por meio dela todos os cristãos estivessem intimamente unidos entre si. Assim é que o mesmo sacrossanto Concílio — declarando aquela verdadeira e sã doutrina a respeito deste venerável e divino sacramento da Eucaristia, que a Igreja Católica, instruída pelo próprio Nosso Senhor Jesus Cristo e por seus Apóstolos, ensinada pelo Espirito Santo que depois lhe inspirou ioda a verdade (Jo 14, 26), sempre manteve e manterá até a consumação dos séculos — proíbe a todos os fiéis de Cristo terem a ousadia de crer, ensinar ou pregar a respeito da Santíssima Eucaristia de um modo diverso do que se explica e define neste presente decreto.

Cap. 1 — A presença real de Cristo na Santíssima Eucaristia

874. Ensina primeiramente o santo Concílio e confessa aberta e simplesmente que no augusto sacramento da Santa Eucaristia, depois da consagração do pão e do vinho, debaixo das espécies destas coisas sensíveis, se encerra Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, verdadeira, real e substancialmente [cân. l ]. Nem repugnam entre si estas coisas: que o mesmo Nosso Senhor esteja sempre sentado à mão direita do Pai no céu, conforme o seu modo natural de existir, e assim a sua substância esteja presente entre nós em muitos outros lugares sacramentalmente com aquele modo de existir, que nós apenas podemos exprimir em palavras, e com a razão iluminada pela fé podemos conhecer e devemos firmemente crer ser possível a Deus. Pelo que, todos os nossos predecessores que viveram na verdadeira Igreja de Cristo, sempre que trataram deste sacramento, reconheceram abertamente que Nosso Redentor instituiu este admirável sacramento na última ceia quando, depois de benzer o pão e o vinho, testificou com palavras distintas e claras que ele lhes dava o seu próprio corpo e sangue. Estas palavras relatadas pelos santos Evangelistas (Mt 26, 26 ss; Mc 14, 22 ss; Lc 22, 19 ss) e repetidas depois por S. Paulo (l Cor 11, 23) têm seu sentido próprio e claro, no qual também os Padres as compreenderam. Pelo que seria sem dúvida alguma detestável crime torcê-las ou levá-las a uma figura ou símbolo, como fizeram alguns homens maus e rixosos que negam a real presença do Corpo e sangue de Cristo contra o universal sentir da Igreja que, sendo coluna e base da verdade (l Tim 3, 15), detesta como satânica esta doutrina, excogitada por esses homens ímpios e, com sentimento de gratidão, reconhece este incomparável beneficio de Cristo.

Cap. 2. — O modo da instituição

875. Nosso Salvador, tendo que se afastar deste mundo para o Pai, instituiu este sacramento no qual parece ter derramado as riquezas de seu divino amor para com os homens, fazendo memória das suas maravilhas (Sl 110, 4) e mandou que, ao recebê-lo, honrássemos sua memória (l Cor 11, 24) e anunciássemos sua morte, até que ele venha a julgar o mundo (l Cor 11, 26). Quis, porém, que se recebesse este sacramento como alimento espiritual das almas (Mt 26, 26), com que se sustentassem e se confortassem [cân. 5], vivendo da vida daquele que disse: Quem me come viverá por mim (Jo 6, 58) e como antídoto a nos livrar das culpas quotidianas e preservar dos pecados mortais. Ademais, quis que fosse penhor da nossa futura glória e perpétua felicidade, e por isso símbolo daquele corpo único do qual ele é a cabeça (l Cor 11, 3; Ef 5, 23), à qual nós, como membros, estivéssemos unidos pelos estreitos laços da fé, esperança e caridade, para que todos disséssemos o mesmo e não houvesse cismas entre nós (1 Cor l, 10).

Cap. 3. — A excelência da Eucaristia sobre os outros sacramentos

876. A Santíssima Eucaristia tem de comum com os demais sacramentos o ser o símbolo de uma coisa sagrada e a forma visível da graça invisível. A sua excelência e singularidade está em que os outros sacramentos só têm a virtude de santificar, quando alguém faz uso deles, ao passo que na Eucaristia está o próprio autor da santidade, antes de qualquer uso [cân. 4]. Pois, não haviam ainda os Apóstolos recebido das mãos do Senhor a Eucaristia (Mt 26, 26; Mc 14, 22), quando ele afirmava ser na verdade o seu corpo aquilo que lhes dava. Foi também sempre esta a fé na Igreja de Deus: que logo depois da consagração estão o verdadeiro corpo de Nosso Senhor e seu verdadeiro sangue conjuntamente com sua alma e sua divindade, sob as espécies de pão e de vinho, isto é, seu corpo sob a espécie de pão e seu sangue sob a espécie de vinho, por força das palavras mesmas; mas o mesmo corpo também [está] sob a espécie de vinho, e o sangue sob a espécie de pão, e a alma sob uma e outra, por força daquela natural conexão e concomitância, com que as partes de Cristo Nosso Senhor, que já ressuscitou dos mortos para nunca mais morrer (Rom 6, 9), estão unidas entre si; e a divindade por causa daquela sua admirável união hipostática com o corpo e a alma [cân. l e3]. Assim, é bem verdade que tanto uma como outra espécie contêm tanto quanto as duas espécies juntas. Pois o Cristo todo inteiro está sob a espécie de pão e sob a mínima parte desta espécie, bem como sob a espécie de vinho e sob qualquer das partes desta espécie.

Cap. 4. — A Transubstanciação

877. Uma vez, porém, que Cristo Nosso Redentor disse que aquilo que oferecia sob a espécie de pão era verdadeiramente o seu corpo (Mt 26, 26; Mc 14, 22 ss; Lc 22, 19 ss; l Cor 11, 24 ss.), sempre houve na Igreja de Deus esta mesma persuasão, que agora este santo Concilio passa a declarar: Pela consagração do pão e do vinho se efetua a conversão de toda a substância do pão na substância do corpo de Cristo Nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na substância do seu sangue. Esta conversão foi com muito acerto e propriedade chamada pela Igreja Católica de transubstanciação [cân. 2].

Cap. 5. — Culto e veneração que se devem tributar à Eucaristia

878. Não há dúvida alguma de que todos os fiéis de Cristo, segundo o costume que sempre vigorou na Igreja, devem tributar a este santíssimo sacramento a veneração e o culto de adoração (latria), que só se deve a Deus [cân. 6]. Nem se deve adorá-lo menos pelo fato de ter sido instituído por Cristo Senhor Nosso como alimento. Pois cremos estar nele presente aquele mesmo, do qual o Eterno Pai, ao introduzi-lo no mundo, disse: Adorem-no todos os anjos de Deus (Hb l, 6; SI 96, 7) e a quem os Magos, prostrando-se, o adoraram (Mt 2, 11), aquele, enfim, do qual a Escritura testifica: os Apóstolos adoraram-no na Galiléia (Mt 28, 17). Declara mais o santo Concilio que, com muita piedade e religião, foi introduzido na Igreja este costume de celebrar-se todos os anos com singular veneração e solenidade, em dia festivo particular, este sublime e venerável sacramento, e de ser levado honorífica e reverentemente em procissões pelas ruas e lugares públicos. Pois é muito justo que haja alguns dias sagrados e estabelecidos, em que todos os cristãos, com singular demonstração de ânimo, se mostrem lembrados e agradecidos para com seu comum Senhor e Redentor por tão inefável e verdadeiramente divino beneficio, em que se representa a vitória e o triunfo de sua morte. Deste modo convinha que a verdade vencedora triunfasse da mentira e heresia, para que seus adversários, à vista de tanto esplendor e alegria de toda a Igreja, debilitados e enfraquecidos se abatam, ou envergonhados e confundidos se convertam.

Cap. 6. — A Santíssima Eucaristia e os enfermos

879. O costume de guardar no tabernáculo a sagrada Eucaristia é tão antigo, que até o século do Concilio de Nicéia o conheceu. O uso [vigente] nas igrejas de se levar a Eucaristia aos enfermos e de a guardar com cuidado particular, além de ser coisa muitíssimo justa e racional, é mandado em muitos Concílios e observado por costume antiquíssimo na Igreja. Por isso também este santo Concílio determina que se mantenha este salutar e necessário costume [cân. 7].

Cap. 7. — A preparação para a digna recepção da Eucaristia

880. Se não convém que alguém se aproxime de algumas funções sagradas a não ser santamente, por certo, quanto maior for o conhecimento de um homem cristão a respeito da santidade e divindade deste celestial sacramento, com tanto maior cuidado se deve acautelar a fim de que não se aproxime, sem grande reverência e santidade, para recebê-lo [cân. 11]; ainda mais quando lemos aquelas palavras do Apóstolo, cheias de temor: Aquele que come e bebe indignamente, come e bebe o seu juízo, não distinguindo o corpo do Senhor (l Cor 11, 29). Assim, quem quiser comungar, deve lembrar-se do preceito: Prove-se o homem a si mesmo (1 Cor 11,28). O costume da Igreja manifesta que esta prova é necessária, para que ninguém, ciente de [estar em] pecado mortal, ainda que lhe pareça estar contrito, se aproxime da Sagrada Eucaristia sem preceder a confissão sacramental. Assim o manda este santo Concílio a todos os cristãos e àqueles sacerdotes, aos quais por ofício incumbe celebrar, contanto que não lhes faltem confessores (copia confessoris). E que, se por necessidade urgente um sacerdote tiver celebrado sem a prévia confissão, confesse-se o mais cedo possível.

Cap. 8. — O uso deste admirável sacramento

881. Quanto ao uso, com muito acerto e sabedoria distinguiram nossos Padres três modos de receber este sacramento. Ensinaram que uns, como os pecadores, só o recebem sacramentalmente; outros, só espiritualmente, a saber: aqueles que pelo desejo (voto) comem aquele pão celestial, que se lhes propõe, com viva, que obra por amor (Gal 5, 6), experimentando o seu fruto e utilidade; e mais outros o recebem ao mesmo tempo sacramental e espiritualmente. Estes são os que primeiro se provam e se preparam de modo que, vestidos da veste nupcial (Mt 22, 11 ss), se achegam a esta divina mesa. Na comunhão sacramental sempre foi costume na Igreja de Deus receberem os leigos a comunhão das mãos do sacerdote, e os sacerdotes darem-na a si próprios, quando celebram [cân. 10]. Com razão e justiça se deve conservar este costume como proveniente da Tradição apostólica.

882. Finalmente o santo Concilio, com paternal afeto, admoesta, exorta, roga e pede pelas entranhas da misericórdia de nosso Deus (Lc l, 78) que todos os que têm o nome de cristãos enfim concordem neste "sinal de união", neste "vínculo de caridade"10, neste símbolo de concórdia, lembrados de tanta majestade e de tão insigne amor de Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos deu a sua dileta alma por preço de nossa salvação, e nos ofereceu sua carne por comida (Jo 6, 48 ss); e também creiam e venerem estes sagrados mistérios de seu corpo e sangue com tal constância e firmeza de fé, com tal devoção de ânimo e com piedade e veneração tais, que possam receber freqüentemente aquele pão sobre-substancial (Mt 6, 11). E que seja para eles verdadeiramente vida da alma e saúde do espírito, e confortados com este vigor (3 Rs 19, 8) possam, pelo caminho desta miserável peregrinação, chegar à pátria celestial para comerem deste pão dos anjos (Sl 77, 25) sem cobertura alguma, o que agora comem encoberto por véus sagrados.

Mas, como não basta dizer a verdade, sem que sejam postos à luz e refutados os erros, quis o santo Concilio ajuntar estes cânones para que, tendo todos entendido a doutrina católica, saibam também contra que heresias se devem acautelar e [quais as que devem] evitar.

(10) Cfr. S. Agostinho, Sn Io. tract. 26, 13 (PL 35, 1612).

Cânones sobre a Santíssima Eucaristia

883. Cân. l. Se alguém negar que no Santíssimo Sacramento da Eucaristia está contido verdadeira, real e substancialmente o corpo e sangue juntamente com a alma e divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, e por conseguinte o Cristo todo, e disser que somente está nele como sinal, figura ou virtude — seja excomungado [cfr. n° 874 e 876].

884. Cân. 2. Se alguém disser que no sacrossanto sacramento da Eucaristia fica a substância do pão e do vinho juntamente com o corpo e o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo; e negar aquela admirável e singular conversão de toda a substância de pão no corpo, e de toda a substância do vinho no sangue, ficando apenas as espécies de pão e de vinho, que a Igreja com suma propriedade (aptissime) chama de transubstanciação — seja excomungado [cfr. n° 877].

885. Cân. 3. Se alguém negar que no venerável sacramento da Eucaristia, debaixo de cada uma das espécies e debaixo de cada parte dessas espécies, aquando elas se dividem, está presente o Cristo todo — seja excomungado [cfr. n° 876].

886. Cân. 4. Se alguém disser que no admirável sacramento da Eucaristia, depois da consagração, não estão o corpo e o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas somente no uso, quando se recebe, e não antes nem depois; e que nas hóstias ou partículas consagradas, que se guardam ou sobram depois da comunhão, não permanece o verdadeiro corpo do Senhor — seja excomungado [cfr. n° 875].

887. Cân. 5. Se alguém disser que o principal fruto da Santíssima Eucaristia é a remissão dos pecados, ou que dela não procedem outros efeitos — seja excomungado [cfr. n° 875].

888. Cân. 6. Se alguém disser que não se deve adorar com culto de latria também externo o Unigênito Filho de Deus no santo sacramento da Eucaristia; e que por isso também não se deve venerar com festividade particular, nem levar solenemente em procissão, segundo o louvável rito e costume da Igreja universal; ou que não se deve expor publicamente ao povo para ser adorado, e que seus adoradores são idólatras — seja excomungado [cfr. n° 878].

889. Cân. 7. Se alguém disser que não é lícito conservar no tabernáculo a sagrada Eucaristia, mas que imediatamente após a consagração deve ser distribuída pelos circunstantes, ou que não é lícito levá-la honrosamente aos enfermos — seja excomungado [cfr. n° 879].

890. Cân. 8. Se alguém disser que Cristo, dado na Eucaristia, é só consumido espiritualmente, e não também sacramental e realmente — seja excomungado [cfr. n° 881].

891. Cân. 9. Se alguém negar que todos e cada um dos fiéis de Cristo, de um e de outro sexo, quando chegarem ao uso da razão, são obrigados todos os anos a comungar ao menos pela Páscoa, conforme o preceito da Santa Igreja — seja excomungado.

892. Cân. 10. Se alguém disser que não é licito ao sacerdote celebrante dar a comunhão a si mesmo — seja excomungado [cfr. n° 881].

893. Cân. 11. Se alguém disser que só a fé é suficiente preparação para se receber o santíssimo sacramento da Eucaristia — seja excomungado. E para que não se receba indignamente tão grande sacramento e cause a morte e a condenação, determina e declara o mesmo santo Concilio que aqueles que se sentem com consciência oprimida pelo pecado mortal, ainda que se julguem sumamente contritos, se puderem encontrar confessor, estão necessariamente obrigados a fazer primeiro a confissão. E se alguém presumir ensinar, pregar ou afirmar com pertinácia o contrário, ou também o defender publicamente em discussões — seja imediatamente, por este fato, excomungado [cfr. n" 880].

 

Sessão XIV (25-11-1551)

Doutrina sobre a Penitência

Introdução

893 a. Posto que no decreto da justificação se fale não pouco do sacramento da Penitência, sendo assim necessário devido à conexão das matérias, contudo é tamanha em nossos dias a multidão dos diversos erros a respeito deste sacramento, que o sacrossanto e geral Concilio Ecumênico de Trento... achou que seria de não pouca importância para a utilidade pública dar uma definição mais exata e mais completa em que, demonstrados e extirpados os erros com o favor do Espírito Santo, a verdade católica aparecesse clara e indubitável. Esta mesma doutrina propõe-na agora o santo Concílio a todos os cristãos a fim de ser observada para sempre.

Cap. l. — A necessidade e a instituição do sacramento da Penitência

894. Se em todos os regenerados houvesse tal gratidão para com Deus, que conservassem constantemente a justiça recebida no Batismo por benefício e graça sua, não seria necessário outro sacramento diverso deste, instituído para remissão dos pecados [cân. 2]. Mas, como Deus, rico em misericórdia (Ef 2, 4), conheceu a fragilidade de nossa origem (Sl 102, 4), quis também conceder um remédio vivificante aos que se entregassem de novo à escravidão do pecado e ao poder do demônio, a saber: o sacramento da Penitência [cân. l], pelo qual se aplica o beneficio da morte de Cristo aos que caem depois do Batismo. A todos os homens que se manchassem com algum pecado mortal foi em verdade a Penitência necessária em todos os tempos para alcançar a graça e a justiça, mesmo àqueles que pediam ser lavados com o sacramento do Batismo, para que, tendo expulsado e reparado a perversidade com o ódio ao pecado e a pia dor da alma, detestassem tão grande ofensa a Deus. Pelo que diz o Profeta: Convertei-vos e fazei penitência de todas as vossas iniquidades, e não vos será ruína a iniquidade (Ez 18, 30). O Senhor também disse: Se não fizerdes penitência, todos parecereis do mesmo modo (Lc 13, 3). E S. Pedro, o Príncipe dos Apóstolos, recomendando a penitência aos que haviam de receber o Batismo, diz: Fazei penitência e batize-se cada um de vós (At 2, 38). Na verdade, nem antes da vinda de Cristo a Penitência era sacramento, nem depois dela o é para alguém antes do Batismo. O Senhor, porém, instituiu o sacramento da Penitência, antes de tudo naquela ocasião em que, ressuscitado dos mortos, soprou sobre os Apóstolos dizendo: Recebei o Espirito Santo; àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos (Jo 20, 22 s). Por esta ação tão insigne e palavras tão claras, o consenso de todos os Padres entendeu sempre ter sido comunicado aos Apóstolos e seus legítimos sucessores o poder de perdoar e reter os pecados para reconciliar os fiéis que caíram em culpa depois do Batismo [cân. 3]. E a Igreja Católica com muita razão condenou outrora e rejeitou como hereges os Novacianos, que pertinazmente negavam o poder de perdoar os pecados. Por isso este santo Concilio, aprovando e aceitando este mui verdadeiro sentido daquelas palavras do Senhor, condena as fantásticas interpretações daqueles que, para combater a instituição deste santo Sacramento, torcem e aplicam falsamente aquelas palavras para o poder de pregar a palavra de Deus e anunciar o Evangelho de Jesus Cristo.

Cap. 2. — A diferença entre o sacramento da Penitência e o do Batismo

895. De resto, é evidente que este sacramento difere muito do Batismo [cân. 2], visto se diferenciarem muitíssimo na matéria e na forma, que perfazem a essência do sacramento. Consta também que o ministro do Batismo não deve ser juiz, porque a Igreja não exerce jurisdição sobre pessoa que não tenha primeiro entrado pela porta do Batismo. Que me importa a mim — diz o Apóstolo — julgar daqueles que estão de fora (l Cor 12, 13)? o mesmo não se dá com os domésticos da fé, que Cristo Senhor, com o lavacro do Batismo, fez uma vez membros do seu corpo. Se, porém, estes se contaminarem depois com algum delito, devem, segundo a sua vontade, purificar-se, não por um novo Batismo, o que de nenhum modo é lícito na Igreja Católica, mas devem comparecer como réus diante deste tribunal da Penitência, a fim de poderem, pela sentença do sacerdote, libertar-se, não apenas uma vez, mas todas as vezes que, arrependidos de seus pecados, recorrerem a ele. Além disso, um é o fruto do Batismo, outro o da Penitência. Pois pelo Batismo, vestindo-nos de Cristo (Gal 3, 27), somos feitos nele novas criaturas, alcançando inteira e total remissão de todos os pecados. A esta renovação e perfeição por meio do sacramento da Penitência de nenhum modo podemos chegar sem grandes prantos e trabalhos de nossa parte, como exige a justiça divina; pelo que com razão a Penitência foi pelos Santos Padres denominada de "batismo laborioso"11. Este sacramento da Penitência é necessário para a salvação aos que caíram depois do Batismo, assim como aos não regenerados é necessário o Batismo [cân. 6].

(11) S. Greg. Naz., Or. 39, 17; cfr. 40, 8 (PG 36, 356 A; 368 C); S. J. Damasc., De fide orthod. 4, 9, (PG 94, 1124 C); S. Filástrio, De haer. 89 (PG 12, 1202).

Cap. 3. — As partes e os efeitos deste sacramento

896. Ensina, ademais, o santo Concílio que a forma do sacramento da Penitência em que principalmente consiste a sua força, está nas palavras do ministro: Eu te absolvo etc. A estas palavras se ajuntam, segundo louvável costume da Santa Igreja, certas preces que de modo algum pertencem à essência da forma, nem são necessárias para a administração do mesmo sacramento. São, porém, como que a matéria (quasi materia) deste sacramento os atos do mesmo penitente, a saber: a contrição, a confissão e a satisfação [cân. 4]. Estes mesmos atos são requeridos por instituição divina no penitente para a integridade do sacramento e para a remissão plena e perfeita dos pecados, e por este motivo se chamam partes da Penitência. Na verdade, o fruto e o efeito deste sacramento, no que pertence à sua força e eficácia, é a reconciliação com Deus, que algumas vezes costuma ser acompanhada nas pessoas piedosas, que recebem este sacramento com devoção, de paz e serenidade da consciência, com veemente consolação do espirito. O santo Concílio, ao ensinar esta doutrina sobre as partes e os efeitos deste sacramento, ao mesmo tempo condena as sentenças daqueles que sustentam que a fé e os terrores da consciência são partes da Penitência [cân. 4].

Cap. 4. — A contrição

897. A contrição, que tem o primeiro lugar entre os mencionados atos do penitente, é uma dor da alma e detestação do pecado cometido, com propósito de não tornar a pecar. Este movimento de contrição foi necessário em todo tempo para se alcançar o perdão dos pecados. No homem que cai depois do Batismo, ela é como que uma preparação para a remissão dos pecados, se estiver unida à confiança na divina misericórdia e ao propósito de executar tudo o mais que se requer para receber devidamente este sacramento. Declara, pois, o santo Concilio que esta contrição encerra não só o deixar de pecar e o propósito, bem como o começo de uma nova vida, mas também o ódio da vida passada, conforme as palavras: Lançai de vós todas as vossas maldades, em que prevaricastes, e fazei em vós um coração novo e um espirito novo (Ez 18, 31). E por certo, quem tiver considerado aqueles clamores dos santos: Contra vós só pequei e fiz o mal na vossa, presença (Sl 50, 6); estou esgotado à força de tanto gemer, rego o meu leito com lágrimas todas as noites (Sl 6, 7); passarei em revista todos os meus anos na vossa presença entre amarguras de minha alma (Is 38, 15) e outros deste gênero, facilmente entenderá que eles procediam de um ódio veemente da vida passada e de grande detestação dos pecados.

898. [O santo Concílio] ainda ensina que, embora algumas vezes suceda ser esta contrição perfeita por força da caridade, e reconciliar o homem com Deus, antes que seja realmente recebido este santo sacramento, contudo não se deve atribuir esta reconciliação à contrição somente, independente do desejo de receber o sacramento, que aliás está contido nela. Quanto àquela contrição imperfeita [cân. 5], chamada atrição, porque nasce ordinariamente da consideração da torpeza do pecado ou do temor do inferno e dos castigos, se com a esperança do perdão excluir a vontade de pecar, [o santo Concílio] declara que ela não somente não faz o homem mais pecador e hipócrita, mas ainda que é dom de Deus e moção do Espírito Santo, que verdadeiramente ainda não habita no homem penitente, mas que somente o move; e ajudado por ele o penitente se dispõe a alcançar a amizade de Deus no sacramento da Penitência. Porquanto, abalados por este temor salutar, os ninivitas fizeram penitência na pregação de Jonas, cheia de terrores, e alcançaram a misericórdia do Senhor (cfr. Jon 3). Por isso é com falsidade que certa gente acusa os autores católicos como se tivessem escrito que o sacramento da Penitência confere a graça sem nenhum movimento bom por parte daqueles que o recebem: o que a Igreja de Deus jamais ensinou nem creu. Mas também é falsa a afirmação de que a contrição é extorquida e forçada, e não livre e voluntária [cân. 6].

Cap. 5. — A confissão

899. Em conseqüência da instituição do sacramento da Penitência, que já foi explicada, a Igreja toda sempre entendeu que a confissão íntegra dos pecados fora também instituída pelo Senhor (Tg 5, 16; l Jo l, 9; Lc 17, 14). Esta confissão é necessária por direito divino a todos os que caem depois do Batismo [cân. 7], porque Nosso Senhor Jesus Cristo, antes de sua ascensão aos céus, deixou os sacerdotes como vigários seus (Mt 16, 19; 18, 18; Jo 20, 23), como presidentes e juizes a quem devem ser confiados todos os pecados mortais, em que os fiéis houverem caído. E devem em virtude do poder das chaves de perdoar ou reter pecados, pronunciar a sentença. Pois é claro que os sacerdotes não poderiam exercer esta sua jurisdição sem o conhecimento de causa, nem guardar equidade na imposição das penas, se os penitentes declarassem só genericamente, e não específica e detalhadamente os pecados. Daí segue que os penitentes devem dizer e declarar na confissão todos os pecados mortais de que se sentirem culpados, depois de feito um diligente exame de consciência, ainda que sejam os mais ocultos e cometidos somente contra os dois últimos preceitos do decálogo (Ex 20, 17; Mt 5, 28). Estes, muitas vezes, ferem mais gravemente a alma e são mais perigosos do que os cometidos abertamente. Os veniais, pelos quais não somos excluídos da graça de Deus, e nos quais freqüentemente caímos, posto que com retidão e utilidade, e sem qualquer presunção se digam na confissão [cân. 7], como mostra a praxe de pessoas tementes a Deus, todavia podem ser calados sem culpa e expiados por muitos outros meios. Mas como todos os pecados mortais, mesmo os de pensamento, tornam os homens filhos da ira (Ef 2, 3) e inimigos de Deus, é necessário buscar em Deus o perdão de todos os pecados por meio de uma confissão sincera e humilde. Assim, quando os fiéis de Cristo se esforçam por confessar todos os pecados que lhes vêm à memória, certamente os expõem à divina misericórdia para que os perdoe [cân. 7]. E os que fazem o contrário e calam alguns voluntariamente, nada expõem à bondade divina que possa ser absolvido pelo sacerdote. Pois, "se o enfermo se envergonha de mostrar a chaga ao médico, a perícia deste não poderá curar aquilo que ignora"12. Ainda se colige que é necessário também explicar na confissão aquelas circunstâncias que mudam a espécie do pecado, porque sem elas os pecados não são cabalmente apresentados pelo penitente, nem suficientemente conhecidos aos juizes para fazerem uma apreciação justa sobre a gravidade dos pecados, e para impor ao penitente uma pena proporcionada. Por isso é alheio à razão ensinar que estas circunstâncias foram inventadas por homens ociosos, ou que se há de confessar uma só circunstância, isto é que se pecou contra seu irmão.

900. Mas também é ímpio dizer-se que a confissão, de certo modo, tal como é mandada, se torna impossível [cân. 8], ou chamá-la martírio das consciências. É, outrossim, constante na Igreja [o costume de] não se exigir outra coisa dos penitentes, senão que, depois de se ter cada qual examinado com diligência e perscrutado todos os recessos e esconderijos da consciência, confesse aqueles pecados de que se puder lembrar de ter ofendido mortalmente a seu Senhor e Deus. Quanto aos outros pecados, que não vêm à mente de quem fez esta diligente consideração, se entendem geralmente incluídos na mesma confissão. E é por estes que nós confiadamente dizemos com o Profeta: Purificai-me, Senhor, de meus delitos ocultos (Sl 18, 13). Quanto à dificuldade de semelhante confissão e à vergonha de revelar os pecados, poderia parecer um jugo assaz pesado, caso não fosse aliviado por tantas e tão grandes vantagens e consolações, que recebem indubitavelmente pela absolvição todos que se achegam dignamente deste sacramento.

901. De resto, quanto ao modo de se confessar secretamente só ao sacerdote, posto que Cristo não proibiu que alguém pudesse, para sua própria humilhação, para se vingar ele mesmo dos seus pecados, confessá-los publicamente, tendo como razões dar bom exemplo aos outros ou causar edificação à Igreja por ele ofendida, isto, porém, não foi mandado por preceito divino; nem seria prudente prescrever-se por uma lei meramente humana que os pecados, particularmente os ocultos, fossem revelados por uma confissão pública [cân. 6]. Por isso, e mais ainda pelo consenso geral e unânime de todos os Santos Padres e dos mais antigos, que sempre têm autorizado a confissão secreta, da qual a Santa Igreja tem feito uso desde o começo, e que ainda hoje em dia emprega, viu-se assim evidentemente refutada a vã calúnia dos que têm a temeridade de propalar não ser ela mais que uma invenção humana, alheia ao mandamento divino, e que teve início no Concílio Lateranense por permissão dos Padres ali reunidos. Pois a Igreja no Concílio Lateranense não estabeleceu o preceito da confissão para os fiéis, sabendo bem que já havia sido estabelecido e que era necessário por direito divino; ela ordenou somente que todos e cada um dos fiéis, ao chegarem ao uso da razão, satisfizessem ao preceito da confissão ao menos uma vez por ano. Donde vem que na Igreja de Deus se observa este costume salutar, com grande proveito para as almas fiéis, de se confessarem especialmente no santo e favorável tempo da Quaresma. O santo Concilio aprova inteiramente este costume, aceita-o e o abraça como piedoso e digno de ser conservado [cân. 8].

(12) S. Jerônimo, In Eccl. comm. 10, 11 (PL 23, 1096).

Cap. 6. — O ministro deste sacramento e a absolvição

902. A respeito do ministro deste sacramento, o santo Concílio declara como falsas e inteiramente alheias à verdade do Evangelho todas as doutrinas que perniciosamente estendem o ministério das chaves a todos os outros homens, além dos bispos e sacerdotes [cân. 10] e supõem, contra a instituição deste sacramento, que aquelas palavras do Senhor: Tudo o que ligardes sobre a terra, será também ligado no céu; e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu (Mt 18, 18), e: àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos (Jo 20, 23), foram dirigidas sem diferença alguma a todos os fiéis de Cristo, de modo que qualquer pessoa teria o poder de perdoar pecados: os públicos, pela correção, se o repreendido se acomodar; os ocultos, pela confissão espontânea, feita a qualquer indivíduo. Declara também que os sacerdotes, mesmo que estejam em pecado mortal, não deixam de perdoar pecados na qualidade de ministros de Jesus Cristo, por causa da força do Espírito Santo, que eles recebem na ordenação; e que pensam de modo errado os que afirmam que os maus sacerdotes perdem aquele poder. Embora a absolvição do sacerdote seja uma concessão de um benefício alheio, contudo não é um simples ministério de anunciar o Evangelho, ou de declarar que os pecados foram perdoados, mas é uma espécie de ato judicial (ad instar actus iudicialis) pelo qual o sacerdote, como juiz, pronuncia a sentença [cân. 9]. Por este motivo o penitente não se deve lisonjear tanto nem confiar de tal modo em sua fé, que chegue a pensar ser verdadeiramente absolvido diante de Deus, mesmo que não haja contrição de sua parte, nem intenção por parte do sacerdote de agir seriamente e de absolver verdadeiramente. Pois a fé sem a penitência não produz a remissão dos pecados; e [pode-se dizer que] seria extremamente negligente de sua salvação quem, percebendo que um sacerdote o absolvesse por mofa, deixasse de procurar com cuidado outro que agisse com seriedade.

Cap. 7. — A reservação de casos

903. Visto que a natureza e a forma do juízo pedem que a sentença se profira somente sobre os súditos, a Igreja de Deus sempre esteve persuadida, e este Concílio o confirma como verdade indubitável, não ter valor algum aquela absolvição que o sacerdote profere sobre quem não tem jurisdição ordinária ou subdelegada. Aos nossos Santíssimos Padres pareceu, pois, ser de suma importância à disciplina do povo cristão que certos crimes mais atrozes e mais graves não pudessem ser absolvidos por quaisquer pessoas, senão só pelos sumos sacerdotes. Pelo que, com muita razão, puderam os Sumos Pontífices, pelo supremo poder que lhes foi confiado em toda a Igreja, reservar ao seu juízo pessoal algumas causas de crimes mais graves. Entretanto, não há dúvida, uma vez que todas as coisas que são de Deus são ordenadas, que isto compete também aos bispos, a cada um na sua diocese, para edificação, e não para a destruição (2 Cor 13, 10), em vista da autoridade que lhes foi dada sobre os demais sacerdotes, seus súditos, principalmente em relação àqueles a quem está anexa a censura de excomunhão. Assim, pois, é por autoridade divina que esta reservação dos pecados tem seu vigor não só na vigilância externa, mas também na presença de Deus [cân. 11]. Mas, para que ninguém pereça por este motivo, com muito zelo sempre se observou na mesma Igreja de Deus que, em artigo de morte, não haja tal reservação, e por isso todos os sacerdotes podem absolver a quaisquer penitentes e de quaisquer pecados e censuras; sendo que fora deste caso nada podem os sacerdotes nos casos reservados, procurem ao menos persuadir aos penitentes que busquem os juizes superiores e legítimos para o benefício da absolvição.

Cap. 8. — A necessidade e o fruto da satisfação

904. Enfim, no que diz respeito à satisfação, a qual, como todas as demais partes da Penitência, de um lado sempre foi em todo o tempo recomendada ao povo cristão pelos nossos Santíssimos Padres, por outro lado nesta nossa idade, sob o pretexto de piedade, é impugnada por aqueles que têm aparências de piedade, porém negaram a sua virtude (2 Tim 3, 5), declara o santo Concilio ser totalmente falso e alheio à palavra de Deus afirmar que o Senhor nunca perdoa a culpa, sem que também se perdoe toda a pena [cân. 12 e 15]. Claros são os exemplos que se acham nas Sagradas Letras, com o que, além da Tradição divina, manifestamente se evidencia e se refuta este erro (cfr. Gen 3, 16 ss; Num 12, 14 s; 20, 11 s; 2 Rs 12, 13 s, etc.). E na verdade, a razão da justiça divina parece requerer que de um modo diverso recebam do Senhor a graça os que por ignorância pecaram antes do Batismo, e de outro os que, uma vez libertados da escravidão do pecado e do demônio, e tendo recebido o dom do Espírito Santo, cientes do que fazem, não recearam violar o templo de Deus (1 Cor 3, 17) e contristar o Espirito Santo (Ef 4, 30). E também convém à divina clemência que os pecados não nos sejam perdoados sem alguma satisfação, a fim de que, apresentando-se a ocasião (Rom 7, 8), julgando esses pecados leves, não caiamos em maiores culpas, [mostrando-nos] injuriosos e contumeliosos ao Espirito Santo (Heb 10, 29), entesourando assim ira para o dia da ira (Rom 2, 5; Tg 5, 3). Estas penas satisfatórias servem certamente para apartar sumamente do pecado e constituem como que um freio a reprimir os penitentes, fazendo-os mais acautelados e vigilantes para o futuro; curando também os remanescentes do pecado com atos de virtude contrários aos hábitos viciosos que adquiriram vivendo mal. Nem jamais na Igreja de Deus se entendeu haver caminho algum mais seguro para apartar o iminente castigo do Senhor, do que praticarem os homens estas obras de penitência com verdadeira dor de alma (Mt 3, 28; 4, 17; 11, 21, etc.). A isto acresce que, quando satisfazemos padecendo pelos pecados, fazemo-nos conformes a Cristo Jesus, que satisfez pelos nossos pecados (Rom 5, 10; l Jo 2, 1 s), do qual procede toda a nossa suficiência (2 Cor 3, 5), recebendo daqui um certíssimo penhor de que, se padecemos com ele, com ele seremos glorificadas (cfr. Rom 8, 17). Nem se deve dizer que esta nossa satisfação, com que pagamos pelos nossos pecados, é tal, que não seja por Cristo Jesus; pois, não podendo coisa alguma por nós mesmos, tudo podemos com a cooperação daquele que nos conforta (cfr. Filip 4, 13). E assim não tem o homem de que se gloriar, mas toda a nossa glória (cfr. l Cor l, 31; 2 Cor 10, 17; Gal 6, 14) está em Cristo, em que vivemos e em quem nos movemos (cfr. At 17, 28), em quem satisfazemos, produzindo dignos frutos de penitência (Lc 3, 8), que dele tiram a sua virtude, por ele são oferecidos ao Pai e por ele aceitos pelo Pai [cân. 13 s].

905. Devem, pois, os sacerdotes do Senhor, quanto lhes inspirar o espírito e a prudência, conforme a qualidade dos delitos e faculdades dos penitentes, impor-lhes satisfações salutares e convenientes, para que não se façam participantes dos pecados alheios, se por acaso dissimularem os pecados e usarem mais indulgência com os penitentes, impondo-lhes penitências demasiado leves por delitos muito graves (cfr. l Tim 5, 22). Atendam sempre a que a satisfação imposta não sirva somente para resguardar a nova vida e curar da enfermidade, mas também para vingança e castigo dos pecados passados. Porque os antigos Padres crêem e ensinam que as chaves foram concedidas aos sacerdotes não somente para desatar, mas também para ligar (cfr. Mt 16, 19; 18, 18; Jo 20, 23) [cân. 15]. E nem por isso julgaram eles que o sacramento da Penitência é o tribunal da ira ou do castigo; da mesma forma como nenhum católico jamais entendeu que com estas nossas satisfações se obscurece ou diminui em parte a eficácia do merecimento ou a satisfação de Nosso Senhor Jesus Cristo, a despeito dos Inovadores que dizem que a melhor penitência é a nova vida, e assim tiram toda a virtude e uso da satisfação [cân. 13].

Cap. 9. — As obras de satisfação

906. Ensina ainda [o santo Concílio] ser tão grande a liberalidade da divina bondade, que não só podemos satisfazer para com Deus Pai por Jesus Cristo, com as penas que de livre vontade aceitamos em vingança do pecado ou impostas por arbítrio do sacerdote conforme o delito, mas também — o que é a maior prova de amor — com castigos temporais infligidos por Deus, se os aceitarmos com paciência [cân. 13].

 

Doutrina sobre o sacramento da Extrema-Unção

907. Foi o santo Concilio de parecer que à precedente doutrina sobre a Penitência se ajuntasse o que segue sobre o sacramento da Extrema-Unção, sacramento que os Padres consideraram como consumativo13, não só da Penitência, mas de toda a vida cristã, que deve ser uma perpétua penitência. Por isso principia a sua declaração, ensinando acerca da sua instituição que, querendo o nosso clementíssimo Redentor que os seus servos em todo o tempo estivessem prevenidos com remédios salutares contra todas as armas de todos os inimigos, da mesma forma como com a instituição dos outros sacramentos lhes conferiu os maiores auxílios, com os quais os cristãos em vida se pudessem conservar isentos de todo o detrimento grave de espírito, assim também quis, por intermédio do sacramento da Extrema-Unção, assegurar o fim da vida com um fortíssimo socorro [cân. l]. Pois, ainda que o nosso adversário [o demônio] busque e aproveite durante toda a vida ocasiões de poder de qualquer modo devorar (l Ped 5, 8) nossas almas, contudo não há tempo em que ele empregue com mais veemência todas as forças de sua astúcia para nos perder e roubar, se o puder, a confiança na divina misericórdia, do que quando vê estar próximo para nós o fim da vida.

(13) S. Tomás, C. Gent. 4, 73.

Cap. l. — A instituição do sacramento da Extrema-Unção

908. Foi, pois, esta sagrada unção dos enfermos, instituída como verdadeiro sacramento da Nova Aliança por Cristo Nosso Senhor, como vem insinuado por S. Marcos (Mc 6, 13) e como foi recomendado aos fiéis e promulgado por S. Tiago, Apóstolo e irmão do Senhor [cân. l]. Está enfermo alguém de vós? — diz ele — Mande chamar os presbíteros da Igreja, e estes orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o enfermo e o Senhor o aliviará; e se estiver em pecados, lhe serão perdoados (Tg 5, 14-15). Por estas palavras, aprendidas da Tradição apostólica transmitida de mão em mão, ensina a Igreja qual a matéria, a forma, o ministro próprio e o efeito deste sacramento salutar. Entendeu, pois, a Igreja que a matéria é o óleo bento pelo bispo, pois que a unção representa do modo mais próprio a graça do Espirito Santo, com que invisivelmente é ungida a alma do enfermo. E a forma são as palavras: Por esta unção etc.

Cap. 2. — O efeito deste sacramento

909. Na verdade o fruto e o efeito deste sacramento vêm explicados nestas palavras: E a oração da fé salvará o enfermo e o Senhor o aliviará; e se estiver em pecados, ser-lhe-ão perdoados (Tg 5, 15). Este fruto é a graça do Espírito Santo, cuja unção purifica as culpas, se houver ainda alguma para expiar, e apaga os remanescentes do pecado, fortalecendo e confirmando a alma do enfermo [cân. 2], excitando nele grande confiança na divina misericórdia, alívio que faz com que sejam menos penosos os incômodos e os trabalhos da enfermidade, podendo assim mais facilmente resistir às tentações do demônio que traiçoeiramente o persegue (Gên 3, 15); e ainda algumas vezes, quando assim é conveniente à salvação da alma, concede [esta unção] a saúde do corpo.

Cap. 3. — O ministro deste sacramento e o tempo em que deve ser administrado

910. Quando se trata de designar quais são os que devem receber e quais os que devem administrar este sacramento, explica-se também [isto] nas sobreditas palavras com clareza. Porque nelas se mostra que os verdadeiros ministros deste sacramento são os presbíteros da Igreja [cân. 4]; e sob esta denominação não se devem entender, neste contexto, os mais idosos ou os magnatas do povo, mas os bispos e os sacerdotes validamente por eles ordenados pela imposição das mãos do presbitério (l Tim 4, 14) [cân. 4]. Também se declara que esta unção se deve aplicar aos enfermos, principalmente àqueles que jazem em tal perigo, que parecem estar no fim da vida, donde vem, aliás, o chamar-se sacramento dos que partem (sacramentum exeuntium). E se suceder que os enfermos, depois de recebida esta unção, reconvalescerem, poderão ser outra vez ajudados com o socorro deste sacramento, se caírem em outro semelhante risco de vida. Pelo que, de nenhum modo se deve prestar ouvidos aos que contra tão manifesta e clara sentença do Apóstolo S. Tiago (Tg 5, 14) ensinam, ou que esta unção é uma bênção humana ou um rito recebido dos Santos Padres, que não encerra nem um mandamento de Deus, nem a promessa de graça [cân. l]; ou que este sacramento já cessou de existir como graça de sarar enfermos, [graça] que se deve referir só à primitiva Igreja; nem aos que dizem que o rito e praxe que a Santa Igreja Romana observa na administração deste sacramento repugnam à sentença do Apóstolo S. Tiago, e que por isso se deverá mudá-lo; nem finalmente [se deve prestar ouvidos] aos que afirmam que esta Extrema-Unção pode ser desprezada pelos fiéis sem pecado [cân. 3]. Pois tudo isto repugna manifestamente às palavras claras de tão grande Apóstolo. Nem a Igreja Romana, Mãe e Mestra de todas as outras, observa outro rito ao administrar esta unção, que o que constitui a substância do sacramento, isto é, a mesma coisa que S. Tiago prescreveu. Nem o desprezo de tão grande sacramento poderia deixar de resultar em grande maldade e ofensa ao Espírito Santo.

Isto é o que este santo Concílio Ecuménico professa e ensina a respeito dos sacramentos da Penitência e da Extrema-Unção, e propõe a todos os fiéis para que o creiam e abracem. E quer este Concilio que os cânones que seguem, se guardem inviolavelmente, condenando eternamente e excomungando aos que afirmarem o contrário.

Cânones sobre o sacramento da Penitência

911. Cân. 1. Se alguém disser que a Penitência na Igreja Católica não é verdadeiro e próprio sacramento instituído por Jesus Cristo Nosso Senhor para reconciliar os fiéis com o mesmo Deus, todas as vezes que depois do Batismo caírem em pecados — seja excomungado [cfr. n° 894].

912. Cân. 2. Se alguém, confundindo os sacramentos, disser que o Batismo é o mesmo sacramento que a Penitência, como se estes dois sacramentos não fossem distintos; e que por isso é sem razão que se denomina a Penitência segunda tábua [de salvação] depois do naufrágio — seja excomungado [cfr. n° 894].

913. Cân. 3. Se alguém disser que estas palavras de Nosso Senhor: Recebei o Espirito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados e a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos (Jo 22, 22 s) não se devem referir ao poder de perdoar e reter os pecados no sacramento da Penitência, segundo sempre o entendeu a Igreja Católica desde o princípio, mas as torcer, contra a instituição deste sacramento, para a autoridade de pregar o Evangelho — seja excomungado [cfr. n° 894].

914. Cân. 4. Se alguém negar que para a inteira e perfeita remissão dos pecados se requerem do penitente três atos, como sendo a matéria (quasi matéria) do sacramento da Penitência, a saber: contrição, confissão e satisfação, que se chamam três partes da Penitência; ou disser que são somente duas as partes da Penitência, isto é: os terrores que padece a consciência depois de reconhecer os seus pecados e a fé no Evangelho ou na absolvição, com que crê lhe são perdoados por Cristo os pecados — seja excomungado [cfr. n° 896].

915. Cân. 5. Se alguém disser que aquela contrição que se concebe pelo exame e pela lembrança e detestação dos pecados, em que se rememoram com amargura da alma os anos passados (Is 38, 15), ponderando a gravidade, a multidão e a fealdade dos seus pecados, a perda da bem-aventurança eterna, o incorrer na eterna condenação, aliada ao propósito de melhor vida não é dor útil e verdadeira nem predispõe para a graça, mas torna o homem hipócrita e o faz [ainda] maior pecador; [e disser] enfim que ela é uma dor forçada e não livre e voluntária — seja excomungado [cfr. n° 898].

916. Cân. 6. Se alguém negar que a confissão sacramental foi instituída e é necessária para a salvação por direito divino; ou disser que o modo de confessar em segredo, só ao sacerdote, que a Igreja desde o princípio sempre observou e ainda observa, é alheio à instituição de Cristo e não passa de invenção humana — seja excomungado [cfr. n° 899 s].

917. Cân. 7. Se alguém disser que no sacramento da Penitência não é necessário, por direito divino, para a remissão dos pecados, confessar todos os pecados mortais de que houver lembrança, feito o devido e diligente exame, e ainda os ocultos [cometidos ocultamente] e os que são contra os dois últimos preceitos do decálogo, bem como as circunstâncias que mudam a espécie do pecado, mas que tal confissão só tem a utilidade de instruir e consolar o penitente, e que antigamente só se observava para se impor a penitência canônica; ou disser que aqueles que procuram confessar todos os pecados, não querem deixar nada à divina misericórdia para que esta o perdoe, ou finalmente que não é lícito confessar pecados veniais — seja excomungado [cfr. n° 899, 001].

918. Cân. 8. Se alguém disser que a confissão de todos os pecados, qual se observa na Igreja, é impossível, e que é uma tradição [meramente] humana, que deve ser abolida pelas pessoas piedosas; ou que à confissão não estão obrigados todos e cada um dos fiéis cristãos de um e de outro sexo, uma vez por ano, conforme a constituição do grande Concílio Lateranense, e que por isso se deve persuadir os fiéis de Cristo, que não se confessem pelo tempo da Quaresma — seja excomungado [cfr. n°. 900 s].

919. Cân. 9. Se alguém disser que a absolvição sacramental do sacerdote não é ato judicial, mas mera pronúncia e declaração de que estão perdoados os pecados ao que se confessa, contanto que este apenas creia que está absolvido, ainda que o sacerdote não absolva seriamente, mas por brincadeira; ou disser que não se requer a confissão do penitente para que o sacerdote o possa absolver — seja excomungado [cfr. n° 902].

920. Cân. 10. Se alguém disser que os sacerdotes que estão em pecado mortal não têm poder de ligar e desligar; ou que não somente os sacerdotes são ministros da absolvição, mas que a todos e a cada um dos fiéis de Cristo foi dito: Tudo o que ligardes na terra, será ligado no céu, e tudo que desligardes sobre a terra, será desligado no céu (Mt 18, 18) e àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-Ihes-ão perdoados; e a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos (Jo 20, 23) e que por virtude destas palavras qualquer um pode absolver os pecados, os públicos somente pela correção, se o corrigido se acomodar, e os ocultos pela espontânea confissão — seja excomungado [cfr. n° 902].

921. Cân. 11. Se alguém disser que os bispos não têm direito de reservar-se casos senão quanto ao foro externo, e que por isso a reservação não impede que [também] o sacerdote absolva verdadeiramente — seja excomungado [cfr. n° 903].

922. Cân. 12. Se alguém disser que Deus sempre perdoa toda a pena junto com a culpa, e que a satisfação dos penitentes não é outra coisa senão a fé com a qual crêem ter Cristo satisfeito por eles — seja excomungado [cfr. n° 904].

923. Cân. 13. Se alguém disser que, quanto à pena temporal dos pecados, de nenhum modo se dá satisfação a Deus pelos merecimentos de Cristo, por meio das penas infligidas por Deus e aceitas pacientemente, nem pelas impostas pelo sacerdote, nem ainda pelas que se adotam por própria vontade, como sejam orações, jejuns, esmolas ou outras obras de piedade, e que portanto a melhor e a única penitência é a nova vida [que se há de levar] — seja excomungado [cfr. n" 904 s].

924. Cân. 14. Se alguém disser que as satisfações com que os penitentes por Jesus Cristo dirimem os pecados, não são culto de Deus, mas tradições dos homens, que obscurecem a doutrina da graça e o verdadeiro culto de Deus e o próprio benefício da morte de Cristo - seja excomungado14[cfr. n° 905].

925. Cân. 15. Se alguém disser que as chaves da Igreja foram dadas só para desligar, e não para ligar, e que por isso, quando os sacerdotes impõem penas aos que se confessam, obram contra o fim a que servem estas chaves e contra a instituição de Cristo; ou [afirmar] que é ficção dizer que, extirpada a pena eterna por virtude destas chaves, pela maior parte resta ainda a pagar a pena temporal — seja excomungado [cfr. n° 904].

(14) Cfr. cân. 2 do Concilio de Laodicéia (ca. 364): "De his qui diversis {acinoribus peccaverunt et perseverantes in «ratione confessionis et poenitentiae conversionem a malis habuere perfectam, pró qualitate delicti talibus post poenitentiae tempus impensum propter clementiam et bonitatem Dei communio concedatur".

Cânones sobre a Extrema-Unção

926. Cân. 1. Se alguém disser que a Extrema-Unção não é verdadeiro e próprio sacramento, instituído por Cristo Nosso Senhor e promulgado pelo Apóstolo S. Tiago (Tg 5, 14), mas somente um rito recebido pelos Padres, ou invenção humana — seja excomungado [cfr. n° 907 ss].

927. Cân. 2. Se alguém disser que a sagrada Unção dos enfermos não confere graça, nem perdoa pecados, nem alivia os enfermos, mas que já acabou, porque só antigamente possuía a virtude de curar os enfermos — seja excomungado [cfr. n° 909].

928. Cân. 3. Se alguém disser que o rito e o uso da Extrema-Unção, que a Santa Igreja Romana observa, repugna à sentença do Apóstolo S. Tiago e que por isso se deve mudá-lo, e os cristãos o podem desprezar sem pecado — seja excomungado [cfr. n° 910].

929. Cân. 4. Se alguém disser que os presbíteros da Igreja, que S. Tiago admoestou fossem chamados para ungir os enfermos, não são os sacerdotes ordenados pelo bispo, mas os mais idosos de qualquer comunidade, e que portanto o verdadeiro ministro da Extrema-Unção não é somente o sacerdote — seja excomungado [cfr. n° 910].

 

Sessão XXI (16-7-1562)

Doutrina da comunhão sob ambas as espécies e das crianças

Introdução

929a. Visto que, por arte do maléfico demônio, se espalham por diversos lugares vários erros monstruosos a respeito do tremendo e santíssimo sacramento da Eucaristia, tendo como consequência em muitas províncias o afastamento da fé e da obediência à Igreja Católica, o sacrossanto Concílio Ecumênico Geral de Trento... Julgou dever expor o que a seguir se diz a respeito da comunhão sob as duas espécies e das crianças. Por este motivo proíbe, depois disso, a todos os fiéis cristãos crer, ensinar ou pregar algo diverso do que vem explicado e definido nestes decretos.

Cap. 1.— Que os leigos e clérigos que não celebram não estão obrigados, por direito divino, a comungar sob as duas espécies

930. Portanto, o mesmo santo Concílio, instruído pelo Espírito Santo, que é o Espírito da sabedoria e do entendimento, o espirito do conselho e da piedade (Is 11, 2) e seguindo o juízo e o costume da mesma Igreja, declara e ensina que os leigos e clérigos que não celebram, por nenhum preceito divino estão obrigados a receber o sacramento da Eucaristia sob ambas as espécies, e que, salva a fé, de nenhum modo se pode duvidar que a comunhão debaixo de uma [só] das espécies lhes baste para a salvação. Portanto, ainda que Cristo Senhor Nosso na última ceia tenha instituído este sacramento sob as espécies de pão e de vinho e o tenha distribuído assim aos Apóstolos (cfr. Mt 26, 26 ss; Mc 14, 22 ss; Lc 22, 19 s; l Cor 11, 24 s), contudo aquela instituição e tradição não pretendem que todos os fiéis de Cristo, por preceito do Senhor, estejam obrigados a receber ambas as espécies [cân. l e 2]. Nem tão pouco se deve concluir daquele sermão que se encontra no capitulo 6 de S. João, que o Senhor ordenou a comunhão de uma e outra espécie, de qualquer modo que se entenda [o dito texto], conforme as várias interpretações dos Padres e Doutores. Pois aquele que disse: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós (Jo 6, 54), disse também: Se alguém comer deste pão, viverá eternamente (Jo 6, 52). E aquele que disse: O que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna (Jo 6, 55), disse também: O pão que eu darei é a minha carne pela vida do mundo (Jo 6, 52). E enfim, aquele que disse: O que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele (Jo 6, 57), disse outrossim: Quem come este pão viverá eternamente (Jo 6, 59).

Cap. 2. — O poder da Igreja de administrar este sacramento

931. Declara mais [este sagrado Concílio] que a Igreja sempre teve o poder de, ao administrar os sacramentos, determinar e mudar, salva [sempre] a sua substância, o que julgar conveniente à utilidade dos que os recebem e à veneração dos mesmos sacramentos, conforme a variedade dos tempos e lugares. Isto parece ter insinuado claramente o Apóstolo com estas palavras: Assim nos considere o homem como ministros de Cristo e dispenseiros dos mistérios de Deus (l Cor 4, l). E consta claramente que ele mesmo usou deste poder, tanto em relação a este sacramento, como em se tratando de muitas outras coisas, pois, após ordenar algumas coisas a respeito de seu uso, diz: O resto disporei quando vier (l Cor l, 34). Por este motivo, conhecendo a santa madre Igreja: a sua autoridade na administração dos sacramentos, muito embora no princípio da religião cristã fosse não pouco frequente o uso de ambas as espécies, contudo, tendo-se mudado muito aquele costume com o correr dos tempos, movida por graves e justas causas, aprovou este costume de comungar sob uma só espécie, e decretou tivesse isso valor de lei, a qual não é lícito reprovar nem alterar sem autoridade da mesma Igreja [cân. 2].

Cap. 3. — Que Cristo se recebe todo e inteiro, como verdadeiro sacramento, sob qualquer das espécies

932. Declara ainda que, posto que o nosso Redentor, como ficou dito, instituiu na última ceia este sacramento e o deu aos Apóstolos sob as duas espécies, contudo devemos confessar que debaixo de cada uma delas se recebe Cristo todo inteiro e como verdadeiro sacramento. E que por isso, no que concerne aos frutos, de nenhuma graça necessária para a salvação ficam privados os que recebem uma [só] espécie [cân. 3].

Cap. 4. — Que as crianças não estão obrigadas à comunhão sacramental

933. Finalmente, o mesmo santo Concílio ensina que as crianças que carecem do uso da razão, por nenhuma necessidade estão obrigadas à comunhão sacramental da Eucaristia [cân. 4], porquanto, estando regeneradas e incorporadas em Cristo pelo lavacro do Batismo (Tito 3, 5), não podem naquela idade perder a graça de filhos de Deus, que já adquiriram. Mas nem por isso se deve condenar os antigos por terem observado este costume em alguns lugares. Sem controvérsia se deve crer que, se aqueles Padres Santíssimos tiveram causa racional de obrar assim, conforme as condições daqueles tempos, certamente não o fizeram por entenderem ser isso necessário para a salvação.

Cânones sobre a comunhão sob ambas as espécies e das crianças

934. Cân. 1. Se alguém disser que todos e cada um dos fiéis de Cristo, por preceito de Deus e necessidade de salvação, devem receber ambas as espécies do santíssimo sacramento da Eucaristia — seja excomungado [cfr. n° 930].

935. Cân. 2. Se alguém disser que a Santa Igreja Católica não foi movida por causas e razões justas ao decretar que os leigos e também os clérigos que não celebram comunguem somente sob a espécie de pão, ou que a Igreja errou, assim fazendo — seja excomungado [cfr. n° 931].

936. Cân. 3. Se alguém negar que Cristo, fonte e autor de todas as graças, é recebido todo e inteiro sob a única espécie de pão, porque, como muitos falsamente afirmam, não se receberia conforme a instituição de Cristo debaixo de ambas as espécies — seja excomungado [cfr. n° 930, 932].

937. Cân. 4. Se alguém disser que a comunhão da Eucaristia é necessária às crianças, antes de chegarem ao uso da razão — seja excomungado [cfr. n° 933].

 

Sessão XXII (17-9-1562)

Doutrina sobre o santíssimo Sacrifício da Missa

937 a. Para que se mantenha íntegra na Igreja Católica a antiga fé e doutrina do grande mistério eucarístico, e, debelados os erros e heresias, se conserve em sua pureza, o sacrossanto Concilio Ecumênico e Geral de Trento, instruído pela ilustração do Espirito Santo,... ensina, declara e determina no que segue o que deve ser pregado aos povos fiéis a respeito [da Eucaristia] enquanto é um verdadeiro e singular sacrifício.

Cap. 1. — Da instituição do sacrossanto sacrifício da Missa15

938. Já que no Antigo Testamento, segundo testifica o Apóstolo S. Paulo, por causa da fraqueza do sacerdócio levítico não havia perfeição, convinha, por disposição de Deus, Pai da misericórdia, se levantasse outro sacerdote segundo a ordem de Melquisedec (Gên 14, 18; Sl 109, 4; Heb 7, 11), Nosso Senhor Jesus Cristo, que pudesse consumar (Heb 10, 14) e levar à perfeição todos os que se houvessem de santificar (Heb 10, 14). Assim, este Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo, embora por sua morte se havia de oferecer uma só vez ao Eterno Pai no altar da cruz, para nele obrar a redenção eterna, contudo, já que pela morte não se devia extinguir o seu sacerdócio (Heb 7, 24. 27), na última ceia, na noite em que ia ser entregue, querendo deixar à Igreja, sua amada Esposa, como pede a natureza humana, um sacrifício visível [cân. l] que representasse o sacrifício cruento a realizar uma só vez na Cruz, e para que a sua memória durasse até a consumação dos séculos e a sua salutar virtude fosse aplicada para remissão dos nossos pecados quotidianos, declarando-se sacerdote perpétuo segundo a ordem de Melquisedec (Sl 109, 4), ofereceu a Deus Pai o seu corpo e sangue sob as espécies do pão e do vinho e, sob as mesmas espécies, entregou Corpo e Sangue aos Apóstolos que então constituiu sacerdotes do Novo Testamento para que o recebessem, mandando-lhes, e aos sucessores deles no sacerdócio, que fizessem a mesma oblação: Fazei isto em memória, de mim (Lc 22, 19; l Cor 11, 24), como a Igreja Católica sempre entendeu e ensinou [cân. 2]. E assim, celebrada a antiga Páscoa, que a multidão dos filhos de Israel imolava em memória da saída do Egito (Ex 12, l ss), instituiu a nova Páscoa, imolando-se a si mesmo pela Igreja por mão dos sacerdotes, debaixo de sinais visíveis, em memória do seu trânsito deste mundo para o Pai, quando nos remiu pela efusão do seu sangue e nos tirou do poder das trevas, transferindo-nos ao seu reino (Col l, 13).

939. Esta é a oblação pura que se não pode manchar com indignidade ou malícia alguma dos que a oferecem, que o Senhor predisse por Malaquias se haveria de oferecer, em todo lugar, pura ao seu nome (Mal l, 11), que havia de ser grande entre as gentes. A esta oblação alude claramente S. Paulo escrevendo aos Coríntios que não podem aqueles que estão manchados com a participação da mesa dos demônios, fazer-se participantes da mesa do Senhor (l Cor 10, 21), entendendo por mesa o altar, em um e outro lugar. Finalmente, este é aquele sacrifício figurado por várias semelhanças de sacrifícios na lei natural e na escrita (Gn 4, 4; 8, 20; 12, 8. 22), pois encerra todos os bens significados por aqueles sacrifícios como consumação e perfeição que é de todos eles.

(15) Os títulos desta sessão não são do Concilio, mas de Filipe Chifflet (séc. 17).

Cap. 2. — O sacrifício visível é propiciatório pelos vivos e defuntos

940. E como neste divino sacrifício, que se realiza na Missa, se encerra e é sacrificado incruentamente aquele mesmo Cristo que uma só vez cruentamente no altar da cruz se ofereceu a si mesmo (Heb 9, 27), ensina o santo Concilio que este sacrifício é verdadeiramente propiciatório [cân. 3], e que, se com coração sincero e fé verdadeira, com temor e reverência, contritos e penitentes nos achegarmos a Deus, conseguiremos misericórdia e acharemos graça no auxilio oportuno (Heb 14, 16). Porquanto, aplacado o Senhor com a oblação dele e concedendo o dom da graça e da penitência, perdoa os maiores delitos e pecados. Pois uma e mesma é a vítima: e aquele que agora oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que, outrora, se ofereceu na Cruz, divergindo, apenas, o modo de oferecer. Os frutos da oblação cruenta se recebem abundantemente por meio desta oblação incruenta, nem tão pouco esta derroga aquela [cân. 4]. Por isso, com razão se oferece, consoante a Tradição apostólica, este sacrifício incruento, não só pelos pecados, pelas penas, pelas satisfações e por outras necessidades dos fiéis vivos, mas também pelos que morreram em Cristo, e que não estão plenamente purificados [cân. 3].

Cap. 3. — As missas em honra dos santos

941. Ainda que a Igreja costume celebrar às vezes algumas missas em honra e memória dos Santos, contudo não diz que se lhes oferecem sacrifícios, mas unicamente a Deus, que os coroou [cân. 5]. É "por isso que o sacerdote não costuma dizer: Ofereço-vos este sacrifício, S. Pedro ou S. Paulo"16, mas, dando graças a Deus pelas vitórias dos Santos, implora o patrocínio deles para que se dignem interceder por nós nos céus aqueles, cuja memória celebramos na terra [Missal].

(16) S. Agostinho, C. Faustum, 20, 21 (PL 42, 384).

Cap. 4. — O Cânon da missa

942. Sendo conveniente que as coisas santas se administrem santamente, e sendo este sacrifício entre todos o mais santo, instituiu a Igreja Católica já há muitos séculos o Cânon sagrado, tão purificado de todo o erro [cân. 6], que nele não há nada que não rescenda a suma santidade e piedade, nada que não eleve a Deus as almas dos que o oferecem. Pois ele se compõe das palavras do mesmo Senhor, como das tradições dos Apóstolos e das piedosas instituições dos Sumos Pontífices.

Cap. 5. — As cerimonias solenes do santo sacrifício da missa

943. Já que a natureza humana é tal, que não pode, facilmente e sem socorros exteriores, elevar-se a meditar as coisas divinas, por isso a Igreja, piedosa Mãe que é, instituiu certos ritos para se recitarem na missa, uns em voz submissa [cân. 9], outros em voz alta. Juntou a isto cerimonias [cân. 7], como bênçãos místicas, luzes, vestimentas e outras coisas congêneres da Tradição apostólica, com que se fizesse perceptível a majestade de tão grande sacrifício, e para que o entendimento dos fiéis se excitasse, por meio destes sinais visíveis da religião e da piedade, à contemplação das coisas altíssimas que se ocultam neste sacrifício.

Cap. 6. — A missa em que só o sacerdote comunga

944. Desejaria o sacrossanto Concílio que os circunstantes que assistem a cada uma das Missas comungassem, não só espiritualmente, mas também com a recepção sacramental da Eucaristia, a fim de participarem mais abundantemente dos frutos deste santíssimo sacrifício. Contudo, se tal nem sempre se dá, nem por isso condena como privadas e ilícitas aquelas Missas em que somente o sacerdote comunga sacramentalmente [cân. 8], pois na verdade também estas Missas se devem considerar comuns, já porque nelas comunga o povo espiritualmente, já porque as celebra o ministro público da Igreja, não somente por si, mas por todos os que pertencem ao corpo [místico] de Cristo.

Cap. 7. — A água que se deve ajuntar ao vinho, quando se oferece o cálice

945. Admoesta mais o santo Concílio ser preceito da Igreja que os sacerdotes ajuntem água ao vinho ao oferecerem o cálice [cân. 9], tanto porque se presume que assim o fez Cristo Senhor Nosso, como também porque do seu lado saiu juntamente sangue e água (Jo 19, 34), mistério que é comemorado por este rito. E como no Apocalipse de S. João os povos se comparam à água (Apoc. 17, l 15), representa-se por este rito a união do mesmo povo fiel à sua cabeça, Cristo.

Cap. 8. — Que a missa ordinariamente não se deve celebrar em língua vulgar e da explicação de seus mistérios ao povo

946. Se bem que a Missa encerre grandes ensinamentos para o povo fiel, contudo pareceu aos Padres não ser conveniente se celebrasse ordinariamente na língua vulgar [cân. 9]. Por isso, conservando o rito aprovado em toda parte de cada uma das Igrejas e da Santa Igreja Romana, Mãe e Mestra de todas, e para que as ovelhas de Cristo não sintam fome e não suceda que os pequeninos peçam pão e não haja quem lho reparta (Lam. Jr. 4, 4), manda o santo Concílio aos pastores e a cada um dos que têm cura de almas, que durante a celebração da missa expliquem frequentes vezes por si ou por outros algo sobre o que se lê na missa, e falem sobre algum mistério deste santíssimo sacrifício, principalmente nos domingos e festas.

Cap. 9. — Introdução aos cânones que seguem

947. Como neste tempo se têm semeado muitos erros, muitas coisas se ensinam e disputam contra esta fé, fundado no santo Evangelho e nas Tradições dos Apóstolos, determina o santo Concílio, depois de muitas e maduras reflexões sobre estas matérias, com o consentimento unânime de todos os Padres, condenar com os seguintes cânones e expulsar da santa Igreja os que se opõem a esta fé puríssima e sagrada doutrina.

Cânones sobre o santíssimo sacrifício da Missa

948. Cân. 1. Se alguém disser que na Missa não se oferece a Deus verdadeiro e próprio sacrifício, ou que oferecer-se Cristo não é mais que dar-se-nos em alimento — seja excomungado [cfr. n° 938].

949. Cân. 2. Se alguém disser que Cristo não instituiu os Apóstolos sacerdotes com estas palavras: Fazei isto em memória de mim (Lc 22, 19; l Cor 11, 24), ou que não ordenou que eles e os demais sacerdotes oferecessem o seu Corpo e Sangue — seja excomungado [cfr. n° 938].

950. Cân. 3. Se alguém disser que o sacrifício da Missa é somente de louvor e ação de graças, ou mera comemoração do sacrifício consumado na cruz, mas que não é propiciatório, ou que só aproveita ao que comunga, e que não se deve oferecer pelos vivos e defuntos, pelos pecados, penas, satisfações e outras necessidades — seja excomungado [cfr. n° 940].

951. Cân. 4. Se alguém disser que o santo sacrifício da Missa é uma blasfêmia contra o santíssimo sacrifício que Cristo realizou na Cruz, ou que aquele derroga este — seja excomungado [cfr. n° 040].

952. Cân. 5. Se alguém disser que é impostura celebrar Missas em honra dos Santos com o fim de conseguir a sua intercessão junto a Deus, como é intenção da Igreja — seja excomungado [cfr. n° 941].

953. Cân. 6. Se alguém disser que o Cânon da Missa contém erros e por isso se deve ab-rogar - seja excomungado [cfr. n° 942].

954. Cân. 7. Se alguém disser que as cerimonias, as vestimentas e os sinais externos de que a Igreja Católica usa na celebração da Missa são mais incentivos de impiedade do que sinais de piedade — seja excomungado [cfr. n° 943].

955. Cân. 8. Se alguém disser que as Missas em que só o sacerdote comunga são ilícitas e por isso se devem ab-rogar — seja excomungado [cfr. n° 944].

956. Cân. 9. Se alguém disser que o rito da Igreja Romana que prescreve que parte do Cânon e as palavras da consagração se profiram em voz submissa, se deve condenar, ou que a Missa se deve celebrar somente em língua vulgar, ou que não se deve lançar água no cálice ao oferecê-lo, por ser contra a instituição de Cristo — seja excomungado [cfr. n° 943, 945 s].

 

Sessão XXIII (15-7-1563)

Doutrina sobre o sacramento da Ordem

956 a. A verdadeira doutrina católica sobre o sacramento da Ordem, condenando os erros do nosso tempo, foi decretada e publicada pelo Santo Concilio de Trento na sétima sessão [sob Pio IV].

Cap. 1. — A instituição do sacerdócio da Nova Lei

957. O sacrifício e o sacerdócio de tal modo estão unidos por determinação de Deus, que tanto um como outro se encontram em cada lei. Como, pois, no Novo Testamento, a Igreja Católica recebeu, por instituição do Senhor, o santo e visível sacrifício da Eucaristia, devemos também confessar que nele há um novo sacerdócio visível e exterior [cân. l], para o qual o antigo se transferiu (Heb 7, 12 ss). Este sacerdócio, como mostram as Sagradas Escrituras, como ensinou sempre a Tradição da Igreja Católica, foi instituído por nosso Salvador [cân. 3], o qual deu aos Apóstolos e seus sucessores no sacerdócio o poder de consagrar, de oferecer e de ministrar o seu Corpo e Sangue, bem como de perdoar e reter os pecados [cân. l].

Cap. 2. — As sete Ordens

958. E já que o ministério de um tão santo sacerdócio é coisa divina, foi conveniente que, para que ele se pudesse exercer o mais dignamente possível e com a máxima veneração, para bom regulamento da Igreja, tão sábia em toda a sua conduta, houvesse muitas e diversas Ordens de ministros (Mt 16, 19; Lc 22, 19; Jo 20, 22 s) — cujo ofício fosse servir ao sacerdócio — distribuídas de modo que os que tivessem já sido assinalados com a tonsura clerical ascendessem pelas Ordens menores às maiores [cân. 2]. Porquanto, não só dos sacerdotes fazem menção clara às Sagradas Escrituras, mas também dos diáconos (At 6, 5; l Tim 3, 8 ss; Filip l, l), declarando com palavras sérias o que na sua ordenação se deve atender de modo especial. E desde o princípio da Igreja estiveram em uso as Ordens seguintes e as funções próprias de cada uma: a de subdiácono, a de acólito, a de exorcista, a de leitor e a de ostiário, embora de diferente grau, visto que o subdiaconato é posto na classe das Ordens maiores pelos Padres e pelos sagrados Concílios, nos quais se fala também frequentemente das Ordens menores.

Cap. 3. — A Ordem é verdadeiro sacramento

959. Sendo manifesto pelo testemunho da Escritura, pela Tradição apostólica e pelo unânime consenso dos Padres, que pela sagrada ordenação, ministrada com palavras e sinais exteriores, se confere a graça, ninguém deve duvidar que a Ordem seja verdadeira e propriamente um dos sete sacramentos da santa Igreja. O Apóstolo é quem o diz: Admoesto-te a que ressuscites a graça que está em ti pela imposição das minhas mãos. Pois Deus não nos concedeu o espirito de temor, mas de virtude, de amor e sobriedade (2 Tim 1,67; cfr. 1 Tim 4, 14).

Cap. 4. — A hierarquia eclesiástica e o poder de ordenar

960. Porquanto no sacramento da Ordem, assim como no Batismo e na Confirmação, se imprime caráter [cân. 4], que se não pode extinguir nem remover, com razão condena o santo Concílio a sentença daqueles que afirmam que os sacerdotes do Novo Testamento têm somente poder temporário e que depois de uma vez ordenados podem outra vez ser leigos, se não exercerem o ministério da palavra de Deus [cân. l]. E se alguém afirmar que todos os cristãos são, indistintamente, sacerdotes do Novo Testamento, ou asseverar que todos são dotados de igual poder espiritual, parece não fazer outra coisa senão confundir a hierarquia eclesiástica, que é como um exército bem formado (Cânt 6, 3) [cân. 6], como se, contra a doutrina de S. Paulo, todos fossem apóstolos, todos profetas, todos evangelistas, todos pastores e todos doutores (cfr. l Cor 12, 29; Ef 4, 11). Portanto, declara o santo Concilio que, além dos demais graus eclesiásticos, primordialmente os bispos que são os sucessores dos Apóstolos, pertencem à ordem hierárquica, e que eles foram — como diz o Apóstolo S. Paulo, — estabelecidos pelo Espirito Santo para governar a Igreja de Deus (At 20, 28) e que eles são superiores aos presbíteros, conferem o sacramento da Confirmação e ordenam os ministros da Igreja, podendo exercer muitas outras funções que os de ordem inferior não podem exercer [cân. 7]. Ensina ademais o sacrossanto Concílio que na ordenação dos bispos e sacerdotes, e na administração das demais Ordens não se requer o consentimento do povo nem de qualquer poder ou magistrado secular, como se, faltando ele, fosse nula a ordenação; antes estabelece que todos aqueles que chegarem a exercer estes ministérios, sendo chamados e instituídos só pelo povo, pelo poder e pelos magistrados seculares, arrogando-se temerariamente estes poderes, não são ministros da Igreja, mas devem ser tidos por salteadores e ladrões, que não entraram pela porta (cfr. Jo 10, l) [cân. 8]. Isto é em resumo o que pareceu ao santo Concílio dever ensinar aos fiéis acerca do sacramento da Ordem. Resolveu também condenar as doutrinas opostas com os seguintes cânones expressos e determinados, para que todos, com o favor de Cristo, valendo-se da regra da fé, possam facilmente conhecer e conservar a verdade da fé católica no meio das trevas de tantos erros.

Cânones sobre o sacramento da Ordem

961. Cân. l. Se alguém disser que no Novo Testamento não há sacerdócio visível e externo, ou que não há poder algum de consagrar e oferecer o verdadeiro Corpo e Sangue do Senhor, bem como de perdoar e reter os pecados, mas há apenas um simples ministério de pregar o Evangelho, ou que aqueles que não pregam não são absolutamente sacerdotes — seja excomungado [cfr. n° 957, 960].

962. Cân. 2. Se alguém disser que além do sacerdócio não há na Igreja Católica outras Ordens maiores e menores, pelas quais gradualmente se chega ao sacerdócio — seja excomungado [cfr. n° 958].

963. Cân. 3. Se alguém disser que a Ordem ou sacra ordenação não é verdadeiro e próprio sacramento instituído por Cristo Nosso Senhor, ou que é uma invenção humana, excogitada por pessoas ignorantes das coisas eclesiásticas, ou que somente é um rito de eleger ministros da palavra de Deus e dos sacramentos — seja excomungado [cfr. n° 957, 959].

964. Cân. 4. Se alguém disser que pela sagrada ordenação não se confere o Espírito Santo, e que assim debalde dizem os bispos: Recebe o Espirito Santo; ou que por ela não se imprime caráter; ou que aquele chegou a ser sacerdote se pode outra vez fazer leigo — seja excomungado [cfr. n° 852].

965. Cân. 5. Se alguém disser que a sagrada unção, de que a Igreja faz uso na ordenação, não só é desnecessária, mas ainda se deve desprezar, e é perniciosa, valendo o mesmo das demais cerimonias da ordenação — seja excomungado [cfr. n° 856].

966. Cân. 6. Se alguém disser que na Igreja Católica não há hierarquia eclesiástica estabelecida por ordem de Deus, que se compõe de bispos, presbíteros e ministros — seja excomungado [cfr. n° 960].

967. Cân. 7. Se alguém disser que os bispos não são superiores aos presbíteros; ou que não têm poder de crismar e ordenar ou que o [poder] que têm lhes é comum com os presbíteros; ou que as ordens que eles conferem sem o consentimento do povo ou do poder secular são nulas; ou [ainda] que aqueles que não são nem ordenados pelo poder eclesiástico e canônico nem por eles enviados, mas vêm de outra parte, são legítimos ministros da palavra de Deus e dos sacramentos — seja excomungado [cfr. n° 960].

968. Cân. 8. Se alguém disser que os bispos que são eleitos por autoridade do Romano Pontífice não são legítimos e verdadeiros bispos, mas invenção humana — seja excomungado [cfr. n° 960].

 

Sessão XXIV (11-11-1563)

Doutrina sobre o sacramento do Matrimonio

969. O vínculo perpétuo e indissolúvel do matrimonio exprimiu-o o primeiro pai do gênero humano, quando disse por inspiração do Divino Espírito - Isto é o osso dos meus ossos, a carne da minha carne. Pelo que deixará o homem a seu pai e a sua mãe e unir-se-á com sua mulher e serão os dois em uma só carne (Gn 2. 23 s; cfr. Ef 5, 31). Mais claramente ensinou Cristo Nosso Senhor que por este vínculo só se unem e juntam dois, quando, referindo estas últimas palavras como proferidas por Deus, disse: Portanto, já não são duas carnes, mas uma (Mt 19, 6) e logo confirmou a estabilidade — Já muito antes declarada por Adão — do mesmo nexo com estas palavras: Portanto, não separe o homem o que Deus uniu (Mt 19, 6; Mc 10, 9). Quanto à graça que aperfeiçoa aquele amor natural, confirma a unidade indissolúvel e santifica os esposos; foi o próprio Cristo, instituidor e autor dos santos sacramentos, que no-la mereceu com sua Paixão. Assim o ensina o Apóstolo S. Paulo com estas palavras: Homens, amai vossas mulheres como Cristo amou a Igreja e se entregou a si próprio por ela (Ef 5, 25); e acrescenta logo: Este sacramento é grande; digo-o, porém, em Cristo e na Igreja (Ef 5, 32).

970. Visto que o matrimonio da Lei Evangélica excede pela graça de Cristo os antigos matrimonios, com razão ensinaram os nossos santos Padres, os Concílios e toda a Tradição da Igreja, que ele deve ser enumerado entre os sacramentos da Nova Lei. Contra esta doutrina se levantaram furiosos neste século certos homens ímpios, que não só tiveram opiniões erradas sobre este sacramento venerável, mas ainda, como costumam, introduziram a liberdade da carne sob pretexto de Evangelho, afirmando, por escrito e oralmente, muitas doutrinas alheias ao sentir da Igreja Católica, à Tradição, aprovada desde o tempo dos Apóstolos, e isto não sem grande dano dos fiéis de Cristo. Ora, querendo este santo e universal Concílio atalhar a sua temeridade, julgou se deviam pôr à luz as principais heresias e erros dos sobreditos cismáticos, para. que o seu pernicioso contágio não continue a infeccionar a outros, estabelecendo contra esses hereges e seus erros os seguintes anátemas:

Cânones sobre o sacramento do Matrimonio

971. Cân. l. Se alguém disser que o Matrimonio não é verdadeira e propriamente um dos sete sacramentos da Lei Evangélica, instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo, e [disser] que foi inventado pelos homens na Igreja e que não confere graça — seja excomungado [cfr. n° 969].

972. Cân. 2. Se alguém disser que é licito aos cristãos ter ao mesmo tempo muitas mulheres, e que isto não é proibido por nenhuma lei divina (Mt 19, 4 ss 9) — seja excomungado [cfr. n° 969].

973. Cân. 3. Se alguém disser que só aqueles graus de consangüineidade e de afinidade que se declaram no Levítico (Lv 18, 6 ss) podem impedir de contrair matrimonio e dirimi-lo depois de contraído; ou que a Igreja não pode dispensar de alguns desses impedimentos ou estabelecer outros [graus] que impeçam e dirimam — seja excomungado.

974. Cân. 4. Se alguém disser que a igreja não pôde estabelecer impedimentos dirimentes do matrimonio, e que errou ao estabelecê-los — seja excomungado.

975. Cân. 5. Se alguém disser que o vínculo do matrimonio pode ser dissolvido pelo cônjuge por motivo de heresia, de molesta coabitação ou de ausência afetada — seja excomungado.

976. Cân. 6. Se alguém disser que o matrimonio contraído mas não consumado não se dirime pela solene profissão religiosa de um dos esposos — seja excomungado.

977. Cân. 7. Se alguém disser que a Igreja17 erra quando ensinou e ensina que, segundo a doutrina evangélica e apostólica (Mc 10; l Cor 7), o vínculo do matrimonio não pode ser dissolvido pelo adultério dum dos cônjuges e que nenhum dos dois, nem mesmo o inocente que não deu motivo ao adultério, pode contrair outro matrimonio em vida do outro cônjuge, e que comete adultério tanto aquele que, repudiada a adúltera, casa com outra, como aquela que, abandonado o marido, casa com outro — seja excomungado.

978. Cân. 8. Se alguém disser que a Igreja erra, quando determina que por muitos motivos se pode fazer [licitamente] separação entre os consortes quanto ao tálamo e coabitação, por tempo certo ou incerto — seja excomungado.

979. Cân. 9. Se alguém disser que os clérigos constituídos em ordens sacras e os Regulares que professam solenemente castidade, podem contrair validamente matrimonio, não obstante a lei eclesiástica ou o voto, e que o contrário disto outra coisa não é senão condenar o Matrimonio; e que podem contrair matrimonio todos os que não sentem ter o dom da castidade, ainda que o tenham prometido — seja excomungado. Pois Deus não nega este dom a quem piamente lho pede, nem consente que sejamos tentados acima das nossas forças (l Cor 10, 13).

980. Cân. 10. Se alguém disser que o estado conjugal se deve antepor ao estado da virgindade ou celibato, e que não é melhor nem mais beato permanecer no estado de virgindade e celibato do que contrair matrimonio (cfr. Mt 19, 11 s; l Cor 7, 25 s 38. 40) — seja excomungado.

981. Cân. 11. Se alguém disser que a proibição da solenidade dos desponsórios em certos tempos do ano é uma superstição tirânica derivada das superstições pagas; ou condenar as bênçãos e outras cerimonias que a Igreja usa neles — seja excomungado.

982. Cân. 12. Se alguém disser que as causas matrimoniais não são da competência dos juizes eclesiásticos — seja excomungado.

(17) Esta condenação foi assim formulada para não ofender os Gregos, que, na praxe, seguiam o contrário, embora na doutrina concordassem com a Igreja. Referindo-se a este cânon, diz Pio XI, na encíclica Casti Connubii ("Documentos Pontifícios", Vozes, n. 4, p. 39 s): "Do fato de a Igreja não ter errado nesta doutrina, e por isso mesmo que é absolutamente certo que o vínculo do matrimonio não pode ser dissolvido nem mesmo pelo adultério, segue-se com evidência que muito menos valor têm todas as outras razões, aliás mais fracas, que costumam apresentar-se a favor do divórcio, as quais, por conseguinte, não devem ter-se em conta algu-ma".

 

Sessão XXV (3 e 4-12-1563)

Decreto sobre o Purgatório

983. Já que a Igreja Católica, instruída pelo Espírito Santo, apoiada nas Sagradas Letras e na antiga Tradição dos Padres, ensinou nos sagrados Concílios e recentemente também neste Concílio Ecumênico, que existe purgatório [cfr. n° 840], e que as almas que nele estão detidas são aliviadas pelos sufrágios dos fiéis, principalmente pelo sacrifício do altar [cfr. n° 940, 950], prescreve o santo Concílio aos bispos que façam com que os fiéis mantenham e creiam a sã doutrina sobre o purgatório, aliás transmitida pelos santos Padres e pelos Sagrados Concílios, e que a mesma doutrina seja pregada com diligência por toda parte. Sejam, outrossim, excluídas das pregações populares à gente simples as questões difíceis e sutis e as que não edificam (cfr. l. Tim l, 4) nem aumentam a piedade. Igualmente não seja permitido divulgar ou discorrer sobre assuntos duvidosos ou que trazem a aparência do falso. Sejam ainda proibidas como escandalosas e prejudiciais aos fiéis aquelas coisas que têm em vista provocar a curiosidade ou que rescendem a superstição ou a um torpe lucro...

A invocação, a veneração e as Relíquias dos Santos, e as sagradas Imagens

984. Manda o Santo Concílio a todos os bispos, aos encarregados do ensino e aos que mantêm cura, que instruam diligentemente os fiéis, sobretudo no que diz respeito à intercessão e invocação dos Santos, à veneração das suas Relíquias e ao uso legítimo das Imagens, segundo o costume da Igreja Católica recebido dos primórdios do Cristianismo, conforme o consenso comum dos Santos Padres e os decretos dos sacros Concílios. Ensinem-lhes que os Santos reinam juntamente com Cristo e oferecem a Deus suas orações pelos homens, que é bom e útil invocá-los com súplicas e recorrermos às suas orações, ao seu socorro e auxilio, para obtermos benefícios que a Deus devem ser pedidos por intermédio de Seu Filho Jesus Cristo Nosso Senhor, único Redentor e Salvador nosso. Pensam, pois, impiamente os que dizem que os Santos, que gozam da eterna felicidade no céu, não devem ser invocados; outro tanto se diga dos que afirmam que invocá-los para que orem por cada um de nós é oposto à palavra de Deus e contrário à honra do único mediador de Deus e dos homens, Jesus Cristo (cfr. l Tim 2, 5), ou que é estultície suplicar com palavras ou mentalmente aos que reinam no céu.

985. Ensine-se aos fiéis que os veneráveis corpos dos santos Mártires e dos outros que vivem em Cristo devem ser venerados, por terem sido membros vivos de Cristo e templos do Espirito Santo (cfr. l Cor 3, 16; 6, 19; 2 Cor 6, 16), que serão por ele ressuscitados e glorificados para a vida eterna, pois Deus tem concedido muitos benefícios aos homens por sua intercessão. Portanto devem ser condenados, como outrora já fez a Igreja, e agora torna a faze-lo os que afirmam que não se deve prestar honra e veneração às Relíquias dos Santos, que é inútil honrar estes e outros monumentos, que em vão se cultua a memória dos Santos, pedindo-lhes auxílios.

986. Quanto às Imagens de Cristo, da Santíssima Virgem e de outros Santos, se devem ter e conservar especialmente nos templos e se lhes deve tributar a devida honra e veneração, não porque se creia que há nelas alguma divindade ou virtude pelas quais devam ser honradas, nem porque se lhes deva pedir alguma coisa ou depositar nelas alguma confiança, como outrora os gentios, que punham suas esperanças nos ídolos (cfr. Sl 134, 15 ss), mas porque a veneração tributada às Imagens se refere aos protótipos que elas representam, de sorte que nas Imagens que osculamos, e diante das quais nos descobrimos e ajoelhamos, adoremos a Cristo e veneremos os Santos, representados nas Imagens. Isto foi sancionado nos decretos dos Concílios, especialmente no segundo de Nicéia contra os iconoclastas.

987. Os bispos ensinem, pois, diligentemente, com narrações dos mistérios de nossa redenção, com quadros, pinturas e outras figuras, pois assim se instrui e confirma o povo, ajudando-o a venerar e recordar assiduamente os artigos de fé. Então sim, grande fruto se poderá auferir do culto das sagradas Imagens, não só porque por meio delas se manifestam ao povo os benefícios e as mercês que Deus lhes concede, mas também porque se expõem aos olhos dos fiéis os milagres que Deus opera pelos seus Santos, bem como seus salutares exemplos. Rendam, assim, por eles graças a Deus, regulem a sua vida e costumes à imitação deles e se afervorem em adorar e amar a Deus, fomentando a piedade. Se alguém ensinar ou pensar de modo contrário a estes decretos — seja excomungado.

988. Se nestas santas e salutares observâncias se introduzirem abusos, deseja ardentemente este santo Concílio que sejam totalmente abolidos, a fim de que não tenha isso para os simples as aparências de um falso dogma e não seja ocasião de erros. E se alguma vez acontecer que se representem e ilustrem episódios e narrações da Sagrada Escritura, como aliás é conveniente ao povo pouco instruído, ensine-se então que nem por isso é possível representar a divindade, como se a víssemos com os olhos corporais, ou a pudéssemos exprimir em cores e figuras...

Decreto sobre as Indulgências

989. Tendo recebido de Cristo o poder de conferir Indulgências, já nos tempos antiquíssimos usou a Igreja deste poder, que divinamente lhe fora doado (cfr. Mt 16, 19; 18, 18). Por isso ensina e ordena o sacro Concílio que se deve manter na Igreja o uso das Indulgências, aliás muito salutar para o povo cristão, e aprovado pela autoridade dos sacros Concílios, condenando como excomungados os que afirmem serem as indulgências inúteis, bem como os que negarem à Igreja o poder de concedê-las...

Sobre o matrimonio clandestino nulo
(Da sessão XXIV, cap. l, "Tametsi")

990. Embora não se deva duvidar que os matrimonios clandestinos, realizados com o consentimento livre dos contraentes, sejam válidos e verdadeiros, enquanto a Igreja não os declarar nulos (írritos), devendo, portanto, ser condenados — como de fato os anatematiza o sacro Concilio — os que negam a sua validade, e os que falsamente afirmam ser inválidos os matrimónios contraídos pelos filhos sem o consentimento dos pais, como se dependesse dos pais fazer o casamento válido ou nulo, contudo, apesar disso, a Santa Igreja sempre os tem detestado e proibido, movida por justíssimas causas. Sabendo o santo Concílio que aquelas proibições já não surtem efeito devido à desobediência dos homens, e ciente de que se cometem graves pecados, cuja origem reside nos matrimonios clandestinos, especialmente por parte dos que estão em estado de excomunhão, pois, tendo abandonado a primeira mulher, que fora desposada às ocultas, unem-se às claras com outra, passando a viver com ela em perpétuo adultério; e não podendo este mal ser obviado pela Igreja, que não julga o oculto, a não ser pelo uso de um remédio mais eficaz, manda este santo Concílio, seguindo as normas do Quarto Concílio de Latrão, celebrado sob Inocêncio III, que para o futuro, antes do casamento, o próprio pároco dos contraentes proclame três vezes publicamente os que vão contrair, em três dias festivos contínuos, durante a missa. Corridos os pregões, e não se apresentando legítimo impedimento, proceda-se ao matrimonio em face da Igreja, onde o pároco, após interrogar o homem e a mulher, se receber o mútuo consentimento, diga: Eu vos uno em matrimonio, em nome do Padre, do Filho e do Espirito Santo, ou use de outras palavras, segundo o rito de cada província.

991. Se, porém, houver alguma vez suspeita provável de que o matrimonio possa ser impedido maliciosamente, caso seja precedido pelos proclamas, neste caso, ou faça-se um só proclama, ou então celebre-se o matrimonio na. presença do pároco e de ao menos três testemunhas. Depois do casamento, antes de sua consumação, far-se-ão os proclamas na Igreja para que, caso haja algum impedimento, mais facilmente seja descoberto; a não ser que o Ordinário mesmo dispense de tais proclamas, o que o Concílio deixa à prudência e ao julgamento do Ordinário.

992. O santo Concílio declara completamente inábeis para contrair matrimonio os que tentarem faze-lo de outro modo que não na presença do pároco (ou de outro sacerdote delegado pelo pároco ou pelo Ordinário) e duas ou três testemunhas. Tais contratos os dá por írritos e nulos, como com efeito os invalida e anula por este decreto.

Sobre a Trindade e a Encarnação (contra os Unitários)
(Da Constituição "Cum quorundam" de Paulo IV, 7-8-1555)

993. A maldade e iniquidade de certos homens de tal modo tem aumentado nos nossos tempos, que a maioria dos que se afastam e desviam da fé católica, não só presumem professar diversas heresias, mas também negar o fundamento da própria fé, e arrastam por seu exemplo muitas almas para a perdição. Assim nós, desejando, por ofício pastoral e por caridade, apartar os homens, na medida do que Deus nos conceder, de tão grave e pestilencial erro, e admoestar os outros para não caírem na mesma impiedade, com paternal severidade admoestamos a todos e a cada um dos que até agora afirmaram, dogmatizaram e creram que o Deus Onipotente não é trino nas pessoas e uno na unidade inteiramente incomposta e indivisa da substância e mesma essência simples da divindade; ou que Nosso Senhor não é verdadeiro Deus, da mesma substância em tudo com o Padre e o Espirito Santo; ou que ele não foi segundo a carne concebido no seio da Beatíssima sempre Virgem Maria, mas sim de José, à semelhança dos outros homens; ou que o mesmo Senhor e Deus Jesus Cristo não padeceu a morte crudelíssima de cruz para nos resgatar do pecado e da morte eterna, reconciliando-nos com o Pai para a vida eterna; ou que a mesma Beatíssima Virgem Maria não é verdadeira Mãe de Deus nem permaneceu sempre íntegra em sua virgindade, antes do parto, no parto e depois do parto para sempre.

Profissão de fé
(Da Bula de Pio IV "Iniunctum nobis" de 13 de Novembro de 1564)

994. Eu N. creio firmemente e confesso tudo o que contém o Símbolo da fé usado pela Santa Igreja Romana, a saber: Creio em um só Deus, Pai Onipotente, [etc. como no n° 782].

995. Aceito e abraço firmemente as tradições apostólicas e eclesiásticas, bem como as demais observâncias e constituições da mesma Igreja. Admito também a Sagrada Escritura naquele sentido em que é interpretada pela Santa Madre Igreja, a quem pertence julgar sobre o verdadeiro sentido e interpretação das Sagradas Escrituras. E jamais aceitá-la-ei e interpretá-la-ei senão conforme o consenso unânime dos Padres.

996. Confesso também que são sete os verdadeiros e próprios sacramentos da Nova Lei, instituídos por Nosso Senhor Jesus Cristo, embora nem todos para cada um necessários, porém para a salvação do gênero humano. São eles: Batismo, Confirmação, Eucaristia, Penitência, Extrema-Unção, Ordem e Matrimonio, os quais conferem a graça; mas não sem sacrilégio se fará a reiteração do Batismo, da Confirmação e da Ordem. Da mesma forma aceito e admito os ritos da Igreja Católica recebidos e aprovados para a administração solene de todos os supracitados sacramentos. Abraço e recebo tudo o que foi definido e declarado no Concílio Tridentino sobre o pecado original e a justificação.

997. Confesso outrossim que na Missa se oferece a Deus um sacrifício verdadeiro, próprio e propiciatório pelos vivos e defuntos, e que no santo sacramento da Eucaristia estão verdadeira, real e substancialmente o Corpo e o Sangue com a alma e a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, operando-se a conversão de toda a substância do pão no corpo, e de toda a substância do vinho no sangue; conversão esta chamada pela Igreja de transubstanciação. Confesso também que sob uma só espécie se recebe o Cristo todo inteiro e como verdadeiro sacramento.

998. Sustento sempre que há um purgatório, e que as almas aí retidas podem ser socorridas pelos sufrágios dos fiéis; que os Santos, que reinam com Cristo, também devem ser invocados; que eles oferecem suas orações por nós, e que suas relíquias devem ser veneradas. Firmemente declaro que se devem ter e conservar as imagens de Cristo, da sempre Virgem Mãe de Deus, como também as dos outros Santos, e a eles se deve honra e veneração. Sustento que o poder de conceder indulgências foi deixado por Cristo à Igreja, e que o seu uso é muito salutar para os fiéis cristãos.

999. Reconheço a Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, como Mestra e Mãe de todas as Igrejas. Prometo e Juro prestar verdadeira obediência ao Romano Pontífice, Sucessor de S. Pedro, príncipe dos Apóstolos e Vigário de Jesus Cristo.

1000. Da mesma forma aceito e confesso indubitavelmente tudo o mais que foi determinado, definido e declarado pelos sagrados cânones, pelos Concílios Ecumênicos, especialmente pelo santo Concílio Tridentino (e pelo Concílio Ecumênico do Vaticano, principalmente no que se refere ao Primado do Romano Pontífice e ao Magistério infalível). Condeno ao mesmo tempo, rejeito e anatematizo as doutrinas contrárias e todas as heresias condenadas, rejeitadas e anatematizadas pela Igreja. Eu mesmo, N., prometo e juro com o auxílio de Deus conservar e professar íntegra e imaculada até ao fim de minha vida esta verdadeira fé católica, fora da qual não pode haver salvação, e que agora livremente professo. E quanto em mim estiver, cuidarei que seja mantida, ensinada e pregada a meus súditos ou àqueles, cujo cuidado por ofício me foi confiado. Que para isto me ajudem Deus e estes santos Evangelhos!

 

 

 

 

 

 

DECRETO
APOSTOLICAM ACTUOSITATEM
SOBRE O APOSTOLADO DOS LEIGOS

 

PROÉMIO

Importância e actualidade do apostolado dos leigos na vida da Igreja

1. O sagrado Concílio, desejando tornar mais intensa a actividade apostólica do Povo de Deus(1), volta-se com muito empenho para os cristãos leigos, cujas funções próprias e indispensáveis na missão da Igreja já em outros lugares recordou (2). Com efeito, o apostolado dos leigos, que deriva da própria vocação cristã, jamais poderá faltar na Igreja. A mesma Sagrada Escritura demonstra abundantemente como foi espontânea e frutuosa esta actividade no começo da Igreja (cfr. Act. 11, 19-21: 18, 26; Rom. 16, 1-16; Fil. 4, 3).

Os nossos tempos, porém, não exigem um menor zelo dos leigos; mais ainda, as condições actuais exigem deles absolutamente um apostolado cada vez mais intenso e mais universal. Com efeito, o aumento crescente da população, o progresso da ciência e da técnica, as relações mais estreitas entre os homens, não só dilataram imenso os campos do apostolado dos leigos, em grande parte acessíveis só a eles, mas também suscitaram novos problemas que reclamam a sua atenção interessada e o seu esforço. Este apostolado torna-se tanto mais urgente quanto a autonomia de muitos sectores da vida humana, como é justo, aumentou, por vezes com um certo afastamento da ordem ética e religiosa e com grave perigo para a vida cristã. Além disso, em muitas regiões onde os sacerdotes são demasiado poucos ou, como acontece por vezes, são privados da liberdade de ministério, a Igreja dificilmente poderia estar presente e activa sem o trabalho dós leigos.

Sinal desta multíplice e urgente necessidade é a evidente actuação do Espírito Santo que hoje torna os leigos cada vez mais conscientes da própria responsabilidade e por toda a parte os anima ao serviço de Cristo e da Igreja (3).

No presente Decreto, o Concílio entende ilustrar a natureza, a índole e a variedade do apostolado dos leigos, bem como enunciar os princípios fundamentais e dar as orientações pastorais para o seu mais eficaz exercício; tudo isto deverá servir de norma na revisão do Direito canónico na parte que diz respeito ao apostolado dos leigos.

CAPÍTULO I

A VOCAÇÃO DOS LEIGOS AO APOSTOLADO

Participação dos leigos na missão da Igreja

2. A Igreja nasceu para tornar todos os homens participantes da redenção salvadora (1) e, por eles, ordenar efectivamente a Cristo o universo inteiro, dilatando pelo mundo o seu reino para glória de Deus Pai. Toda a actividade do Corpo místico que a este fim se oriente, chama-se apostolado. A Igreja exerce-o de diversas maneiras, por meio de todos os seus membros, já que a vocação cristã é também, por sua própria natureza, vocação ao apostolado. Do mesmo modo que num corpo vivo nenhum membro tem um papel meramente passivo, mas antes, juntamente com a vida do corpo, também participa na sua actividade, assim também no Corpo de Cristo, que é a Igreja, todo o corpo «cresce segundo a operação própria de cada um dos seus membros» (Ef. 4, 16). Mais ainda: é tanta neste corpo a conexão e coesão dos membros (cfr. Ef. 4, 16), que se deve dizer que não aproveita nem à Igreja nem a si mesmo aquele membro que não trabalhar para o crescimento do corpo, segundo a própria capacidade.

Existe na Igreja diversidade de funções, mas unidade de missão. Aos Apóstolos e seus sucessores, confiou Cristo a missão de ensinar, santificar e governar em seu nome e com o seu poder. Mas os leigos, dado que são participantes do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm um papel próprio a desempenhar na missão do inteiro Povo de Deus, na Igreja e no mundo (2). Exercem, com efeito, apostolado com a sua acção para evangelizar e santificar os homens e para impregnar e aperfeiçoar a ordem temporal com o espírito do Evangelho; deste modo, a sua actividade nesta ordem dá claro testemunho de Cristo e contribui para a salvação dos homens. E sendo próprio do estado dos leigos viver no meio do mundo e das ocupações seculares, eles são chamados por Deus para, cheios de fervor cristão, exercerem como fermento o seu apostolado no meio do mundo.

Fundamentos do apostolado dos leigos

3. O dever e o direito ao apostolado advêm aos leigos da sua mesma união com Cristo cabeça. Com efeito, inseridos pelo Baptismo no Corpo místico de Cristo, e robustecidos pela Confirmação com a força do Espírito Santo, é pelo Senhor mesmo que são destinados ao apostolado. São consagrados em ordem a um sacerdócio real e um povo santo (cfr. 1 Ped. 2, 4-10) para que todas as suas actividades sejam oblações espirituais e por toda a terra dêem testemunho de Cristo. E os sacramentos, sobretudo a sagrada Eucaristia, comunicam e alimentam neles aquele amor que é a alma de todo o apostolado (3).

O apostolado exercita-se na fé, na esperança e na caridade, virtudes que o Espírito Santo derrama no coração de todos os membros da Igreja. Mais o preceito do amor, que é o maior mandamento do Senhor, estimula todos os fiéis a que procurem a glória de Deus, pelo advento do Seu reino, e a vida eterna para todos os homens, de modo que eles conheçam o único Deus verdadeiro e Jesus Cristo, seu enviado (cfr. Jo. 17, 3).

A todos os fiéis incumbe, portanto, o glorioso encargo de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens em toda a terra.

O Espírito Santo - que opera a santificação do Povo de Deus por meio do ministério e dos sacramentos - concede também aos fiéis, para exercerem este apostolado, dons particulares (cfr. 1 Cor. 12, 7), «distribuindo-os por cada um conforme lhe apraz» (1 Cor. 12, 11), a fim de que «cada um ponha ao serviço dos outros a graça que recebeu» e todos actuem, «como bons administradores da multiforme graça de Deus» (1 Ped. 4, 10), para a edificação, no amor, do corpo todo (cfr. Ef. 4, 1). A recepção destes carismas, mesmo dos mais simples, confere a cada um dos fiéis o direito e o dever de os actuar na Igreja e no mundo, para bem dos homens e edificação da Igreja, na liberdade do Espírito Santo, que :(sopra onde quer» (Jo. 3, 8) e, simultâneamente, em comunhão com os outros irmãos em Cristo, sobretudo com os próprios pastores; a estes compete julgar da sua autenticidade e exercício ordenado, não de modo a apagarem o Espírito, mas para que tudo apreciem e retenham o que é bom (cfr. 1 Tess. 5, 12.19.21)(4).

A espiritualidade dos leigos em ordem ao apostolado

4. A fonte e origem de todo o apostolado da Igreja é Cristo, enviado pelo Pai. Sendo assim, é evidente que a fecundidade do apostolado dos leigos depende da sua união vital com Cristo, segundo as palavras do Senhor: ,aquele que permanece em mim e em quem eu permaneço, esse produz muito fruto; pois, sem mim, nada podeis fazer» (Jo. 15, 5). Esta vida de íntima união com Cristo na Igreja é alimentada pelos auxílios espirituais comuns a todos os fiéis e, de modo especial, pela participação activa na sagrada Liturgia(5); e os leigos devem servir-se deles de tal modo que, desempenhando correctamente as diversas tarefas terrenas nas condições ordinárias da existência, não separem da própria vida a união com Cristo, mas antes, realizando a própria actividade segundo a vontade de Deus, nela cresçam. É por este caminho que os leigos devem avançar na santidade com entusiasmo e alegria, esforçando-se por superar as dificuldades com prudência e paciência (6). Nem os cuidados familiares nem outras ocupações profanas devem ser alheias à vida espiritual, conforme aquele ensinamento do Apóstolo: tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, tudo seja em nome do Senhor Jesus Cristo, dando por Ele graças a Deus Pai» (Col. 3, 17).

Esta vida exige o exercício constante da fé, da esperança e da caridade.

Só com a luz da fé e a meditação da palavra de Deus pode alguém reconhecer sempre e em toda a parte a Deus no qual «vivemos, nos inovemos e existimos» (Act. 17, 28), procurar em todas as circunstâncias a Sua vontade, ver Cristo em todos os homens, quer chegados quer estranhos, julgar rectamente do verdadeiro sentido e valor das realidades temporais, em si mesmas e em ordem ao fim do homem.

Aqueles que possuem tal fé, vivem na esperança da manifestação dos filhos de Deus, lembrados da cruz e da ressurreição do Senhor. Na peregrinação que é a presente vida, escondidos com Cristo em Deus e libertados da escravidão das riquezas, ao mesmo tempo que tendem para aqueles bens que permanecem eternamente, dedicam-se generosa e inteiramente a dilatar o reino de Deus e a informar e actuar com o espírito cristão a ordem temporal. No meio das adversidades desta vida, encontram força na esperança, sabendo que «os sofrimentos presentes não têm comparação com a glória futura que em nós se manifestará» (Rom. 8, 18).

Impelidos pela caridade que vem de Deus, praticam o bem com relação a todos, sobretudo para com os irmãos na fé (cfr. Gál. 6, 10), despojando-se «de toda a malícia e engano, hipocrisias, invejas e toda a espécie de maledicências» (1 Ped. 2, 1) e assim atraem a Cristo todos os homens. O amor de Deus que «foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado» (Rom. 5, 5), toma os leigos capazes de exprimir em verdade, na própria vida, o espírito das Bem-aventuranças. Seguindo a Cristo pobre, nem se deixam abater com a falta dos bens temporais nem se exaltam com a sua abundância; imitando a Cristo humilde, não são cobiçosos da glória vã (cfr. Gál. 5, 26), mas procuram mais agradar a Deus que aos homens, sempre dispostos a deixar tudo por Cristo (cfr. Lc. 14, 26) e a sofrer perseguição pela justiça (cfr. Mt. 5, 10), lembrados da palavra do Senhor: «se alguém quiser seguir-me, abnegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me» (Mt. 16, 24). Finalmente, fomentando entre si a amizade cristã, prestam-se mútuamente ajuda em todas as necessidades.

Esta espiritualidade dos leigos deverá assumir características especiais, conforme o estado de matrimónio e familiar, de celibato ou viuvez, situação de enfermidade, actividade profissional e social. Não deixem, por isso, de cultivar assiduamente as qualidades e dotes condizentes a essas situações, e utilizar os dons por cada um recebidos do Espírito Santo.

Além disso, aqueles leigos que, seguindo a própria vocação, se alistaram em alguma das associações ou institutos aprovados pela Igreja, devem de igual modo esforçar-se por assimilar as características da espiritualidade que lhes é própria.

Tenham também em muito apreço a competência profissional, o sentido de família e o sentido cívico e as virtudes próprias da convivência social, como a honradez, o espírito de justiça, a sinceridade, a amabilidade, a fortaleza de ânimo, sem as quais também se não pode dar uma vida cristã autêntica.

O modelo perfeito desta vida espiritual e apostólica é a bem-aventurada Virgem Maria, rainha dos Apóstolos: levando, na terra, uma vida semelhante à a todo o momento se mantinha unida a seu Filho e de modo singular cooperou na obra do Salvador; agora, elevada ao céu, «cuida com amor materno dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, peregrinam ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada» (7). Prestem-lhe todos um culto cheio de devoção e confiem à sua solicitude materna a própria vida e apostolado.

CAPÍTULO II

OS FINS DO APOSTOLADO DOS LEIGOS

Introdução: a obra de Cristo e da Igreja

5. A obra redentora de Cristo, que por natureza visa salvar os homens, compreende também a restauração de toda a ordem temporal. Daí que a missão da Igreja consiste não só em levar aos homens a mensagem e a graça de Cristo, mas também em penetrar e actuar com o espírito do Evangelho as realidades temporais. Por este motivo, os leigos, realizando esta missão da Igreja, exercem o seu apostolado tanto na Igreja como no mundo, tanto na ordem espiritual como na temporal. Estas ordens, embora distintas, estão de tal modo unidas no único desígnio divino que o próprio Deus pretende reintegrar, em Cristo, o universo inteiro, numa nova criatura, dum modo incoativo na terra, plenamente no último dia. O leigo, que é simultâneamente fiel e cidadão, deve sempre guiar-se, em ambas as ordens, por uma única consciência, a cristã.

O apostolado para a evangelização e santificação do mundo

6. A missão da Igreja tem como fim a salvação dos homens, a alcançar pela fé em Cristo e pela sua graça. Por este motivo, o apostolado da Igreja e de todos os seus membros ordena-se, antes de mais, a manifestar ao mundo, por palavras e obras, a mensagem de Cristo, e a comunicar a sua graça. Isto realiza-se sobretudo por meio do ministério da palavra e dos sacramentos, especialmente confiado ao clero, no qual também os leigos têm grande papel a desempenhar, para se tornarem «cooperadores da verdade» (3 Jo. 8). É sobretudo nesta ordem que o apostolado dos leigos e o ministério pastoral se completam mùtuamente.

Inúmeras oportunidades se oferecem aos leigos para exercerem o apostolado de evangelização e santificação. O próprio testemunho da vida cristã e as obras, feitas com espírito sobrenatural, têm eficácia para atrair os homens à fé e a Deus; diz o Senhor: «Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que vejam as vossas boas obras e dêem glória ao vosso Pai que está nos céus» (Mt. 5, 16).

Este apostolado, contudo, não consiste apenas no testemunho da vida; o verdadeiro apóstolo busca ocasiões de anunciar Cristo por palavra, quer aos não crentes para os levar à fé, quer aos fiéis, para os instruir, confirmar e animar a uma vida fervorosa; «com efeito, o amor de Cristo estimula-nos» (2 Cor. 5, 14); e devem encontrar eco no coração de todos aquelas palavras do Apóstolo: «ai de mim, se não prego o Evangelho» (1 Cor. 9,16) (1).

E dado que no nosso tempo surgem novos problemas e se difundem gravíssimos erros que ameaçam subverter a religião, a ordem moral e a própria sociedade humana, este sagrado Concílio exorta ardentemente os leigos a que, na medida da própria capacidade e conhecimentos, desempenhem com mais diligência a parte que lhes cabe na elucidação, defesa e recta aplicação dos princípios cristãos aos problemas d6 nosso tempo, segundo a mente da Igreja.

Instauração cristã da ordem temporal

7. A vontade de Deus com respeito ao mundo é que os homens, em boa harmonia, edifiquem a ordem temporal e a aperfeiçoem constantemente.

Todas as realidades que constituem a ordem temporal-os bens da vida e da família, a cultura, os bens económicos, as artes e profissões, as instituições políticas, as relações internacionais e outras semelhantes, bem como a sua evolução e progresso -não só são meios para o fim último do homem, mas possuem valor próprio, que lhes vem de Deus, quer consideradas em si mesmas, quer como partes da ordem temporal total: «e viu Deus todas as coisas que fizera, e eram todas muito boas» (Gén. 1, 31). Esta bondade natural das coisas adquire uma dignidade especial pela sua relação com a pessoa humana, para cujo serviço foram criadas. Finalmente, aprouve a Deus reunir todas as coisas em Cristo, quer as naturais quer as sobrenaturais, «de modo que em todas Ele tenha o primado» (Col. 1, 18). Mas este destino, não só não priva a ordem temporal da sua autonomia, dos seus fins próprios, das suas leis, dos seus recursos, do seu valor para bem dos homens, mas antes a aperfeiçoa na sua consistência e dignidade próprias, ao mesmo tempo que a ajusta à vocação integral do homem na terra.

O uso das coisas temporais foi, no decurso da história, manchado com graves abusos. É que os homens, atingidos pelo pecado original, caíram muitas vezes em muitos erros acerca do verdadeiro Deus, .da natureza do homem e dos princípios da lei moral. Daí a corrupção dos costumes e das instituições humanas, daí a pessoa humana tantas vezes conculcada. Também em nossos dias, não poucos, confiando em excesso no progresso das ciências naturais e da técnica, caem numa espécie de idolatria das coisas materiais, das quais em vez de senhores se tornam escravos.

Toda a Igreja deve trabalhar por tornar os homens capazes de edificar rectamente a ordem temporal e de a ordenar, por Cristo, para Deus. Aos pastores compete propor claramente os princípios relativos ao fim da criação e ao uso do mundo e proporcionar os auxílios morais e espirituais para que a ordem temporal se edifique em Cristo.

Quanto aos leigos, devem eles assumir como encargo próprio seu essa edificação da ordem temporal e agir nela de modo directo e definido, guiados pela luz do Evangelho e a mente da Igreja e movidos pela caridade cristã; enquanto cidadãos, cooperar com os demais com a sua competência específica e a própria responsabilidade; buscando sempre e em todas as coisas a justiça do reino de Deus. A ordem temporal deve ser construída de tal modo que, respeitadas integralmente as suas leis próprias, se torne, para além disso, conforme aos princípios da vida cristã, de modo adaptado às diferentes condições de lugares, tempos e povos. Entre as actividades deste apostolado sobressai a acção social dos cristãos, a qual o sagrado Concílio deseja que hoje se estenda a todos os domínios temporais, sem exceptuar o da cultura (2).

A acção caritativa como distintivo do apostolado cristão

8. Toda a actividade apostólica deve fluir e receber força da caridade; algumas obras, porém, prestam-se, por sua própria natureza, a tornarem-se viva expressão dessa caridade. Cristo quis que elas fossem sinais da sua missão messiânica (cfr. Mt. 11, 4-5).

O maior mandamento da lei é amar a Deus de todo o coração, e ao próximo como a si mesmo (cfr. Mt. 22, 37-40). Cristo fez deste mandamento do amor para com o próximo o seu mandamento, e enriqueceu-o com novo significado, identificando-se aos irmãos como objecto da caridade, dizendo: «sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes» (Mt. 25, 40). Com efeito, assumindo a natureza humana, Ele uniu a si como família, por uma certa solidariedade sobrenatural, todos os homens e fez da caridade o sinal dos seus discípulos, com estas palavras: «nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros» (Jo. 13, 35).

A santa Igreja, assim como nos seus primeiros tempos, juntando a «ágape» à Ceia eucarística, se mostrava toda unida à volta de Cristo pelo vínculo da caridade, assim em todos os tempos se pode reconhecer por este sinal do amor. E alegrando-se com as realizações alheias, ela reserva para si, como dever e direito próprios, que não pode alinear, as obras de caridade. Por isso, a misericórdia para com os pobres e enfermos e as chamadas obras de caridade e de mútuo auxílio para socorrer as múltiplas necessidades humanas são pela Igreja honradas de modo especial (3).

Estas actividades e obras tornaram-se muito mais urgentes e universais no nosso tempo, em que os meios de comunicação são mais rápidos, em que quase se venceu a distância entre os homens e os habitantes de toda a terra se tornaram membros em certo modo duma só família. A actividade caritativa, hoje, pode e deve atingir as necessidades de todos os homens. Onde quer que se encontrem homens a quem faltam sustento, vestuário, casa, remédios, trabalho, instrução, meios necessários para levar uma vida verdadeiramente humana, afligidos pelas desgraças ou pela doença, sofrendo o exílio ou a prisão, aí os deve ir buscar e encontrar a caridade cristã, consolar com muita solicitude e ajudar com os auxílios prestados. Esta obrigação incumbe antes de mais aos homens e povos que disfrutam de condição próspera (4).

Para que este exercício da caridade seja e apareça acima de toda a suspeita, considere-se no próximo a imagem de Deus, para o qual foi criado, veja-se nele a Cristo, a quem realmente se oferece tudo o que ao indigente se dá; atenda-se com grande delicadeza à liberdade e dignidade da pessoa que recebe o auxílio; não se deixe manchar a pureza de intenção com qualquer busca do próprio interesse ou desejo de domínios (5); satisfaçam-se antes de mais as exigências da justiça, nem se ofereça como dom da caridade aquilo que já é devido a título de justiça; suprimam-se as causas dos males, e não apenas os seus efeitos; e de tal modo se preste a ajuda que os que a recebem se libertem a pouco e pouco da dependência alheia e se bastem a si mesmos.

Tenham, por isso, os leigos em grande apreço e ajudem quanto possam as obras caritativas e as iniciativas de assistência social, quer privadas quer públicas, e também internacionais, que levam auxílio eficaz aos indivíduos e aos povos necessitados, cooperando neste ponto com todos os homens de boa vontade (6).

CAPÍTULO III

OS VÁRIOS CAMPOS DO APOSTOLADO

Introdução: vários campos do apostolado dos leigos.
A Igreja

9. Os leigos exercem o seu apostolado multiforme tanto na Igreja como no mundo. Em ambos os planos se abrem vários campos de actividade apostólica de que queremos aqui lembrar os principais. São: as comunidades eclesiais, a família, a juventude, o meio social, as ordens nacional e internacional. E como hoje a mulher tem cada vez mais parte activa em toda a vida social, é da maior importância que ela tome uma participação mais ampla também nos vários campos do apostolado da Igreja.

10. Porque participam no múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm os leigos parte activa na vida e acção da Igreja. A sua acção dentro das comunidades eclesiais é tão necessária que, sem ela, o próprio apostolado dos pastores não pode conseguir, a maior parte das vezes, todo o seu efeito. Porque os leigos com verdadeira mentalidade apostólica, à imagem daqueles homens e mulheres que ajudavam Paulo na propagação do Evangelho (cfr. Act. 18, 18, 20; Rom. 16, 3), suprem o que falta a seus irmãos e revigoram o espírito dos pastores e dos outros membros do povo fiel (cfr. 1 Cor. 16, 17-18). Pois eles, fortalecidos pela participação activa na vida litúrgica da comunidade, empenham-se nas obras apostólicas da mesma. Conduzem à Igreja os homens que porventura andem longe, cooperam intensamente na comunicação da palavra de Deus, sobretudo pela actividade catequética, e tornam mais eficaz, com o contributo da sua competência, a cura de almas e até a administração dos bens da Igreja.

A paróquia dá-nos um exemplo claro de apostolado comunitário porque congrega numa unidade toda a diversidade humana que aí se encontra e a insere na universalidade da Igreja (1). Acostumem-se os leigos a trabalhar na paróquia intimamente unidos aos seus sacerdotes (2), a trazer para a comunidade eclesial os próprios problemas e os do mundo e as questões que dizem respeito à salvação dos homens, para que se examinem e resolvam no confronto de vários pareceres. Acostumem-se, por fim, a prestar auxílio a toda a iniciativa apostólica e missionária da sua comunidade eclesial na medida das próprias forças.

Cultivem o sentido de diocese, de que a paróquia é como que uma célula, e estejam sempre prontos, à voz do seu pastor, a somar as suas forças às iniciativas diocesanas. Mas, para responder às necessidades das cidades e das regiões rurais (3), não confinem a sua cooperação dentro dos limites da paróquia ou da diocese, mas esforcem-se por estendê-la aos campos interparoquial, interdiocesano, nacional ou internacional. Tanto mais que a crescente migração de povos, o incremento de relações mútuas e a facilidade de comunicações já não permitem que parte alguma da sociedade permaneça fechada em si. Assim devem interessar-se pelas necessidades do Povo de Deus disperso por toda a terra. Em primeiro lugar, façam suas as obras missionárias, prestando auxílios materiais ou mesmo pessoais. Pois é dever e honra dos cristãos restituir a Deus parte dos bens que d'Ele recebem.

A família

11. O criador de todas as coisas constituiu o vínculo conjugal princípio e fundamento da sociedade humana e fê-lo, por sua graça, sacramento grande em Cristo e na Igreja (cfr. Ef. 5, 32). Por isso, o apostolado conjugal e familiar tem singular importância tanto para a Igreja como para a sociedade civil.

Os esposos cristãos são cooperadores da graça e testemunhas da fé um para com o outro, para com os filhos e demais familiares. Eles são os primeiros que anunciam aos filhos a fé e os educam. Formam-nos, pela palavra e pelo exemplo, para a vida cristã e apostólica. Ajudam-nos com prudência a escolher a sua vocação e fomentam com todo o cuidado a vocação de consagração porventura neles descoberta.

Foi sempre dever dos esposos e hoje é a maior incumbência do seu apostolado: manifestar e demonstrar, pela sua vida, a indissolubilidade e a santidade do vínculo matrimonial; afirmar vigorosamente o direito e o dever próprio dos pais e tutores de educar cristãmente os filhos; defender a dignidade e legítima autonomia da família. Cooperem, pois, eles e os outros cristãos, com os homens de boa vontade para que estes direitos sejam integralmente assegurados na legislação civil. No governo da sociedade, tenham-se em conta as necessidades familiares quanto à habitação, educação dos filhos, condições de trabalho, seguros sociais e impostos. Ao regulamentar a migração salve-se sempre a convivência doméstica (4).

Foi a própria família que recebeu de Deus a missão de ser a primeira célula vital da sociedade. Cumprirá essa missão se se mostrar, pela piedade mútua dos seus membros e pela oração feita a Deus em comum, como que o santuário doméstico da Igreja; se toda a família se inserir no culto litúrgico da Igreja e, finalmente, se a família exercer uma hospitalidade actuante e promover a justiça e outras boas obras em serviço de todos os irmãos quê sofrem necessidade. Podem enumerar-se, entre as várias obras de apostolado familiar, as seguintes: adoptar por filhos crianças abandonadas, receber com benevolência estrangeiros, coadjuvar no regime das escolas, auxiliar os adolescentes com conselhos e meios materiais, ajudar os noivos a prepararem-se melhor para o matrimónio, colaborar na catequese, auxiliar os esposos e as famílias que se encontram em crise material ou moral, proporcionar aos velhos não só o necessário, mas também fazê-los participar, com equidade, dos frutos do progresso económico.

As famílias cristãs, pela coerência de toda a sua vida com o Evangelho e pelo exemplo que mostram do matrimónio cristão, oferecem ao mundo um preciosíssimo testemunho de Cristo, sempre e em toda a parte, mas sobretudo naquelas regiões em que se lançam as primeiras sementes do Evangelho ou em que a Igreja está nos começos ou atravessa alguma crise grave (5).

Pode ser oportuno que as famílias se, unam em certas associações para mais fàcilmente poderem atingir os fins do seu apostolado (6).

Os jovens

12. Os jovens exercem na sociedade de hoje um influxo da maior importância (7). As condições em que vivem, os hábitos mentais e até as relações com a própria família estão profundamente mudadas. É frequente passarem com demasiada rapidez a uma condição social e económica nova. Por um lado, cresce cada vez mais a sua importância social e até política; por outro, parecem incapazes de assumir convenientemente as novas tarefas.

Este acréscimo de influência na sociedade exige deles uma actividade apostólica correspondente. Aliás, a sua própria índole natural os dispõe para ela. Com o amadurecimento da consciência da própria personalidade, estimulados pelo ardor da vida e pela actividade transbordante, assumem a própria responsabilidade e desejam tomar a parte activa que lhes compete na vida social e cultural. Se este zelo é penetrado pelo espírito de Cristo e animado pela obediência e pelo amor para com os pastores da Igreja, podemos esperar dele frutos muito abundantes. Eles mesmos devem ser os primeiros e imediatos apóstolos da juventude e exercer por si mesmos o apostolado entre eles, tendo em conta o meio social em que vivem (8).

Os adultos procurem estabelecer com os jovens um diálogo amigo que permita a ambas as partes, superando a distância de idades, conhecerem-se mùtuamente e comunicarem uns aos outros as próprias riquezas. Estimulem os adultos a juventude ao apostolado, primeiro pelo exemplo e, dada a ocasião, por conselhos prudentes e ajuda eficaz. E os jovens mostrem para com os mais velhos respeito e confiança. E, ainda que por natureza são inclinados a novidades, tenham, contudo, na devida estima aquelas tradições que são válidas.

Também as crianças têm a sua própria actuação apostólica. Segunda as suas forças, são em verdade testemunhos vivos de Cristo entre os companheiros.

O apostolado social

13. O apostolado no meio social, isto é, o empenho em informar de espírito cristão a mentalidade e os costumes, as leis e estruturas da comunidade em que se vive, são incumbência e encargo de tal modo próprios dos leigos que nunca poderão ser plenamente desempenhados por outros. Neste campo, podem os leigos exercer um apostolado de semelhante para com semelhante. Aí completam o testemunho da vida pelo testemunho da palavra (9). Nesse campo do trabalho, da profissão, do estudo, da residência, do tempo livre ou da associação, são eles os mais aptos para ajudar os seus irmãos.

Os leigos realizam esta missão da Igreja no mundo, antes de tudo, por aquela coerência da vida com a fé, pela qual se tornam luz do mundo; pela honestidade nos negócios, com a qual a todos atraem ao amor da verdade e do bem e, finalmente, a Cristo e à Igreja; pela caridade fraterna que, fazendo-os participar das condições de vida, dos trabalhos, dos sofrimentos e aspirações de seus irmãos, prepara insensivelmente todos os corações para a acção da graça salutar; por aquela plena consciência da participação que devem ter na construção da sociedade, a qual os leva a esforçarem-se por desempenhar com magnanimidade cristã a actividade doméstica, social e profissional. Assim, o seu modo de agir penetra pouco a pouco no meio de vida e de trabalho.

Este apostolado deve abranger todos aqueles que aí se encontram e não excluir nenhum bem espiritual ou temporal que possam fazer. Mas os verdadeiros apóstolos não se contentam só com esta acção e esforçam-se por anunciar Cristo ao próximo também por meio da palavra. E que muitos homens só por meio de seus companheiros leigos podem ouvir o Evangelho e conhecer Cristo.

O apostolado na ordem nacional e internacional

14. Um imenso campo de apostolado se abre na ordem nacional e internacional, em que são sobretudo os leigos os administradores da sabedoria cristã. Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem comum na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião de modo a que o poder civil se exerça com justiça e as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum. Os católicos peritos nos negócios públicos e firmes, como devem ser, na fé e doutrina cristã, não recusem participar neles uma vez que, exercendo-os dignamente, podem atender ao bem comum e, ao mesmo tempo, abrir caminho ao . Evangelho.

Empenhem-se os católicos em cooperar. com todos os homens de boa vontade para promover tudo o que é verdadeiro, tudo o que é justo, tudo o que é santo, tudo o que é digno de ser amado (cfr. Fil. 4,8). Dialoguem com eles, indo ao seu encontro com prudência e bondade. E investiguem em conjunto o modo de organizar as instituições sociais e públicas segundo o espírito do Evangelho.

Entre os sinais do nosso tempo, é digno de especial menção aquele crescente e inelutável sentido de solidariedade entre todos os povos que o apostolado dos leigos tem por encargo promover activamente e converter em sincero e verdadeiro afecto fraternal. Além disso, devem os leigos ter consciência da realidade internacional e das questões e soluções, doutrinais ou práticas, que nela se originam, sobretudo quanto aos povos em desenvolvimento (10).

Lembrem-se todos aqueles que trabalham em nações estrangeiras ou lhes prestam auxílio, que as relações entre os povos devem ser um verdadeiro convívio fraterno em que ambas as partes simultânamente dão e recebem. Aqueles, porém, que viajam ou por causa de obras internacionais, ou por negócios ou por motivo de descanso, lembrem-se que são também, em toda a parte, pregoeiros itinerantes de Cristo e procedam como tais.

CAPÍTULO IV

 AS VÁRIAS FORMAS DO APOSTOLADO

Introdução: apostolado individual ou associado

15. Os leigos podem exercer a sua acção apostólica quer como indivíduos quer unidos em diversas comunidades e associações.

Necessidade e natureza do apostolado individual

16. O apostolado individual que deriva com abundância da fonte de uma vida verdadeiramente cristã (cfr. Jo. 4,14), é origem e condição de todo o apostolado dos leigos, mesmo do associado, nem nada o pode substituir.

A este apostolado, sempre e em toda aparte proveitoso e em certas circunstâncias o único conveniente e possível, são chamados e, por isso, obrigados todos os leigos, de qualquer condição; ainda que não se lhes proporcione ocasião ou possibilidade de cooperar nas associações.

São muitas as formas de apostolado pelas quais os leigos edificam a Igreja, santificam o mundo e o vivificam em Cristo.

A forma peculiar do apostolado individual, e sinal muito acomodado também aos nossos tempos, porque manifesta Cristo vivo nos seus fiéis, é o testemunho de toda a vida laical que flui da fé, esperança e caridade. Porém, pelo apostolado da palavra, em certas circunstâncias absolutamente necessário, os leigos anunciam a Cristo, expõem a sua doutrina, difundem-na segundo a sua própria condição e capacidade, e professam-na com fidelidade.

Além disso, como cidadãos deste mundo, os leigos, ao cooperarem na construção e governo da ordem temporal, devem, na vida familiar, profissional, cultural e social, buscar, à luz da fé, normas de acção mais elevadas e manifestá-las aos outros oportunamente, conscientes de que assim se tornam cooperadores de Deus criador, redentor e santificador, e Lhe dão glória.

Finalmente, vivifiquem os leigos a sua vida com a caridade e mostrem-no por obras na medida do possível.

Lembrem-se todos que pelo culto público e pela oração, pela penitencia, pelos trabalhos e livre aceitação das agruras da vida; pelas quais se conformam a Cristo paciente (cfr. 2 Cor. 4,10; Col. 1,24), podem atingir todos os homens e contribuir para a salvação de todo o mundo.

O apostolado individual em circunstâncias especiais

17. Este apostolado individual é urgentemente necessário naquelas regiões em que a liberdade da Igreja é gravemente impedida. Nestas circunstâncias dificílimas, os leigos, suprindo, na medida do possível, o sacerdote, põem em risco a própria liberdade e, às vezes, a vida. Ensinam aos que os cercam a doutrina cristã, formam-nos na vida religiosa e na mentalidade católica, induzem-nos a frequência dos sacramentos e fomentam a piedade, sobretudo a eucarística (1). O sagrado Concílio dá graças dc fundo do coração a Deus que não deixa de suscitar, também em nossos dias, leigos de fortaleza heróica no meio das perseguições, e abraça-os com afecto paterno e ânimo agradecido.

O apostolado individual tem especial campo de acção nas regiões onde os católicos são poucos e dispersos. Os leigos, que exercem nelas só apostolado individual pelas causas acima mencionadas ou por razões especiais, mesmo nascidas da própria actividade profissional, reunam-se oportunamente para dialogar em grupos menores, sem forma estrita de instituição ou organização, de modo que sempre se manifeste aos outros o sinal da comunidade da Igreja como verdadeiro testemunho de amor. Deste modo, pela amizade e pela comunicação de experiências e com a , ajuda espiritual mútua, fortalecem-se para superar as dificuldades da vida e da acção demasiado isolada e produzir mais abundantes frutos de apostolado.

Importância das formas associadas

18. Os fiéis são chamados a exercer o apostolado individual nas diversas condições da sua vida. Lembrem-se, contudo, que o homem é, por natureza, social, e que aprouve ao Senhor unir um Povo de Deus (cfr. 1 Ped. 2, 5-10) e num corpo (cfr. 1 Cor. 12,12) os que crêem em Cristo. Portanto, o apostolado em associação responde com fidelidade à exigência humana e cristã dos fiéis e é, ao mesmo tempo, sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo que disse: «Onde estão dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles (Mt. 18,20).

Os fiéis exerçam, por conseguinte, o seu apostolado trabalhando para um só fim (2). Sejam apóstolos assim nas suas comunidades familiares como nas paróquias e dioceses, as quais exprimem a índole comunitária do apostolado. Exerçam-no também nas associações livres que resolverem formar.

O apostolado em associação é de grande importância também porque, nas comunidades eclesiais e nos vários meios, o apostolado exige com frequência ser realizado mediante a acção comum. As associações criadas para a acção apostólica comum fortalecem os seus membros e formam-nos para o apostolado. Além disso, distribuem ordenadamente e orientam o seu trabalho apostólico, de modo que se podem esperar daí frutos muito mais abundantes do que se agisse cada um por sua conta.

Nas circunstâncias presentes, porém, é absolutamente necessário que se robusteça a forma associada e organizada do apostolado no campo de actividade dos leigos. É que só a estreita união das forças é capaz de conseguir plenamente os fins do apostolado de hoje e de defender com eficácia os seus bens (3). Neste ponto é particularmente importante que o apostolado atinja também a mentalidade comum e as condições sociais daqueles a quem se dirige. Doutro modo, não poderão, muitas vezes, resistir à pressão da opinião pública ou das instituições.

Multiplicidade de formas do apostolado associado

19. Há uma grande variedade de associações de apostolado (4). Umas propõem-se o fim apostólico geral da Igreja. Outras, de modo particular, fins de evangelização e santificação. Outras, ainda, têm como fim animar cristãmente a ordem temporal. Finalmente, algumas dão testemunho de Cristo, de modo especial, pelas obras de misericórdia e de caridade.

Entre estas associações são de considerar, antes de mais, aquelas que fomentam e promovem uma unidade mais íntima entre a vida prática dos membros e a sua fé. As associações não têm em si o seu fim, mas devem servir à missão que a Igreja tem de cumprir para com o mundo. A sua força apostólica depende da conformidade com os fins da Igreja e do testemunho cristão e espírito evangélico de cada um dos membros e de toda a associação.

O dever universal da missão da Igreja, dado o progresso das instituições e, ao mesmo tempo, o impulso do desenvolvimento da sociedade moderna, exige que as iniciativas apostólicas dos católicos aperfeiçoem cada vez mais as formas associadas no campo internacional. As Organizações Católicas Internacionais conseguirão melhor o seu fim se as associações que as formam e os seus membros a elas se unirem mais intimamente.

Respeitada a devida relação com a autoridade eclesiásticas (5), os leigos têm o direito de fundar associações (6), governá-las, e, uma vez fundadas, dar-lhes um nome. Deve-se, contudo, evitar a dispersão de forças que se verifica se se promovem, sem razão suficiente, novas associações e obras, ou se se mantêm, sem utilidade, associações ou métodos obsoletos. Nem sempre será oportuno que formas criadas numa nação sejam trasladadas, sem critério, para outras (7).

A acção católica

20. Há não poucos decénios, em muitas nações, os leigos, cada vez mais consagrados ao apostolado, uniram-se em várias formas de acção e associação que, em união mais estreita com a Hierarquia, se dedicaram e dedicam a fins especificamente apostólicos. Entre estas e outras instituições semelhantes mais antigas, merecem especial menção as que, seguindo embora diferentes métodos de acção, tendo sido justamente recomendadas e fomentadas pelos Sumos Pontífices e por muitos Bispos, receberam deles o nome de Acção Católica e, com muita frequência, foram declaradas como cooperação dos leigos no apostolado hierárquico(8).

Quer tenham o nome de Acção Católica quer outro, estas formas de apostolado que exercem em nossos dias uma valiosa acção apostólica são constituídas pelo conjunto das seguintes características:

a) O fim imediato de tais organizações é o fim apostólico da Igreja, isto é, ordenam-se à evangelização e santificação dos homens e à formação cristã da sua consciência, de modo a poderem imbuir do espírito do evangelho as várias comunidades e os vários meios.

b) Os leigos, cooperando a seu modo com a Hierarquia, contribuem com a sua experiência e assumem a sua responsabilidade no governo destas organizações, no estudo das condições em que a acção pastoral da Igreja se deve exercer e na elaboração e execução dos planos a realizar.

c) Os leigos agem unidos como um corpo orgânico, para que se manifeste com maior evidência a comunidade da Igreja e o apostolado seja mais eficaz.

d) Os leigos, quer se ofereçam espontâneamente quer sejam convidados à acção e directa colaboração com o apostolado hierárquico, trabalham sob a superior orientação da mesma Hierarquia, a qual pode sancionar essa cooperação com um mandato explícito.

As organizações nas quais, a juízo da Hierarquia, se encontram estas características tomadas em conjunto, devem ser consideradas Acção Católica, ainda que, por exigências de lugar ou de povos, assumam formas e nomes diversos.

O sagrado Concílio recomenda insistentemente estas instituições que correspondem, certamente, às necessidades do apostolado da Igreja em muitas nações. E convida os sacerdotes e leigos que nelas trabalham a tornarem cada vez mais realidade as características acima mencionadas e a cooperarem sempre fraternalmente, na Igreja, com as outras formas de apostolado.

Apreço das associações

21. Tenham-se na devida estima todas as associações de apostolado. Mas aquelas que a Hierarquia, segundo as necessidades do tempo e do lugar, louvar, recomendar ou mandar instituir como mais urgentes, devem ser tidas em alto apreço e ser promovidas pelos sacerdotes, religiosos e leigos, segundo a maneira que lhes é própria. Entre elas, porém, devem-se hoje contar sobretudo as associações ou agrupamentos internacionais de católicos.

Leigos que se entregam com título especial ao serviço da Igreja

22. São dignos de especial honra e recomendação na Igreja aqueles leigos, solteiros ou casados, que se dedicam, perpétua ou temporàriamente, com a sua competência profissional, ao serviço das instituições e suas actividades. É de grande alegria para a Igreja que cresça cada vez mais o número de leigos que prestam o seu serviço às associações e obras de apostolado dentro da própria nação, ou no campo internacional ou, sobretudo, nas comunidades católicas das missões e das Igrejas mais recentes.

Recebam os pastores da Igreja estes leigos de bom grado e com ânimo reconhecido e esforcem-se por que a sua condição corresponda, quanto possível, às exigências da justiça, da equidade e da caridade, principalmente no que respeita ao seu honesto sustento e das suas famílias e por que recebam a necessária formação e sintam consolação e estímulo espiritual.

CAPÍTULO V

A ORDEM A GUARDAR NO APOSTOLADO

Introdução: o apostolado hierárquico, necessário na Igreja

23. O apostolado dos leigos, quer ele seja exercido pelos fiéis individualmente quer em associação, deve-se integrar ordenadamente no apostolado de toda a Igreja. Mais ainda, a união com aqueles que o Espírito Santo pôs à frente da Igreja de Deus (cfr. Act. 20, 28) constitui elemento essencial do apostolado cristão. E não é menos necessária a cooperação entre as diversas iniciativas apostólicas, que devem ser convenientemente dirigidas pela Hierarquia.

Com efeito, para promover o espírito de união, que fará brilhar em todo o apostolado da Igreja a caridade fraterna e levará à consecução dos fins comuns evitando as emulações tão perniciosas, requere-se a estima recíproca de todas as formas de apostolado na Igreja, e a sua apta coordenação no respeito pela índole própria de cada uma (1).

Isto é da máxima conveniência, quando uma determinada acção na Igreja requer a harmonia e cooperação apostólica de ambos os cleros, dos religiosos e dos leigos.

Relações com a Hierarquia

24. Compete à Hierarquia fomentar o apostolado dos leigos, fornecer os princípios e os auxílios espirituais, ordenar para bem comum da Igreja o exercício do mesmo apostolado, e vigiar para que se conservem a doutrina e a ordem.

O apostolado dos leigos admite diversos modos de relação com a Hierarquia, segundo as suas várias formas e seus objectivos.

Assim, existem na Igreja muitas iniciativas apostólicas nascidas da livre escolha dos leigos e dirigidas com o seu prudente critério. Em determinadas circunstâncias, a missão da Igreja pode realizar-se melhor por meio de tais iniciativas, e daí o serem com frequência louvadas e recomendadas pela Hierarquia (2). No entanto, nenhuma iniciativa apostólica se pode chamar católica se não tiver a aprovação da legítima autoridade eclesiástica.

Certas formas de apostolado dos leigos são expressamente reconhecidas pela Hierarquia, de diversos modos.

Além disso, a autoridade eclesiástica, tendo em conta as exigências do bem comum da Igreja, pode escolher de entre as várias associações e iniciativas apostólicas com um fim directamente espiritual, algumas em particular, e promovê-las dum modo especial, assumindo sobre elas uma maior responsabilidade. Deste modo, a Hierarquia, ordenando o apostolado de diversas maneiras segundo as circunstâncias, vai unindo mais intimamente ao seu próprio múnus apostólico uma ou outra das suas formas, respeitando, porém, sempre a natureza e a distinção de ambas as partes, e sem com isso se tirar aos leigos a necessária liberdade de acção. Em vários documentos eclesiásticos se dá a este acto da Hierarquia o nome de mandato.

Finalmente, a Hierarquia confia aos leigos certas tarefas mais intimamente ligadas ao múnus pastoral, como exemplo, no ensino da doutrina cristã, nalguns actos litúrgicos e na cura de almas. Em virtude desta missão, os leigos ficam plenamente sujeitos à superior direcção eclesiástica, no respeitante ao desempenho desse encargo.

Quanto às obras e instituições da ordem temporal, pertence à Hierarquia eclesiástica ensinar e interpretar autênticamente os princípios morais que se devem aplicar nos assuntos temporais. Compete-lhe igualmente julgar, depois de bem considerar todas as coisas, e servindo-se do auxílio dos peritos, da conformidade de tais obras e instituições com os princípios morais e determinar o que for necessário para conservar e promover os bens de ordem sobrenatural.

Ajuda que deve prestar o clero ao apostolado dos leigos

25. Tanto os Bispos como os párocos e demais sacerdotes de ambos os cleros, devem ter presente que o direito e dever de exercer o apostolado são comuns a todos os fiéis, clérigos e leigos, e que também estes últimos têm um papel a desempenhar na edificação da Igreja (3). Tratem, pois, fraternalmente com os leigos na Igreja e para a Igreja, e tenham deles cuidado especial nas suas obras apostólicas (4).

Para ajudar os leigos nas suas diversas formas de apostolado, escolham-se diligentemente sacerdotes idóneos e bem formados (5). Os que se consagram a este ministério, por missão recebida da Hierarquia, representam-na na sua acção pastoral. Fomentem, pois, as convenientes relações dos leigos com a mesma, permanecendo sempre fiéis ao espírito e doutrina da Igreja. Dediquem-se a fomentar a vida espiritual e o sentido apostólico das associações católicas que lhes foram confiadas. Assistam com prudente conselho as suas actividades apostólicas e favoreçam as suas iniciativas. Investiguem atentamente por meio do diálogo contínuo com os leigos quais as formas de tornar mais frutuosa a sua acção apostólica; e promovam o espírito de união dentro da mesma associação, e desta com as demais.

Finalmente, os religiosos e as religiosas tenham em apreço as obras apostólicas dos leigos; consagrem-se de boa vontade a promover as obras destes, segundo o espírito e normas dos próprios Institutos (6); e procurem apoiar, auxiliar, e completar as funções sacerdotais.

Certos meios que servem para a mútua cooperação

26. Enquanto for possível, haja em todas as dioceses conselhos que ajudem a obra apostólica da Igreja, quer no campo da evangelização e santificação quer no campo caritativo, social e outros, onde os clérigos e os religiosos colaborem dum modo conveniente com os leigos. Tais órgãos poderão servir para coordenar as diversas associações de leigos e suas iniciativas apostólicas, respeitando a índole e autonomia própria de cada uma (7).

Se for possível, haja também organismos semelhantes no âmbito paroquial, interparoquial, interdiocesano, bem como no plano nacional ou internacional (8).

Além disso, crie-se junto da santa Sé algum Secretariado especial para ajudar e impulsionar o apostolado dos leigos, como centro que, por meios aptos, forneça informações sobre as várias iniciativas apostólicas dos leigos, se dedique a investigar os problemas actuais neste campo, e preste ajuda com o seu conselho à Hierarquia e aos leigos, nas suas obras de apostolado. Neste Secretariado deverão participar os diversos movimentos e iniciativas apostólicas de leigos existentes em todo o mundo, colaborando com os leigos também os clérigos e religiosos.

Cooperação com outros cristãos e não-cristãos

27. O comum património evangélico, e o dever comum do testemunho cristão que daí nasce, aconselham e com frequência exigem a colaboração dos católicos com os outros cristãos. Esta há-de exercer-se pelos indivíduos e pelas comunidades, em actuações singulares e em associações, tanto no plano nacional como no internacional (9).

Os valores humanos comuns pedem com frequência uma cooperação semelhante dos cristãos, que procuram fins apostólicos, com outros que, embora não professem a religião cristã, reconhecem, contudo, esses valores.

Por meio desta cooperação dinâmica e prudente (10), de grande importância nas actividades temporais, dão os leigos testemunho de Cristo, Salvador do mundo, e da unidade da família humana.

CAPÍTULO VI

A FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO

Necessidade da formação para o apostolado

28. A plena eficácia do apostolado só se pode alcançar com uma formação multiforme e integral. Exigem-na tanto o contínuo progresso espiritual e doutrinal do próprio leigo, como as diversas circunstâncias de coisas, pessoas e encargos a que a sua actividade se deve acomodar. Esta formação deve-se apoiar sobre os fundamentos afirmados e expostos por este sagrado Concílio noutros lugares(1). Além da formação comum a todos os cristãos, não poucas formas de apostolado requerem uma formação peculiar e específica, por causa da diversidade de pessoas e circunstâncias.

Princípios da formação dos leigos para o apostolado

29. Uma vez que os leigos têm um modo próprio de participar na missão da Igreja, a sua formação apostólica recebe uma característica especial que lhe vem da mesma índole secular própria do laicado e da sua espiritualidade.

A preparação para o apostolado supõe uma formação humana completa e adaptada à maneira de ser e circunstâncias próprias de cada um. Com efeito, o leigo, conhecendo bem o mundo actual, deve ser um membro da sociedade em que vive e ao nível da sua cultura.

Primeiro que tudo, aprenda o leigo a realizar a missão de Cristo e da Igreja, vivendo da fé no mistério divino da criação e da redenção, guiado pelo Espírito Santo vivificador do Povo de Deus, que impele todos os homens a amar a Deus Pai, e n'Ele, o mundo e os homens. Esta formação deve ser considerada como fundamento e condição de todo e qualquer apostolado fecundo.

Além da formação espiritual, requere-se uma sólida preparação doutrinal, teológica, ética e filosófica, de harmonia com a idade, condição e capacidade. Nem se descure de modo nenhum a importância da cultura geral e da formação prática e técnica.

Para cultivar as boas relações humanas, é necessário promover os valores verdadeiramente humanos, a começar pela arte de conviver e cooperar fraternalmente, bem como a de estabelecer diálogo com os outros.

Visto que a formação para o apostolado não pode consistir ùnicamente na instrução teórica, devem ir aprendendo gradual e prudentemente, desde o começo da formação, a ver, julgar e agir todas as coisas à luz da fé, a formar-se e aperfeiçoar-se com os outros por meio da acção e a entrar assim ao serviço activo da Igreja (2). Esta formação, que deve aperfeiçoar-se continuamente por causa da crescente maturidade da pessoa humana e em razão da evolução dos problemas, exige um conhecimento cada vez mais profundo e uma acção adaptada. Ao realizar todas estas eigências da formação, devem ter-se sempre em conta a unidade e a integridade da pessoa humana, de tal modo que se ressalve e desenvolva a sua harmonia e equilíbrio.

Deste modo, o leigo insere-se profunda e activamente na própria ordem temporal, assumindo com eficiência a sua parte na solução dos seus problemas; ao mesmo tempo, como membro vivo e testemunha da Igreja, torna-a presente e activa no meio das coisas temporais (3).

A quem pertence formar para o apostolado

30. A formação para o apostolado deve começar desde os princípios da educação infantil. Sejam, porém, iniciados no apostolado e imbuídos deste espírito particularmente os adolescentes e os jovens. Esta formação deve ser aperfeiçoada durante toda a vida, de acordo com as exigências dos encargos assumidos. E claro, portanto, que aqueles a quem compete educar cristãmente têm igualmente o dever de formar em ordem ao apostolado.

Pertence aos pais ir dispondo os filhos, desde a infância, para conhecerem o amor de Deus por todos os homens, e ir-lhes inculcando pouco a pouco, sobretudo com o exemplo, a preocupação pelas necessidades materiais e espirituais do próximo. Que toda a família se torne, pois, na. sua vida íntima, como que um estágio do apostolado.

Além disso, as crianças devem ser educadas de tal modo que, transcendendo os limites da família, se abram tanto às comunidades eclesiais como às civis. Sejam de tal modo integradas na comunidade local da paróquia que nela possam tomar consciência da sua qualidade de membros vivos e activos do Povo de Deus. Os sacerdotes, porém, na catequese e na pregação, na direcção espiritual, bem como em outras actividades pastorais, tenham em conta a formação em ordem ao apostolado.

Compete também às escolas, colégios e outras instituições católicas destinadas à formação, fomentar nos jovens o sentido católico e a acção apostólica. No caso de faltar esta formação, quer seja porque os jovens não frequentam essas escolas, quer por outra causa, então cuidem mais dela os pais, os pastores de almas e as associações apostólicas. Os professores, porém, e os educadores, que, por vocação e ofício, exercem uma superior forma de apostolado dos leigos, estejam impregnados da ciência necessária e das técnicas pedagógicas, para poder realizar eficazmente essa educação.

Do mesmo modo, os grupos e as associações de leigos, quer se dediquem ao apostolado, quer a outros fins sobrenaturais, devem fomentar com diligência e assiduidade a formação para o apostolado, segundo o próprio fim e modalidades (4). São elas, muitas vezes, o caminho ordinário duma preparação conveniente em ordem ao apostolado. Com efeito, nelas se realiza uma formação doutrinal, espiritual e prática. Os seus membros, constituindo pequenos grupos com os companheiros e amigos, consideram os métodos e os frutos da sua actividade apostólica, e confrontam com o Evangelho a sua vida quotidiana.

Deve-se orientar esta formação de modo a ter-se em conta todo o apostolado dos leigos, que deverá ser exercido não só entre os grupos das associações, mas também em todas as circunstâncias, através de toda a vida, sobretudo profissional e social. Mais ainda: cada um deve preparar-se activamente para o apostolado, o que se torna mais urgente na idade adulta. Com efeito, à medida que se avança na idade, revela-se mais cada um e assim pode descobrir melhor os talentos com que Deus enriqueceu a sua alma, e exercitar mais eficazmente os carismas que lhe foram dados pelo Espírito Santo para bem dos seus irmãos.

Formação específica para o apostolado

31. As diversas formas de apostolado exigem também uma preparação particularmente adequada.

a) Quanto ao apostolado em ordem à evangelização e santificação dos homens, devem os leigos receber uma formação especial para estabelecerem o diálogo com os outros, quer crentes quer não crentes, e comunicarem a todos a mensagem de Cristo(5).

Como, porém, em nossos dias se vão espalhando largamente por toda a parte várias formas de materialismo, até mesmo entre os católicos, convém que os leigos não só aprendam com maior diligência a doutrina católica, especialmente aqueles pontos que são objecto de controvérsia, mas também dêem testemunho de vida evangélica contra qualquer forma de materialismo.

b) Quanto à edificação cristã da ordem temporal, sejam os leigos bem instruídos sobre o verdadeiro significado e valor dos bens temporais, quer em si mesmos considerados, quer no que diz respeito a todos os fins da pessoa humana. Exercitem-se no recto uso das coisas e na organização das instituições, atendendo sempre ao bem comum segundo os princípios da doutrina moral e social da Igreja. Aprendam os leigos, antes de mais, os princípios da doutrina social e as suas conclusões, de modo a tornarem-se aptos quer para prestarem o seu contributo ao progresso da doutrina quer para aplicá-los convenientemente aos casos particulares (6).

c) Visto que as obras de caridade e misericórdia dão um esplêndido testemunho de vida cristã, deve também a formação apostólica levar ao seu exercício, para que os fiéis aprendam, logo desde a infância, a compadecer-se dos pobres e necessitados e a ajudá-los com generosidade(7).

Meios de formação

32. Para os leigos consagrados ao apostolado, existem já muitos meios por exemplo, sessões, congressos, recolecções, exercícios espirituais, reuniões frequentes, conferências, livros, revistas para se conseguir um mais perfeito conhecimento da Sagrada Escritura e da doutrina católica, para alimentar a vida espiritual e ainda para conhecer o estado do mundo e para encontrar e cultivar métodos adaptados (8).

O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes nos ambientes em que este se exerce.

Para este fim foram também criados centros ou institutos superiores que já produziram óptimos frutos.

O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes em algumas partes, e deseja que se promovam noutros lugares onde forem necessárias.

Criem-se, além disso, centros de documentação e de estudo não só de teologia, mas também de antropologia, psicologia, sociologia, metodologia, para fomentar mais as qualidades dos leigos, homens e mulheres, jovens e adultos, em todos os campos do apostolado.

EXORTAÇÃO

Exortação à generosidade

33. Por isso, o sagrado Concílio pede instantemente no Senhor a todos os leigos que respondam com decisão de vontade, ânimo generoso e e disponibilidade de coração à voz de Cristo, que nesta hora os convida com maior insistência, e ao impulso do Espírito Santo. Os mais novos tomem como dirigido a si de modo particular este chamamento, e recebam-no com alegria e magnanimidade. Com efeito, é o próprio Senhor que, por meio deste sagrado Concílio, mais uma vez convida todos os leigos a que se unam a Ele cada vez mais intimamente, e sentindo como próprio o que é d'Ele (cfr. Fil. 2,5), se associem à Sua missão salvadora. É Ele quem de novo os envia a todas as cidades e lugares aonde há-de chegar (cfr. Lc. 10,1); para que, nas diversas formas e modalidades do apostolado único da Igreja, se tornem verdadeiros cooperadores de Cristo, trabalhando sempre na obra do Senhor com plena consciência de que o seu trabalho não é vão no Senhor (cfr. 1 Cor. 15,28).

 

Vaticano, 18 de Novembro de 1965.

PAPA PAULO VI

 

 


Notas

Proémio

1.Cfr. João XXIII, Constituição apostólica Humanae salutis, 25 dez. 1961, AAS 54 (1962), p. 7-10.

2. Cfr. Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n. 33 s.: AAS 57 (1965), p. 39 s.; cfr. também Const. De sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 26-40: AAS 56 (1964), p. 107-111; cfr. Decr. De instrumentis communicationis socialis, Inter mirifica: AAS 56 (1964), p. 145-153; cfr. Decr. De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio: AAS 57 (1965), p. 90-107; cfr. Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus: n. 16, 17, 18; cfr. Declaração De educatione christiana Gravissimum educationis, n. 3, 5, 7.

3. Cfr. Pio XII, Alocução aos Cardeais, 18 fev. 1946: AAS 38 (1946), p. 101-102; cfr. Pio XII, Discurso aos Jovens operários Católicos, 25 agosto 1957. AAS 49 (1957) p. 843.

Capítulo I

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Rerum Ecclesiae: AAS 18 (1926), p. 65.

2. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium; n. 31: AAS 57 (1965), p. 37.

3. Ibid., n. 33, p. 39; cfr. também n, 10, p. 14

4. Ibid., n. 12, p. 16.

5. Cfr. Concilio Vaticano II, Constituição dogmática De sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, cap. I, n. 11: AAS 56 (1964), p. 102-103.

6. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição De Ecclesia, Lumen gentium, n. 32: AAS 57 (1965), p. 38; cfr. também n. 40-41; Ibid., p. 45-47.

7. Ibid., n. 62, p. 63; cfr. também n. 65, p. 64-65.

Capítulo II

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Urbi arcano, 23 dez. 1922: AAS 14 (1922), p. 659; Pio XII, Encíclica Summi Pontificatus, 20 out. 1939: AAS 31 (1939), p. 442-443.

2. Cfr. Leão XIII, Encíclica Rerum Novarum: ASS 23 (1890-1891), p, 647; Pio XI, Encíclica Quadragesimo anno: AAS 23 (1931), p. 190; Pio XII, Radiomensagem, 1 junho 1941: AAS 33 (1941), p. 207.

3. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra: AAS 53 (1961), p. 402.

4. Ibid., p. 440-441.

5. Ibid., p. 442-443.

6. Cfr. Pio XII, Alocução ao movimento «Pax Romana», 25 abril 1957: AAS 49 (1967), p. 298-299; e sobretudo João XXIII, Alocução ao Congresso do F. A. O., 10 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 856 e 866.

Capítulo III

1. Cfr. S. Pio X, Carta apost. Creationis duarum novarum paroeciarum, 1 junho 1905: ASS 38 (1905), p. 65-67; Pio XII, aloc. aos fiéis da paróquia de S. Sabas, 11 janeiro 1953: Discorsi e Radiomessaggi di S. Pio XII, 14 (1952 -1953), p. 449-454, João XXIII, Aloc. ao clero e aos fiéis da diocese suburbicária de Albano, em Castelgandolfo, 26 agosto de 1962: AAS 54 (1962), p. 656-660.

2. Cfr. Leão XIII, aloc. 28 janeiro 1894: Acta, 14 (1894), p. 424-425.

3. Cfr. Pio XII, aloc. aos Párocos, etc., 6 fevereiro 1951: Discorsi e Radiomessaggi di S. S. Pio XII, 12 (1950-1951), p. 437-443; 8 março 1952: ibid., 14 (1952-1953), p. 5-10; 27 março 1953: ibid., 15 (1953-1954), p. 27-35; 28 fevereiro 1954: ibid., p. 585-590.

4. Cfr. Pio XI, Encíclica Casti Connubii: AAS 22 (1930), p. 554; Pio XII, Radiomensagem, 1 janeiro 1941: AAS 33 (1941), p. 203; Idem, alocução aos Delegados ao Congresso da União Internacional das Associações para defesa dos direitos da família, 20 set. 1949: AAS 41 (1949), p. 552; Idem, aloc. aos pais de família franceses em peregrinação a Roma; 18 set. 1951: AAS 43 (1951), p. 731; Idem, radiomensagem no Natal de 1952: AAS 45 (1953), p. 41; João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 429, 439.

5. Cfr. Pio XII, Enciclica Evangelii praecones, 2 junho 1951: AAS 43 (1951), p. 514.

6. Cfr. Pio XII, aloc. aos Delegados ao Congresso da União internacional das Associações para defesa dos direitos da familia, 20 set. 1949: AAS 41 (1949), p. 552.

7. Cfr. S. Pio X, aloc. à Associação católica da juventude francesa acerca da piedade, ciéncia e acção, 25 set. 1904: ASS 37 (1904-1905), p. 296-300.

8. Cfr. Pio XII, carta Das quelques semaines, ao Arcebispo de Marianópolis, acerca dos Congressos promovidos pelos Jovens operários cristãos do Canadá: 24 maio 1947: AAS 39 (1947), p. 257; Idem, Radiomensagem à J. O. C. de Bruxelas, 3 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 640-641.

9. Cfr. Pio XI, Enciclica Quadragesimo anno, 15 maio 1931: AAS 23 (1931), p. 225-226.

10. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 448-450.

Capítulo IV

1. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 14, out. 1951: AAS 43 (1951), p. 788.

2. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 15 out. 1951: AAS 43 (1951), p. 787-788.

3. Cfr. Pio XII, Encíclica Le pèlerinage de Lourdes, 2 julho 1957: AAS 49 (1957), p. 615.

4. Cfr. Pio XII, aloc. ao Conselho da Federação internacional dos homens católicos, 8 dez. 1956: AAS 49 (1957), p. 26-27.

5. Cfr. Cap. V, n. 24.

6. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13 nov. 1920: AAS 13 (1921), p. 139.

7. Cfr. João XXIII, Encíclica Princeps pastorum, 10 dez. 1959: AAS 51 (1959), p. 856.

8. Cfr. Pio XI, carta Quae nobis, ao Cardeal Bertram, 13 nov. 1928: AAS 20 (1928), p. 385. Cfr. também Pio XII, aloc. à Acção Católica italiana, 4 set. 1940: AAS 32 (1940), p. 362.

Capítulo V

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostrae, 30 abril 1936: AAS 28 (1936) p. 160-161.

2. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13, nov. 1920: AAS 13 (1921) p. 137-140.

3. Cfr. Pio XII, Discurso ao II Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 5 out. 1957: AAS 49 (1957) p. 927.

4. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n. 37: AAS 57 (1965), p. 42-43.

5. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 660.

6. Cfr. Conc. Vat. II, decreto De accomodata renovatione vitae religiosae, n. 8.

7. Cfr. Bento XIV, De Synodo dioecesano, 1. III, c. IX, n. VII-VIII: Opera omnia in tomos XVII distributa, tomo 11 (Prato, 1844), pg.76-77.

8. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostra, 30 abril 1936: AAS 28 (1936), p. 160-161.

9. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 456-457; cfr. Concilio Vaticano II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 12: AAS 57 (1965), p. 99-100.

10. Cfr. Concilio Vaticano II, Decreto de Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n.12: AAS 57 (1965), p. 100; cfr. também a Constituição dogm. De Eeelesia, Lumen gentium, n.15: AAS 57 (1965), p. 19-20.

Capítulo VI

1. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, cap. II, IV, V: AAS 57 (1965), p. 12-21; 37-49; cfr. também Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 4, 6, 7, 12: AAS 57 (1965), p. 94, 96, 97, 99, 100; cfr, também acima, n. 4.

2. Cfr. Pio XII, alocução à I Conferência internacional de escuteiros, 6 junho 1952: AAS 44 (1952), p. 579-580; João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p. 456.

3. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia Lumen gentium, n. 33: AAS 57 (1965), p. 39.

4. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p. 455.

5. Cfr. Pio XII, Carta encícl. Sertum laetitiae, 1 nov. 1939: AAS 31 (1939), p. 635-644; cfr. Idem, alocução aos laureados da Acção Católica Italiana, 24 maio 1953.

6. Cfr. Pio XII, Discurso ao Congresso da Federação Mundial da JCF., 18 abril 1952: AAS 44 (1952), p. 414-419. Cfr. Idem, Discurso à Associação Cristã de Operários de Itália (A. C. L. L), 1 maio 1955: AAS 47,(1955), p. 403-404.

7. Cfr. Pio XII, alocução aos Delegados do Congresso das Associações de caridade, 27 abril 1952: AAS 44 (1952), p, 470-471,

8. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 454.